as duas escovas de dente, conversando
O feitiço da pia
Essa é uma história sobre uma pia. Uma pia de um palácio. E saiba, pias de palácios tem o poder de enfeitiçar.
Bom, um dia estava em Brasilia e fui almoçar no Palácio da Alvorada. Isso mesmo, no palácio do presidente. A minha amiga era filha do presidente da época, o Palácio da Alvorada era a casa do pai dela, e assim como eu poderia ter chamado uma amiga para comer na casa da minha mãe, ela me chamou para almoçar lá. Não havia ninguém no local, só eu e ela.
É bastante esquisito, confesso, ir simplesmente almoçar num lugar como aquele. Por mais que você tente achar que aquilo é apenas uma casa, por mais que no andar de cima tudo seja exatamente como uma casa, ainda assim não parece casa. Parece palácio. Nem de olho fechado - até o barulho e o cheiro são de palácio.
Almoçamos muito bem, depois sentamos numa saleta para tomar um café.
- Onde que tem um banheiro? - perguntei.
Ela apontou uma porta.
- Aquela porta ali.
- Você tem pasta de dente? - pedi.
- Pasta... hum... aqui não.
Ela se levantou e me chamou. Fomos andando pelo palácio, entrando e saindo por diversas portas. Eu não tinha a menor idéia onde aquilo ia acabar. Claro que eu entendo plantas, e ainda mais daquele projeto do Niemeyer, mas nessas horas não há quem não fique atrapalhada. Porque no meio do caminho eu tive certeza que ela, a minha amiga, estava me levando para o único banheiro que ela tinha certeza que tinha pasta de dente.
O banheiro do morador daquela casa.
Eu sei que devo estar parecendo a maior caipira, mas pensa: que brasileiro que tem chance de ir visitar um banheiro desses? Que arquiteto que já? É coisa até para colocar em currículo, gente. E a curiosidade de saber o que tem em cima daquela pia? As marcas, etiquetas? E as histórias que já devem ter acontecido lá dentro? Do Juscelino ao Collor? Aquele é o mais misterioso e mais enigmático banheiro desse país, gente. Pensa bem.
- Aqui, chegamos, olha ali a pasta. Sabe de quem é, não? Eu vou ali do lado, no da minha mãe. Falamos já-já.
E então eu fechei a porta e olhei em volta. Eu e o banheiro. Olhei para frente. A pia. Ah. Que momento aquele.
Bom, eu não vou fazer fofoca de nada. Levarei para o túmulo o segredo do que tinha ali. Só sei que usei a pia rapidinho, escovei meus dentes com um pouquinho de nada da pasta, e, quando me olhei no espelho tive um acesso de riso.
Me arrumei voando e saí. Estava com dentes limpos, tinha usado o banheiro mais presidencial do Brasil e já era hora de ir embora.
Foi quase na garagem, indo embora, que me lembrei. Abri a bolsa, fuxiquei em tudo, ai, cadê?
A escova de dente. A minha escova de dente, no meio daquela atrapalhação, ficou na pia. Fui relembrando todos meus movimentos naquele banheiro, um a um. Escovei o dente, bochechei, lavei a escova, bati a escova no cantinho da pia, e... e... e coloquei no potinho! MeuDeus, que equívoco! Onde é que já se viu?
- A escova! Eu tenho que voltar! - gritei para a minha amiga.
- Quê?
Saímos correndo as duas até o local do crime. A cena era, realmente, patética. Aquelas duas escovinhas pertinho uma na outra, naquela bancada de pia presidencial enorme, conversando.
A dele, branquinha. A minha, lilás.
Que vergonha.
Vê o perigo de uma pia famosa? Foi ela, a pia, que me enfeitiçou daquela maneira. Culpa da pia, gente. Da pia.
Eu sei que devo estar parecendo a maior caipira, mas pensa: que brasileiro que tem chance de ir visitar um banheiro desses? Que arquiteto que já? É coisa até para colocar em currículo, gente. E a curiosidade de saber o que tem em cima daquela pia? As marcas, etiquetas? E as histórias que já devem ter acontecido lá dentro? Do Juscelino ao Collor? Aquele é o mais misterioso e mais enigmático banheiro desse país, gente. Pensa bem.
- Aqui, chegamos, olha ali a pasta. Sabe de quem é, não? Eu vou ali do lado, no da minha mãe. Falamos já-já.
E então eu fechei a porta e olhei em volta. Eu e o banheiro. Olhei para frente. A pia. Ah. Que momento aquele.
Bom, eu não vou fazer fofoca de nada. Levarei para o túmulo o segredo do que tinha ali. Só sei que usei a pia rapidinho, escovei meus dentes com um pouquinho de nada da pasta, e, quando me olhei no espelho tive um acesso de riso.
Me arrumei voando e saí. Estava com dentes limpos, tinha usado o banheiro mais presidencial do Brasil e já era hora de ir embora.
Foi quase na garagem, indo embora, que me lembrei. Abri a bolsa, fuxiquei em tudo, ai, cadê?
A escova de dente. A minha escova de dente, no meio daquela atrapalhação, ficou na pia. Fui relembrando todos meus movimentos naquele banheiro, um a um. Escovei o dente, bochechei, lavei a escova, bati a escova no cantinho da pia, e... e... e coloquei no potinho! MeuDeus, que equívoco! Onde é que já se viu?
- A escova! Eu tenho que voltar! - gritei para a minha amiga.
- Quê?
Saímos correndo as duas até o local do crime. A cena era, realmente, patética. Aquelas duas escovinhas pertinho uma na outra, naquela bancada de pia presidencial enorme, conversando.
A dele, branquinha. A minha, lilás.
Que vergonha.
Vê o perigo de uma pia famosa? Foi ela, a pia, que me enfeitiçou daquela maneira. Culpa da pia, gente. Da pia.