terça-feira, 28 de setembro de 2004

a eleição

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O que me incomoda nessa época de eleição é o desperdício de midia usado para falar mal dos outros. Eu procuro não falar mal dos outros, nem sempre isso é possível mas a gente tenta, ora.
Mas falar mal só por falar, achar que vai ganhar mostrando que o outro é pior me parece uma coisa tremendamente estúpida.
Diversas coisas me parecem erradas em eleição. Primeiro que ninguém mais fala o que acha, e sim o que manda o publicitário que te orienta. Depois que que as pessoas que estão ali para falar agem como se fossem robôs comandados. Nada é natural, é tudo uma tremenda encenação pra lá de canastrona.
Saio, reunião.

segunda-feira, 27 de setembro de 2004

o churrasco do Zé

Segunda feira, final da tarde.
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- Zé, vou convidar algumas pessoas para um churrasco no sábado.
- Sábado agora? Esse?
- É. Umas vinte pessoas.
- Putz, vinte, Lú? É muito... Eu vou ter que trabalhar demais, nem vou aproveitar.
- Mas Zé, desses vinte pelo menos dez são homens e teus amigos. Eles te ajudam.
Ele deu um pulo, apavorado.
- O quê? Tá maluuuca?
- Eu? Maluca porquê?
- Hahaha! Você quer colocar outro homem na frente da minha churrasqueira? Nunca! Para ele estragar tudo? Jamais! Para ficar dando palpite? Nem pensar! Para depois pegar os méritos no meu lugar? Hahaha, essa é boa. O meu churrasco é maravilhoso, o deles um carvão, ora, essa é boa...
- Nossa Zé, que exagero. Eu falei que era para eles te ajudarem...
- Olha Lu, vou te explicar uma coisa. Churrasqueira é uma coisa pessoal do homem. Uma coisa masculina, nossa, que a gente cuida. Como... como a esposa da gente, ou como... a caixa de ferramentas. Não é para ninguém colocar a mão. Por falar nisso, onde foi parar aquela minha chave de fenda pequena? Um absurdo. Pegam tudo da minha caixa de ferramentas e ninguém devolve.
- Zé, mas e o churrasco? Posso ou não convidar?
Ele deu um longo suspiro, resignado.
- Você disse vinte pessoas? Ai, ai... Eu faço sozinho, pode deixar. Eles vão ver o que é bom pra tosse. Ora bolas, imagina outro cara vir meter o bedelho no meu churrasco...

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sábado, 25 de setembro de 2004

acabei de receber

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"Pudesse eu não ter laços nem limites
Ó vida de mil faces transbordantes
Prá poder responder aos teus convites
Suspensos na surpresa dos instantes"

Sophia de Mello Breyner Andresen

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Fest food ou fast festa?

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Volta e meia meus filhos são convidados para aquelas festas de criança que acontecem dentro de lanchonetes. São festas fast food, uma promoção que muitas vezes resolve a sua vida: “faça uma festa rápida e prática para o aniversário do teu filho”. Mas é tudo muito rápido mesmo. Mal a festa começa ela já acabou, e, se você não tomar cuidado, nem vê a cor do bolo.
Quando minha filha era pequena, fui levá-la a uma dessas. Chegamos um pouco atrasadas e... babau. Neca de festa, não tinha sobrado um único brigadeiro. Tive que comprar um lanche e jantar com a menina, que ficou inconsolável, sem entender onde foi parar todo o mundo.
Um tempo depois ela foi convidada para mais uma festa fast food. Uma mãe, amiga minha, se ofereceu para levá-la, pois eu estava trabalhando naquele horário. Eu só tinha que buscá-la no final da tarde.
Quando chegou a hora, saí correndo do escritório direto para a tal lanchonete fast food, que ficava numa avenida movimentada. Estava morrendo de medo de perder a hora e minha filha ir parar sabe-se lá onde junto com o resto dos brigadeiros e balões. Lembrei que daquela outra festa não sobrou nada, nadinha mesmo.
Cheguei. Uma criançada correndo de lá para cá. Achei a mãe da aniversariante, uma loirinha simpática, que eu não conhecia.
- Olá. Sou a mãe da Lú. Vim buscar.
- Tudo bom? Patrícia, prazer. Mãe da Bruna.
- Deu tudo certo no aniversário da Bruna?
- Ah, aqui sempre dá, né? Divertiram-se muito. Estão todos lá fora, no play ground, com o animador.
Eu saí para achar a Lú. Olhei em tudo quanto era canto e nada. Procurei nos brinquedos. Nos cantos. Nos banheiros, no salão. Nada da Lú. Ué, onde essa menina tinha se metido? Será que fora embora com alguém? Fui atrás da tal de Patrícia.
- Patrícia.
- Oi.
- Você viu a Lú, minha filha?
- Não está lá fora? Como não? AimeuDeus. Nossa, isso me dá nervoso. Esperaí, eu te ajudo, vamos achar – falou a mulher, meio aflita e estabanada.
E nada da Lú. Procuramos de novo, eu e ela já completamente nervosas, berrando o nome da minha filha, perguntando aos monitores e animadores, feito duas loucas. A Patrícia me olhou e perguntou:
- Ela está de uniforme? Não é uma daquelas ali?
- Onde?
- Aquelas, de uniforme. Ali.
- Não tem ninguém de uniforme ali, Patrícia – respondi, olhando uma turma de meninas pequenas.
- Todas ali estão de uniforme, ué – falou a mãe.
- Mas o uniforme delas é azul, Patrícia – eu estranhei.
- Azul? Não, é vermelho! – falou a Patrícia.
Foi ai que eu comecei a desconfiar.
- Vermelho? Espera. Que escola que a sua Bruna estuda?
- Como “em que escola”? Não é na mesma escola que a sua filha Lú estuda?
- Iii... Acho que me enganei, Patrícia. Vim na festa errada.
- Como?
Claro, errei de lanchonete, de fast food, de festa e de mãe. A Lú estava em outra festa, em outra avenida, com outra aniversariante e com outra mãe de aniversariante. Saí correndo dali feito maluca para a outra lanchonete, pois ainda corria o risco da outra festa acabar.
Cheguei, e era realmente uma festa idêntica. E lá estava a minha Lú, de uniforme azul. Aliás, todos ali estavam de azul. Ufa, alívio.
A Patrícia? Encontrei outro dia, descobri que ela conhece umas primas minhas. Hoje em dia os filhos dela e os meus cresceram um pouco. E estão todos na mesma escola, com a mesma cor de uniforme.
Amarelo.
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quinta-feira, 23 de setembro de 2004

lembrando

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“Se não fosse a vida, não existiria ficção”

Mário Prata


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quarta-feira, 22 de setembro de 2004

novelas

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Agora, além do desafio de escrever uma novela aos amigos, surge outro desafio: escrever uma novela para crianças.
Esse desafio veio do Gilles e me deixou completamente sem sono hoje, pois entrei num mundo imaginário infantil que me encantou. Fiquei muito tempo pensando como pescar uma criança para uma história no mundo de hooje, e chego a conclusão que é exatamente como na outra novela: surpreendendo a cada instante.
Além disso, também acho que qualquer novela deve ser minimamente engraçada.
Essa será uma novela de um mundo de seres estranhos, que tem uma vida diferente e vivem em torno de um vulcão. Mais que isso não dá pra falar, simplesmente porque eu não sei como vai ser.
Só sei que a ideia de ter para onde direcionar o pensamento é extremamente estimulante, mesmo com o acúmulo de tarefas que eu me proponho. Pode ser que elas não saiam todas maravilhosas, mas sem duvida alguma, muita gente se diverte como isso.
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terça-feira, 21 de setembro de 2004

os personagens e o vício

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Não aguento falar mais de celular, esse assunto parece o próprio aparelho que não pára de tocar, mas a cada dia surge uma novidade sobre esse maldito revolvinho de brinquedo.
Ontem foi uma amiga que disse existirem pesquisas que o contínuo uso do celular está diminuindo o número de fumantes no mundo. Ou seja, que eatamos trocando de vício.
- Como? - perguntei, confusa.
- Sim - ela responde - Veja, antes dos celulares as pessoas saiam do cinema e acendiam cigarros. Agora elas ligam o celular!
Frankamente...
É vicio? Talvez. Me sinto meio pelada quando esqueço o meu por ai. Ou quando a bateria acaba no meio do dia.
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Sobre a novela: os personagens ontem estavam para lá de divertidos. Quando as coisas correm assim a escrita sai fácil e fluida. É extremamente estimulante ter a quem escrever. E mais estimulante sentir que eles entram dentro da ficção.
Porém é muita gente. Muitos se atrapalham e confundem as coisas. Outros não: são mestres na arte de representar brincando. Juro que esses me assustam, principalmente se partem para o lado do mal.
Outra nota: ninguém gosta de ser bonzinho. É como se "brincar" fosse "transgredir". Talvez essa chance de transgressão gratuita seja importante para todos nós. Pelo menos é o que eu sempre acreditei: no prazer da ficção.
Afinal, aprendemos esse prazer desde crianças (e principalmente quando fomos crianças). Acho que esse prazer nunca deixa de existir, fica só escondidinho lá no fundo. Muitas vezes morre junto com a gente, frustrado, brochado.
O prazer de fazer o que não se pode fazer.
Isso.
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Mais uma coisa sobre a novela: todo mundo quer entrar, mesmo as pessoas das outras turmas, das outras classes. É como se eu fosse a porteira da festa. Aquela que decide. Você sim, ele não. Que horror.
Nunca tinha pensado sob esse aspecto. Você sim, ele não? E logo eu, que sempre acho que eu sou aquela a quem dizem não?
Mas entrem, vamos, todos. E quais são os critérios? Sei lá. Acho que prefiro os que se divertem mais. Não tem graça brincar com quem não brinca, não ri, não inventa. Não há escolha minha: há escolhas individuais, isso sim. A simpatia vem de cada um. A arte de cativar também. Não é bajular. É estar vivo e pulsante, isso que vale.
Bola e meia é a coisa mais desestimulante que existe...
Agora, porque participar? Talvez por pura curiosidade: que personagem você colocaria para mim? Como me vêem? Quem eu seria se não fosse eu?
Hahahah. Até eu queria saber...
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Descobri que sou viciada em personagens.

sábado, 18 de setembro de 2004

muito personagem

coisa mais difícil é ter tanto personagem.

É pior que ser mãe de três e tentar atravessar a rua. Temos duas mãos. Porém o meu problema como meus personagens é que eles todos estão vivos, e agem, falam e fazem coisas fora do script. Em algumas horas eu me assusto. Em outras, me confundo. Mas em todas, me surpreendo com a maravilha que é tê-los comigo. Que faltem braços, que faltem espaço.
Apertando dá.

Sobre a crônica da semana: não dei muito por ela, mas acho que ficou bacaninha. Ai está:

o supermercado

- Alô.
- Oi filha! Está no supermercado?
- Estou, mãe.
- Ah, que bom. Queria mesmo ter um tempinho para falar com você. Escuta...
Vou falar de novo de celular, gente. É impressionante como esse aparelhinho ficou famoso da noite para o dia: tem mais foto de telefone do que do presidente no jornal. Além disso, é raríssimo achar um “humano” que não ande armado de um celular pelas ruas. Vivemos um novo tipo de faroeste: um homem sem um telefone celular, hoje em dia, está desprotegido.
Bem, depois que inventaram o celular, acabamos aproveitando todo o tempo que sobra para falar ao telefone. Eu, por exemplo, não consigo entrar num supermercado sem sentir a maior vontade de telefonar. Não entendo exatamente como e quando a coisa começou. Acho que minha mente simplesmente decidiu que aquele tempo que eu passo entre os produtos é um tempo inútil que pode ser aproveitado. Sou uma viciada em telefone no supermercado. Às vezes não tenho para quem ligar e acabo telefonando pra empregada, só para saber se ela não esqueceu de nada na lista. Ou ligo para minha mãe, para a minha avó, para as minhas tias. Como se eu tivesse um tempo livre. Pensando bem, é erradíssimo. Pior que se entupir de pipoca e comida no cinema.
Bom, todo mundo vai ao supermercado vez ou outra. Eu vou muito, desde criança, quando os sacos eram de papel pardo e tinham que ser carregados nos braços. Anos atrás a gente ia ao supermercado, pegava o carrinho, escolhia o que comprar nas gôndolas, pagava e saia dali. Era extremamente simples ir ao supermercado.
Hoje é inacreditável a quantidade de pessoas falando sozinhas e tacando coisas nos carrinhos, sem olhar nem escolher nada, gesticulando, rindo, falando. Percebo que não sou só eu. Acho que mais da maioria das pessoas que fazem compras falam ao celular. Acho que é por isso que existe música de fundo nos mercados: para as pessoas não ouvirem a conversa dos outros.
Isso muda tudo. Antes, teu tempo ali era destinado a escolher devagar o alimento que se comprava. Agora recolhemos automaticamente os produtos das prateleiras, sem pensar em nada. Acho até que os donos de supermercado perceberam que não devem atrapalhar as pessoas: repara que quase tudo já vem sem problemas para você, que está ocupadíssimo falando ao celular. As carnes já vêm com aqueles “modess” que chupa o sangue, as verduras são pré-selecionadas e as frutas vem sem casca e sem caroço, para você não ter que largar o telefone para escolher nadinha. Tem até almoço, sanduíche e salada prontos. E sabe porque? Por que as pessoas estão muito ocupadas no celular, gente! Não temos tempo para ficar pensando o que fazer de jantar, ora!
Mas não é só supermercado que sofre de telefonema crônico. Saguão de aeroporto é até pior, pois como as pessoas sabem que vão ficar horas sem telefone no avião, se desesperam a falar como se o mundo fosse acabar. A mesma coisa acontece nos carros, nos táxis, na rua, no almoço, nos shoppings, nas salas de espera. Acabou o tempo de ficar a toa. Até na hora do esporte as pessoas falam ao telefone.
Tenho um pouco de saudade dos supermercados de antigamente. Acho que esse tipo de frase é coisa tipicamente de velho, mas não há o que fazer. Hoje o lugar serve para fechar negócio, falar com a tia, namorar e fofocar, tudo, menos abastecer a sua casa. Bem, talvez a gente coma mal por causa disso. Mas olha, eu coloco todas as conversas em dia.
Quer falar comigo? Liga no sábado de manhã. É a hora que eu estou no supermercado.




sexta-feira, 17 de setembro de 2004

sexta feira a tarde

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Acordei hoje com máquinas na cabeça. Sinto que estamos no limiar de muita coisa com a quantidade de máquinas que nos rodeiam.
No trabalho de arquitetura a coisa é pior ainda. A cada dia aumenta mais a quantidade de fios, instalações e tecnologias. É preciso acompanhar, pois sem isso as casas não "funcionam" e os projetos tornam-se meramente decorativos. Os arquitetos em geral relutam. Ainda insistem em estruturas mínimas, leves, que não comportam a infraestrutura que é necessária.
As necessidades aumentam. Desde dimerização da iluminação de todos os ambientes, ar condicionado, som ambiente, rede de computadores, antenas e cabos para a tv e por ai vai. Fora a quantidade de tomadas para carregar e ligar coisas.
Aqui em casa mesmo, carregamos 5 celulares toda noite. Fora os da empregada.
É tempo de repensar o que estamos fazendo e como estamos projetando nossas casas. É tempo de perceber que precisamos trabalhar com mais um projeto paralelo e tão importante quanto: instalações.
E... perceber que em muitas paredes, tem mais conduite que tijolo...