domingo, 28 de novembro de 2004

"O Conktroulk"


"um conktroul"

Depois de ler ontem umas histórias sobre presentes no blog da Sheila, me lembrei de um fato que aconteceu comigo e com o Zé.
Na época morávamos num apartamento em Higienópolis e as crianças estavam numa escolinha maternal ao lado de casa. A escola funcionava numa casinha pequena e muito simpática, mas por causa dos prédios, a escola não tomava uma réstia de sol. Eu e o Zé gostávamos do lugar, mas nos incomodávamos com a insalubridade. Resolvemos nos mudar para um prédio na frente do clube Pinheiros e colocar as crianças na escolinha maternal do próprio clube. Eles teriam um espaço enorme e muito sol.
Mas nesse meio tempo, enquanto ainda morávamos em Higienópolis, uma família se mudou para o prédio. Encontrei a moça com os filhos no elevador. Estavam todos com a camiseta da escolinha-sem-sol, aquela que eu tinha tirado os meus filhos.
- Oi – falei para ela – Foi você que se mudou para cá? Os seus filhos estão na escolinha?
- Sim – ela sorriu – Eu coloquei... você conhece? É boa?
- Ah, é ótima. Os meus filhos estudaram lá, só tirei porque vamos nos mudar para perto do meu Clube - respondi, achando melhor não comentar sobre a falta de sol – Ei... escuta, quer os uniformes dos meus filhos? Tenho um monte, posso te dar todos.
- Claro que quero, que bacana! – a moça exclamou - Mas que ótimo!
Assim que cheguei em casa, coloquei tudo numa sacola e mandei para a casa dela. Pelo menos os filhos dela estariam agasalhados naquele local gelado.
No dia seguinte encontrei com ela de novo no elevador.
- Lúcia! Que gentileza a sua, adorei os uniformes! Não precisarei comprar nada! – ela exclamou – Sabe, falei com o meu marido e resolvemos que, para agradecer, vamos dar um “conktroulk” para vocês.
- Hã?
- Um “conktroulk”! Deixarei na sua casa amanhã.
O elevador chegou, ela me deu um beijo e saiu. “Conktroulk”? Não tinha a menor idéia do que ela pretendia me dar. O que seria aquilo?
- Hã? “Conktroulk” o quê? Mas o que é isso? – espantou-se o Zé, à noite, quando contei para ele.
- Sei lá. Ela me disse que eles iam nos dar um “conktroulk” e saiu do elevador.
- Mas você não perguntou o que era isso?
- Ela repetiu a mesma palavra, Zé! “Conktroulk”! E saiu!
O Zé começou a andar pela casa.
- Hum. “Conktroulk...” ? Seria “controle”? Um controle remoto? Será que é uma comida típica? Um tipo de roupa? Um brinquedo de criança? Uma fruta? Hum... conktroulk, conktroulk... Lú, tenta se lembrar “como” ela falou a coisa.
- “Conktroulk”.
- Droga. Deve ser um tipo de equipamento eletrônico com esse nome. Mas controle de quê? Um controlador de vídeo game? Ou TV? Vai ver que ele trabalha com isso. Ora, ora, que gente mais esquisita, que estranho...
- Vamos esperar até amanhã, Zé.
- Mas gente esquisita a gente trata à altura! Ei, Lú, temos que arrumar um presente mais esquisito para eles. Muito mais esquisito que esse tal de “conktroulk”.
- Como que é, Zé?
- Isso mesmo! Lú, o que pode ser bem estranho para se dar para um vizinho que a gente não conhece ? Hum... deixa ver... já sei! Um sapato social!
- Zé, você quer dar um “sapato social” pro marido da nossa vizinha a troco de nada?
Ele gesticulava, falava e ria sozinho.
- Hahaha, vai ser o máximo! Quer um presente mais surrealista do que dar um sapato social para um vizinho que você nunca viu? Hahaha! A gente dá, mas não fala nada! “Olha, compramos um presente para você, espero que você goste”! Hahaha, eles vão ver quem é esquisito nesse prédio, se são eles e esse “conktroulk” ou nós e nosso sapato social!
No dia seguinte, a vizinha apareceu em casa, toda sorridente. Olhei para a cara de sapato social da moça e tive vontade de rir da idéia do Zé, mas antes de qualquer coisa ela estendeu a mão e me deu um embrulho de presente.
Era uma garrafa de bebida, um licor.
Contreau.
E assim não precisamos comprar o sapato social para o marido dela.
Pena, né?

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