sábado, 30 de dezembro de 2006

'la nave va'




Todo final de ano a minha família faz um almoço de comemoração no Terraço Itália entre o natal e o reveióm. Eu, o Zé e nossos três filhos. Não sei dizer quando nem porque isso começou, mas eu e o Zé, por sermos arquitetos, adoramos a idéia de acompanhar anualmente o desenvolvimento da nossa cidade.

O almoço desse ano foi ontem, sexta, e fomos brindados por essa visão incrível da chuva no horizonte. No próprio Terraço não choveu, embora tenha escurecido bastante. Assistimos de camarote a tempestade que assolou a cidade. Não sei se é porque é fim de ano, não sei se ando sensível demais, não sei se é porque é sensacional mesmo, não importa, mas essa chuva no além significou para mim algo muito mais do que uma simples... chuva no além. Percebi ali nossa total incapacidade de lidar com as simples forças da natureza. As inevitáveis simples forças da natureza, que chovem, passam, assolam, dóem, incomodam. Infalíveis, fatais, encharcadas. Rápidas, instantâneas, frágeis. Necessárias, imprevistas, coincidentes. Deliciosas, divertidas, entregues. Mas chuvam passam. Surgem, escurecem nossos olhos, dão medo, arrepio danado, incomodam, estremecem nosso chão e se vão. "La nave va", falou o Jôka num post maravilhoso essa semana em homenagem ao Braguinha. Aqui eu o plagio descaradamente, copio seu título, suas frases, tudo isso como uma homenagem e mostro o horizonte da minha cidade tão querida. Todos nós temos nossas naves. E todas vão, quer a gente queira ou não. Não adianta espernear que a natureza é assim. A chuva chove e o amor aparece onde a gente menos espera.


" A vida só gosta de quem gosta dela."
Braguinha

Feliz ano novo.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

guerra no caixa


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Foi no sábado antes do natal. Fui fazer supermercado de manhã, como sempre, no Pão de Açúcar aqui ao lado de casa. Dizem que os hipermercados são mais baratos, mas eu detesto hiperpermercado-maratônico. Como sou ligeiramente caótica no meu processo de compras e não estou habituada a fazer esportes, esquecer um produto nesses supermercados grandões significa andar mais 700, 800 metros. Multiplique isso por muitos produtos e eu já estou exausta só de pensar.
Não é que eu não goste de fazer supermercado. Eu gosto, prover a casa é muito bom, mas como tudo que se repete diversas vezes, às vezes eu encho. É sempre igual: chego, pego o carrinho, ando pelas fileiras, coisas pesadas primeiro e leves depois, frutas, verdurinhas e folhas no final, caixa, carregador, cartãozinho pra pegar o carro, gorjetinha. Não é terrível, mas às vezes me entedio. Adoro quando alguém me telefona, ou, o máximo, me faz companhia entre as gôndolas. Notem que esse é um convite que estendo à todos.
Nesse sábado tentei ligar para a minha mãe, mas fui dispensada: ela estava ocupada fazendo o almoço de natal. Foi quando minha empregada me ligou, pois tinha esquecido algum item na lista.
- Maria, pergunte para o Zé se ele quer me fazer companhia.
Inacreditavelmente ele foi. Achei que aquele era um dos milagres de estarmos recém casados novamente (ver post abaixo). Demais. Há cento e vinte anos anos que eu faço compras sozinha. Fiquei feliz, pois ele, além de me ajudar, poderia conversar comigo. Tudo correu bem até a hora que chegamos no caixa. Foi ali que meu novo casamento estremeceu.
Tinha fila e tivemos que esperar. Quando chegou a nossa vez, começamos a colocar as coisas no balcão, mas notamos que a nossa velocidade de colocar coisas era muito maior que a capacidade da moça do caixa de passar as coisas pelo código de barras. Assim, ficou a maior montanha de um lado e alguns pobres produtos do outro, boiando, uma vez que os dois empacotadores também eram mais rápidos que ela.
- Zé, calma, deixa ela passar as coisas e depois a gente coloca mais – eu disse quando vi que o Zé ainda aumentava a montanha cada vez mais.
Paramos e esperamos. Mas eu percebi uma coisa, e senti que o Zé também percebeu. Na verdade, a moça do caixa estava sendo lerda de propósito. Ela, além de passar as coisas muito devagar, ainda falava displicentemente com a moça do outro caixa, suspirava, arrumava o cabelo, coçava a cabeça, falava com os empacotadores como se não estivesse com a mínima pressa de nada. E quando um dos produtos tinha um código que não passava, ela digitava os numerinhos bem devagar. Bem devagar mesmo. Insuportavelmente devagar. Nossa, que raiva que dava daquilo.
Isso já aconteceu algumas vezes quando estou sozinha, e eu sempre opto por ignorar. Quase sempre consigo abstrair os maus humores alheios – de mau humor basta o meu. Mas o Zé não gostou daquilo não. E percebi que ele resolveu se vingar, pois ele olhou fixo para ela e parou de colocar produtos na esteira.
Ficou tudo vazio.
- Zé, coloca ai.
- Espera um pouco - ele me disse.
- Hã?
Foi quando ele colocou a caixa de sabão em pó bem longe dela. A quilômetros da lerda. A moça vagarosa teve então que se debruçar lá na frente para pegar. E depois ele colocou um sabonete no mesmo lugar. Um só.
Suspirei. Estou casada há duzentos anos, sei de tudo. Cochichei.
- Zé, ela pode não estar percebendo, mas eu estou. Pára com isso.
Ele riu, sacana.
- Não paro.
A vingança é um prato que se come cru? Pode ser. Só sei que ele conseguiu ir mais devagar que ela. E pior, olhando fixo para ela, sem desgrudar o olho, para intimidá-la. Uma hora eu achei que aquela guerra lenta só acabaria a noite. O Zé punha um único produto na esteira, ela pegava o mais devagar possível, bocejando e demorava dez minutos para passar. Um a um. O Zé olhava para ela, fixo, desafiador, ela dava de ombros. Mais devagar ainda.
Uma hora não agüentei. Segurei firme no braço dele e sussurei.
- Pára. Vai pra casa e me deixa aqui, Zé?
Ele riu e cochichou.
- Logo agora que estou ganhando? Nem a pau.
Pois os dois levaram a guerra até o fim do último produto. Foi insuportável. Supermercado de agora em diante? Sempre sozinha.
Óbvio.

terça-feira, 26 de dezembro de 2006

micasso


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Gente, não agüento não falar dessa foto. Essa imagem estava na capa do Estadão do domingo passado, dia 24/12.
Olhem para isso.
Essa foto.
Essa cena.
Primeira página do jornal do domingo.
Pesadelo.
Céus.
Olha. Todas nós – e duvido que alguma mulher me contradiga – temos nossos momentos particulares de fúria. Está na alma, no universo e nos traumas femininos, está nos hormônios e sinceramente acho não tem muito remédio não. Não sei se depois da menopausa passa, mas eu tenho esses acessos desde menina até hoje. Tá, tem a coisa de temperamento, tem a coisa da paciência, da personalidade, da tolerância e tudo isso conta. Mas a questão é que eu, assim como muitas outras mulheres, de vez em quando explodimos. Bum. Não tem jeito. Bum. Não adianta ir contra, é como uma tempestade, um tsunami, um fenômeno da natureza. Bum. Rezo muito para Deus para que as minhas explosões aconteçam dentro da minha casa, principalmente com eu sozinha, mas não é sempre que a gente tem essa sorte e vez ou outra eles ocorrem em público, o que é terrível e extremamente vexaminoso. Já contei uma vez, numa crônica, o acesso de fúria que tive na Disneylândia bem na frente da Margarida e do Donald e do trauma que causei aos meus filhos. Já tive acessos em supermercados e em lojas. Já piquei um carnê todinho feito confete num caixa de um Banco Bradesco da Paulista e joguei na cabeça do coitado do atendente. Já joguei uma taça de vinho branco numa mulher muito chata numa festa, fingindo que foi sem querer. Já atropelei diversas canelas de donas de casa irritantes com meu carrinho no Pão de Açúcar aqui ao lado de casa. Já envergonhei filhos, filhas e amigos de filhos e filhas com brigas inúteis. E com o Zé, pobrezinho, já berrei em tudo quanto é canto e ele me agüentou com uma paciência de Jó. Porém existe uma coisa estranha na mente feminina que é um negócio de esquecimento. A gente esquece tudo isso horas depois. Juro. Esquece completamente, é uma amnésia tepeêmmica, um esquecimento natural do sexo feminino, um negócio simplesmente sensacional que um dia merece um estudo. Sei as coisas que já fiz porque o Zé, os filhos e os amigos não esquecem, mas se dependesse da minha natureza eu não teria a menor idéia da dimensão dos meus furores - que hoje me dão uma vergonha danada.
Mas daí, gente, para você ser publicada, em completo acesso de fúria, na primeira página do maior jornal do Brasil, não dá. Ninguém merece isso, nenhuma mulher, céus! Coitadas dessas duas, é trauma pra o resto da vida. E detalhes: reparem nas unhas, cravadas na pele dos braços uma da outra. Olhem o olhar... Bum em mega escala. Fúria em escala nacional.
Gente, uma dessas poderia ser eu. Nossa, que sorte que eu tive de nunca ter sido fotografada. Que sorte nós todas temos.
Que pesadelo.
Que mico.
Ou, como diz o Pecus: um micasso.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2006

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

gente, casei


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A teoria que corre aqui em casa há anos é que não se deve ir em shoppings no natal de modo algum.
- Shopping no natal esbugalha o olho - diz o Zé desde que me casei com ele - Esbugalha mesmo e demora um tempão pra voltar o normal. Fica-se com aquele olhão enorme, que não fecha nunca. Olho de shopping - ele explica para mim e para os meninos.
Desde então, evito. Claro que é impossível, volta e meia tenho que correr para comprar mais um presente e saio de lá meio esbugalhada, mas quando posso vou a outro lugar.
- Ora, Lu, venha para o centro e compre as coisas aqui – me disse o Zé, que trabalha por lá.
Achei uma boa idéia, mas relutei.
- É longe, tem trânsito, Zé.
Ele insistiu muito, e depois de duas tentativas frustradas, consegui arrumar tempo e fui ontem. O Zé ficou super empolgado. Me disse que quando eu chegasse lá deveria chamá-lo, que ele ia cabular o trabalho e fazer as compras comigo. Que ele me levaria nas melhores lojas. Que me mostraria lojas bárbaras com presentes originalíssimos. Que me levaria na loja africana. Na loja de roupas de rock. Nas melhores lojas de cds. Estranhei. O Zé, fazendo compras de natal comigo? Pirou? Tá certo que ele é um arquiteto envolvidíssimo com o centro de São Paulo, mas não precisa exagerar. Compra de natal é sempre um pesadelo.
Mas ele foi mesmo. Me encontrou e passou a fazer as compras comigo. Porém, de um modo confuso, ele me engambelou, me levou no papo e, quando eu vi, estava dentro de uma galeria da Barão de Itapetininga. Esse era seu truque. Me levar lá.
- Que estamos fazendo aqui, Zé?
- Ahá. Você vai ver.
Foi quando ele me levou para uma banquinha no meio do corredor, um cubículozinho onde estava um senhor bigodudo com óculos de relojoeiro. Me apresentou. Bigode, Lúcia minha esposa, Lúcia, o seu Bigode, prazer, prazer. E explicou:
- Vamos gravar as nossas alianças, Lú. Enfim. Te trouxe aqui para isso.
Céus. Acreditam? Desde que eu me casei, há duzentos anos atrás, que uso uma aliança da avó do Zé e ele usa a que foi do meu pai. Nem uma nem outra tem inscrição alguma, a da avó dele porque já se apagou, a do meu pai porque era a segunda via (a primeira meu pai perdeu) e essa nunca teve o nome da minha mãe. E ontem, acreditem, gravamos. Lá no seu Bigode. E já que estávamos fazendo aquilo séculos depois, quando o Bigode me perguntou quando fora a data do casamento, eu não tive dúvidas:
- Coloca ai que estamos casando hoje. Vinte e um de dezembro de dois mil e seis.
O seu Bigode riu e gostou da idéia. Contou que ontem, no dia 21, era o dia do casamento dele com a dona Bigoda, e disse que essas coincidências dão sorte. A gravação custou 15 reais, e gente, aqui estou eu, hoje, recém casada (com a benção do Seu Bigode), com minha aliança - “Zé, 21 – 12 – 06” e o Zé com a dele - "Lú, 21 - 12 - 06". E para nos proteger, passamos numa lojinha ali do lado e compramos uma medalhinha da Nossa Senhora de Aparecida, que estou carregando no pescoço. A "menor" medalhinha da loja, eu pedi para a vendedora, para fazer jus ao que eu disse no post da santinha: santiiinha, basilicooona. Afinal, a escala não importa, e as coisas acontecem sempre no tempo certo, é como uma frase que ouvi uma vez: "o tempo existe para que as coisas não aconteçam todas ao mesmo tempo". E assim, protegidos pela santinha mínima e gravados a partir de ontem, zeramos e começamos aqui a nossa segunda vida de casados.
Sem olhos esbugalhados, claro.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

o poder dos blogs


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Ontem tive um clic. Uma coisa absolutamente boba, mas que me deu uma enorme satisfação em perceber. Nós, blogueiros, somos muito poderosos e não percebemos, gente. Sim, é verdade. A palavra postada tem seu poder. Um magnífico poder. Foi no meio de uma conversa com um amigo, onde ele fez uma gozação meio boba comigo e eu, brincando, ameaçei.
- Óóólha... Nem vem. Experimenta fazer maldade comigo que eu falo mal de você todo dia no meu blog. Ahá. Eu escreverei meu post diário e, no fim, colocarei a seguinte frase: "antes que eu me esqueça, gente, o fulano é um bobão". E o "fulano" será você - eu disse para ele - tome cuidado, muito cuidado.
- Como assim? - ele disse, em pânico.
- Ora, a gente subestima o poder dos blogs. Mas mal ou bem vem muito gente aqui, seja para ler, fuxicar ou apenas brincar. Queira ou não blogs tem público. E queira ou não quem escreve blogs tem poder. Não é um poder de um Estadão nem duma revista Veja, mas saiba que existe algum poder.
Acho que ele ficou apavorado. Hahaha. Isso vale para todo mundo, aliás. Experimentem maltratar a lúcia, a franka se vinga.
Post mais bobo. E antes que eu me esqueça, nossa, essa blogueira aqui é uma bobona.

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

para mim chega



Perdões pelo tema do post, mas convenhamos: blog também serve para desabafar. É que fiquei subitamente irritada ontem por causa de um chocolate que veio numa cesta de natal. Um Toblerone de chocolate amargo. É um igual a esses, mas de embalagem preta. Eu adoro Toblerone e adoro chocolate amargo. Fiquei fissurada para comer aquilo quando vi. Passei o final de semana namorando o chocolate, até que não aguentei e abri. Foi uma decepção. Por causa do calor ele estava mole, meio derretido e horrível. Chocolates suissos são para comer no frio, pensei, incomodada com a meleca que ele fez nas minhas mãos. Resolvi colocar na geladeira e comer depois. Esqueci, obviamente. Mas lembrei ontem a tarde, e, salivando, corri pra geladeira. Ainda estaria lá? Ufa, ninguém tinha comido, fiquei feliz. Foi quando começou minha decepção. Por causa da geladeira, o chocolate ficou muito, mas muito duro, e eu não consegui partir um dentinho dele num primeiro 'clic'. Toblerones devem ser quebrados em pedacinhos para comer, ora. Tirei mais um pedaço do tubo e tentei de novo. Nada. Suspirei, parei em frente a mesa e tirei todo o chocolate congelado da embalagem, segurei com força e 'pléc!'. Parti três dentinhos. Ufa. Guardei a parte maior na caixinha prismática e sai toda feliz com os meus dentinhos de toblerone amargo para o escritório. Mas dai percebi a burrada. Como partir aqueles três em um que coubesse na minha boca? Tentei partir de novo com a mão, mas como o pedaço era pequeno, não tive empunhadura para tanto. Tentei enfiar na boca e quebrar com o dente, para isso tive que tirar todo o papel. Coloquei na boca, mas era impossível quebrar, pois a ponta de cima machuca o céu da boca, além da parte de baixo ser plana demais. Aflição. Conclui, ainda com um pouco de bom humor, que não são todos os chocolates que ficam bons depois de gelados. Mas depois de ter sido enfiado na boca e manipulado daquele modo, o tal do Toblerone não resistiu e começou a derreter, embora ainda estivesse duríssimo por dentro. Meleca. Ficou bem nojento, e eu já tinha jogado fora o papel. 'Dane-se' a mão suja, pensei, tentando quebrar mais uma vez, o que era impossível porque daí escorregava muito. Na hora tive ódio daquilo. Eu imunda, lutando naquela lama negra. Nunca vi chocolate mais burro, pensei. Design mais idiota. Formato mais estúpido, cheio de pontas - como uma coisa comestível pode ter tanta ponta dura, caramba? No meio da melecação, começei a roer a parte de cima, para diminuir as arestas, o que piorou e não adiantou. No fim, irritada, enfiei tudo na boca, corri, peguei um guardanapo de papel para caso eu babasse e consegui, depois de um minutos de desespero e falta de fôlego, consumir aquilo sem nenhuma alegria. Não foi prazeiroso e foi a minha última vez. Para quem quiser tentar, o restante está aqui na geladeira. Para mim chega. Fiquei com raiva do chocolate, Toblerone nunca mais.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

o passarinho verde



Foi ontem, domingo. Fui buscar o jornal de manhãzinha e achei esse resto de ovinho no meio do caminho entre a porta de entrada da minha casa e a grade onde fica jogado o jornal. Provavelmente caiu da árvore na limpeza do ninho pós parto feita pela mãe-passarinha. Legal nascer um passarinho bem na porta da casa da gente. Um passarinho de um ovo verde, imagino que deve ser colorido. 'Talvez um periquito ou quem sabe até um dinossauro, afinal, um ovo meio verde, não é esquisito?', brinquei com os filhos. Como eles não tem mais 4 anos de idade, ouvi um 'dãr, mãe...'. Mas ovo é ovo, nascimento é nascimento, meio do caminho é meio do caminho e sei lá, na minha cabeça isso foi um putz lance de sorte pra mim. Não acham?

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

horizonte basculante



Assim como só se repara algumas coisas da cidade quando se anda a pé, algumas coisas só se vê do banco do passageiro. Estava sem carro e cansada ontem no final da tarde e peguei um táxi para voltar para casa. Para cortar caminho, o motorista entrou numa rua residencial, pequenina e cheia de casas que liga a av. Faria Lima com a marginal Pinheiros. Numa das esquinas o carro parou e olhei para o lado. Um sobradinho desses normais, tão comuns em São Paulo. Sala em baixo, janela de quarto e janela do banheiro em cima, garagem na frente, grade alta cheia de pontas. Porta com tetrachave. Beiral de telhado com casa de abelha. Uma vez alguém perguntou qual a tipologia de moradia de uma cidade como São Paulo. Embora todo mundo tivesse respondido que eram edifícios de apartamento do centro e Higienópolis, eu e o Zé lembramos de sobradinhos como esse, que passam quase desapercebidos na paisagem, às vezes as centenas corridos nas ruas, as vezes sufocados por prédios enormes mas sempre digníssimos apesar de transparentes nas pinturas bege e iluminações penumbrosas pré-fluorescente-halógena.
Nessa casa da esquininha em questão, reparei na janela do banheiro. E na silhueta do shampoo e do condicionador colocados no parapeito da janela. Nossa. Era possível até identificar a marcas dos produtos e notar que obviamente não eram as mesmas. Eu ri. Lembrei que na minha casa também o shampoo e o condicionador sempre são desparelhados. Alguns meninos reclamam, mas o shampoo sempre acaba antes de condicionador e sou sempre tentada a mudar de marca na compra seguinte. Ainda mais eu, que sou confessadamente uma mulher não-fiel ao shampoo. O carro andou um pouco e passei a reparar nas inúmeras janelas de banheiros, todas iguais, seguidas e invisíveis, todas sempre com as silhuetas de shampoo. Quase todo banheiro tem saboneteira e porta shampoo, mas é irresistível não colocar na janela, pensei num primeiro instante. Mas não sei se foi porque era fim da tarde, se porque é quase natal-fim-de-mundo ou se foi porque eu estava sensível, mas perceber as casas corridas com suas janelas de banheiro e seus shampoos me pareceu melancólico, mas extremamente confortador. As entranhas escondidas saindo pelas feridinhas. Sim, existem ainda shampoos em janelas. Coisas no lugar errado. Sim, é possível saber como os outros lavam a cabeça. O lado de dentro estampado do lado de fora, o que, numa cidade como São Paulo quase não existe mais. Talvez uma micro poesia, cabelos limpos e banhos explícitos. Era vida escondida que se colocava assustadoramente à mostra naquelas pequenas janelinhas. Tudo tão rápido, tudo tão invisível. A paisagem de São Paulo, nosso horizonte basculante.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

a caixa preta

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Depois de uma das dezenas de comemorações de final de ano (já repararam a quantidade de turmas que temos nessa época pós-orkut?), pedi a um amigo se ele poderia me enviar as fotos que ele tinha tirado na noite anterior com o telefone. Ele se assustou. “Ixi, as fotos?”, ele disse. “Ainda não baixei. Tou com medo de ver o que tem lá. A caixa preta daquela noite pode ser muuiitiimpressionante, ô franka”.
Falando nisso, ontem foi aniversário do a. . E quer saber? Eu tou morrendo de medo da caixa preta de ontem... E se ele posta tudo no carne crua sem tarja nenhuma?

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

a família real



Ontem. Festa de formatura do meu filho mais velho, o Chico. Ele avisa que teremos uma missa e uma cerimônia no teatro da escola.
- Olha mãe, mas é melhor a gente chegar cedo. Vai estar muito cheio, a missa demora, a cerimônia demora. Se você bobear terá que ficar em pé, como das outras vezes.
Nem pestanejei e obedeci direitinho. Sempre sou atrasada, mas desta vez não. Lá fomos nós quarenta e cinco minutos antes com a incumbência de guardar um lugar para o Zé, que trabalha no centro e ia demorar para chegar.
O teatro da escola é grande. Na parte da frente, diante do palco, existiam seis fileiras planas destinadas aos formandos, explicou um lanterninha. Depois, ainda numa parte plana do teatro, ficavam dez fileiras de cadeiras (desconfortáveis, duras e sem braço) que poderiam ser usadas pelos pais e convidados. Porém ali, se você tiver o azar de sentar atrás de um gigante cabeçudo, babau, não veria nada. Logo em seguida existe um corredor e começa uma segunda parte do teatro, essa bem inclinada, com cadeiras ótimas e que, por estarem em aclive, tem uma visão excelente do palco. Já existiam algumas pessoas sentadas nesse local, onde, obviamente as cadeiras do centro são melhores ainda. Porém existia um pormenor que acho só eu pensei. Nessas festas de escola a gente encontra muita gente, mães e pais que sempre tagarelam muito, ainda mais quando o filho se forma. E como conversar de longe é impossível, se você estiver lá no meião tem que sair a toda hora para falar com um ou com outro, e para não ter a cadeira roubada teria que fazer aquela coisa chata de colocar uma bolsa, um casaco, um sapato, sei lá.
Porém...
Porém, ahá! Na primeira fileira dessa ala de cadeiras não existia esse problema. A primeira fileira estava diante do corredor de entrada, é dois degraus mais alta e separada dele por um guarda corpo. Ali, apoiado no guarda corpo, pode-se conversar com qualquer um sen-ta-do. E, para melhorar mais ainda, notei ainda que dali poderíamos controlar as duas entradas e saídas, o que é uma delícia, além comprar balinhas da moça das balinhas sem precisar se abanar para ela. Maravilha. Sentamo-nos, eu, a Nani e o João e guardei um lugar para o Zé ao meu lado. Confortabilíssimos. Tipo a família real. Demais.
O Zé chegou.
- Lugar bom, hein? Um verdadeiro camarote.
Eu ri.
- Desta vez, Zé, nós ganhamos de todos. Estamos no melhor lugar desse teatro, e logo a gente, que sempre fica em pé por causa dos nossos atrasos! – eu disse, explicando para ele as maravilhas daquele lugar – Hehehe, olha para toda essa gente atrasada. Desta vez mudamos de time. Somos os vencedores dessa formatura.
Foi quando começou a acontecer.
A coisa.
Primeiro foi um cara que o Zé conhecia. Chegou ali no nosso camarote, conversou, conversou.
- Acho que ele notou que estou no melhor lugar do teatro, Lu, - falou o Zé, emproado - Vou olhar onde ele está sentado, coitado.
Apareceram mais um, dois, três conhecidos, e a gente naquela exibição, até que surgiu um casal amigo nosso, simpaticíssimo. Nessa hora o teatro já estava lotadaço. O cara, de terno e gravata, conversa um pouco, olha ao redor e diz que terá que sentar na escadinha, no chão. Engolimos em seco. No chão? Olhei para a mulher dele, de calça branca. Puxa, coitada, pensei. Ficamos estáticos.
- Eu deveria dar meu lugar para ela – cochichou o Zé, envergonhado.
- Pô – retruquei, brava – Cheguei tão antes, Zé. Nem pensar.
Logo em seguida, uma mãe de uma amiga da minha filha. Muito mais chique e empetecada que a da calça branca. Coitada. O Zé hesitou, segurei com força. Ele que não inventasse de sair dali. Foi quando surgiu um outro pai ali na nossa frente – aliás, todo mundo passava por ali, aquele lugar era quase presidencial. Parou, conversou, e disse, apontando uma senhorinha de uns 100 anos:
- Bem, me desculpem que eu tenho que achar uma cadeirinha para a mamãe... olha ela ali...
Ah, não, aquilo era sacanagem. Pô. Uma senhorinha velhinha daquelas, em pé? Ai que raiva que me deu. O Zé suava frio e eu apertei o braço dele com força. Não, não e não!
Apelei.
- Zé, fecha os olhos! O Chico me pediu para chegar antes para a gente ficar aqui. Hoje é o dia dele, se ele te vê no chão, na escadinha, ele vai ficar triste. Vai te achar um pai humilhante, não faça isso.
- Lu, mas isso aqui é um pesadelo! Eu estou me sentindo muito culpado! Eu olho ao redor e só vejo velhinhas e velhinhos em pé, sofrendo, eu olho e vejo pessoas se espremendo nas escadinhas, pessoas muito mais chiques que eu, não estou à vontade de modo algum! Que idéia a sua de pegar esse lugar horrível!
- Sério?
- Mil vezes a paz na escadinha.
Fazer o que?
- Tá... Da próxima vez a gente senta no chão, como sempre. E eu juro que não venho de calça branca pra não deixar ninguém culpado.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

mata a cobra e mostra o vidro


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- Dona Luiça, a senhora sabia que uma cobra picou minha mulher? – me disse o caseiro de uma casa em Angra.
- Nossa, jura?
- Ela ficou internada duas semanas. E está grávida.
- Afe! E está bem agora?
- Está, claro. Mas eu peguei a desgraçada. Ah, se peguei. A senhora espera que eu vou trazer ela aqui para a senhora ver.
- Ela quem? A sua esposa?
- Não, a desgraçada da cobra.
- Viva?
- Morta, dona Luiça. Era o mínimo que eu poderia fazer pela minha esposa. Achar a desgraçada e matar.
Esperei.
- Olha aqui - e ele mostrou um vidro com uma cobra socada dentro.
Nossa, será que o Zé faria isso por mim?

sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

um poema - um presente

Ontem conheci uma blogueira poeta, a Ana Carla, do 'livro de poesia' que veio visitar e me mandou esse poema que fez para o 'frankamente...'. Fiquei emocionadíssima. Obrigada, Ana. E você tem razão. A mentira é minha maior verdade.

A mentira é uma verdade

I

O Verdadeiro é inacessível: profundo,
O Aparente é irreal: superfície,
O que é verdade e o que é a mentira?
Se tudo não passa de um jogo?

II

Propriamente
Própria mente
Mente
Ana Carla Steffen

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Evangelista C Lucas

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Ontem, no final de uma viagem-martírio-suplício-insuportável a trabalho para Angra dos Reis, onde logo de manhãzinha pisei numa manga podre que espirrou na minha calça, no meu tênis, nas minhas meias e que me fez passar o dia emporcalhada, onde peguei um grande congestionamento na volta com chuva, onde tomei chuva e suei muito, passamos de carro por Aparecida e resolvemos parar. Sei lá, pra se benzer, ora. Acho inacreditável Aparecida do Norte. Uma Basílica absurdamente gigantesca para uma santinha absurdamente pequenina, gente. Basilicooona, santiiinha... Não é demais perceber essa diferença de escala? Juro que isso me comove e me faz acreditar na fé que temos que ter nas coisas pequenas.
Mas o que eu queria falar é outra coisa. Achei muito engraçado perceber que o estacionamento de Aparecida ao lado da Basilicona (que as oito e meia da noite estava às moscas) usa o nome dos Santos para localizar os carros. Ora, óbvio que seria assim, as pessoas em geral sempre tem soluções simples para as coisas, nós que complicamos. Mas misturar religiosidade com vaga de estacionamento a aquela hora da noite, para uma mulher toda suja de manga e lama, me pareceu absurdo e perturbador.
Paramos numa das vagas Evangelista C Lucas.
Pode uma coisa dessas?

para os Deuses africanos



Aniversário do Joãozinho, 13 anos. Como a vida dele se resume em jogar basquete e ouvir música rapper, resolvemos ir mais fundo nas origens negras africanas e dar de presente uma legítima roupa africana.
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"A roupa não nasce para proteger o corpo, mas como uma forma de beleza, não só para aparecer ao outro, mas para os deuses”.
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Porém, óbvio que não nos livramos com isso de dar os presentes solicitados: uma fita de vídeo game, um DVD de baquete e um cd do Ludacris...

segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

bobagem t o t a l


Mas vejam que coisa incrível e divertida para um fim de noite: conseguimos equilibrar todas as colherzinhas nas xicarazinhas de café.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

jogo dos sete erros


Adoro revistas antigas. Tenho um monte aqui em casa. Essa era a revista "Planeta" de setembro de 1975, um revista de assuntos de paranormalidade, enigmas, mistérios e ciência que existia lá pelos meados de 1970 e que, na desmontagem da casa de um parente que faleceu eu peguei uns exemplares. As reportagens são todas absurdas, principalmente as que fazem previsões para o futuro, mas o que me impressionou - e que eu coloco aqui como charadinha - foi essa propaganda do Banco do Brasil com uns jovens andando na rua. Gente, não parece que tem alguma coisa... 'errada'? Listei algumas. Quem achar mais, por favor, avise.
1. O moço da frente da direita veste uma camiseta tamanho infantil. Nossa, que esquisito.
2. Ninguém fala ao celular. Todos conversam entre si.
3. Alguns homens usam bolsas enormes. Algumas parecem até de mulher. Os cadernos e pastas tem cores avulsas e desconectadas, e muitos deles são velhos e rasgados.
4. As camisas e camisetas são apertadas e curtas e as calças são altíssimas e pantalonas. Aparentemente acho que ninguém se vestiu para tirar a foto da propaganda.
5. Um rapaz fuma. Impossível hoje em dia alguém fumar numa propaganda de banco.
6. Não existe nenhuma propaganda nem marca nas roupas. Reparem a limpeza total da imagem. Nada de marcas ou logotipos.
7. Ninguém é modelo-manequim e as pessoas não malham, tem corpos normais.
Que mais?