.
.
Foi no sábado antes do natal. Fui fazer supermercado de manhã, como sempre, no Pão de Açúcar aqui ao lado de casa. Dizem que os hipermercados são mais baratos, mas eu detesto hiperpermercado-maratônico. Como sou ligeiramente caótica no meu processo de compras e não estou habituada a fazer esportes, esquecer um produto nesses supermercados grandões significa andar mais 700, 800 metros. Multiplique isso por muitos produtos e eu já estou exausta só de pensar.
Não é que eu não goste de fazer supermercado. Eu gosto, prover a casa é muito bom, mas como tudo que se repete diversas vezes, às vezes eu encho. É sempre igual: chego, pego o carrinho, ando pelas fileiras, coisas pesadas primeiro e leves depois, frutas, verdurinhas e folhas no final, caixa, carregador, cartãozinho pra pegar o carro, gorjetinha. Não é terrível, mas às vezes me entedio. Adoro quando alguém me telefona, ou, o máximo, me faz companhia entre as gôndolas. Notem que esse é um convite que estendo à todos.
Nesse sábado tentei ligar para a minha mãe, mas fui dispensada: ela estava ocupada fazendo o almoço de natal. Foi quando minha empregada me ligou, pois tinha esquecido algum item na lista.
- Maria, pergunte para o Zé se ele quer me fazer companhia.
Inacreditavelmente ele foi. Achei que aquele era um dos milagres de estarmos recém casados novamente (ver post abaixo). Demais. Há cento e vinte anos anos que eu faço compras sozinha. Fiquei feliz, pois ele, além de me ajudar, poderia conversar comigo. Tudo correu bem até a hora que chegamos no caixa. Foi ali que meu novo casamento estremeceu.
Tinha fila e tivemos que esperar. Quando chegou a nossa vez, começamos a colocar as coisas no balcão, mas notamos que a nossa velocidade de colocar coisas era muito maior que a capacidade da moça do caixa de passar as coisas pelo código de barras. Assim, ficou a maior montanha de um lado e alguns pobres produtos do outro, boiando, uma vez que os dois empacotadores também eram mais rápidos que ela.
- Zé, calma, deixa ela passar as coisas e depois a gente coloca mais – eu disse quando vi que o Zé ainda aumentava a montanha cada vez mais.
Paramos e esperamos. Mas eu percebi uma coisa, e senti que o Zé também percebeu. Na verdade, a moça do caixa estava sendo lerda de propósito. Ela, além de passar as coisas muito devagar, ainda falava displicentemente com a moça do outro caixa, suspirava, arrumava o cabelo, coçava a cabeça, falava com os empacotadores como se não estivesse com a mínima pressa de nada. E quando um dos produtos tinha um código que não passava, ela digitava os numerinhos bem devagar. Bem devagar mesmo. Insuportavelmente devagar. Nossa, que raiva que dava daquilo.
Isso já aconteceu algumas vezes quando estou sozinha, e eu sempre opto por ignorar. Quase sempre consigo abstrair os maus humores alheios – de mau humor basta o meu. Mas o Zé não gostou daquilo não. E percebi que ele resolveu se vingar, pois ele olhou fixo para ela e parou de colocar produtos na esteira.
Ficou tudo vazio.
- Zé, coloca ai.
- Espera um pouco - ele me disse.
- Hã?
Foi quando ele colocou a caixa de sabão em pó bem longe dela. A quilômetros da lerda. A moça vagarosa teve então que se debruçar lá na frente para pegar. E depois ele colocou um sabonete no mesmo lugar. Um só.
Suspirei. Estou casada há duzentos anos, sei de tudo. Cochichei.
- Zé, ela pode não estar percebendo, mas eu estou. Pára com isso.
Ele riu, sacana.
- Não paro.
A vingança é um prato que se come cru? Pode ser. Só sei que ele conseguiu ir mais devagar que ela. E pior, olhando fixo para ela, sem desgrudar o olho, para intimidá-la. Uma hora eu achei que aquela guerra lenta só acabaria a noite. O Zé punha um único produto na esteira, ela pegava o mais devagar possível, bocejando e demorava dez minutos para passar. Um a um. O Zé olhava para ela, fixo, desafiador, ela dava de ombros. Mais devagar ainda.
Uma hora não agüentei. Segurei firme no braço dele e sussurei.
- Pára. Vai pra casa e me deixa aqui, Zé?
Ele riu e cochichou.
- Logo agora que estou ganhando? Nem a pau.
Pois os dois levaram a guerra até o fim do último produto. Foi insuportável. Supermercado de agora em diante? Sempre sozinha.
Não é que eu não goste de fazer supermercado. Eu gosto, prover a casa é muito bom, mas como tudo que se repete diversas vezes, às vezes eu encho. É sempre igual: chego, pego o carrinho, ando pelas fileiras, coisas pesadas primeiro e leves depois, frutas, verdurinhas e folhas no final, caixa, carregador, cartãozinho pra pegar o carro, gorjetinha. Não é terrível, mas às vezes me entedio. Adoro quando alguém me telefona, ou, o máximo, me faz companhia entre as gôndolas. Notem que esse é um convite que estendo à todos.
Nesse sábado tentei ligar para a minha mãe, mas fui dispensada: ela estava ocupada fazendo o almoço de natal. Foi quando minha empregada me ligou, pois tinha esquecido algum item na lista.
- Maria, pergunte para o Zé se ele quer me fazer companhia.
Inacreditavelmente ele foi. Achei que aquele era um dos milagres de estarmos recém casados novamente (ver post abaixo). Demais. Há cento e vinte anos anos que eu faço compras sozinha. Fiquei feliz, pois ele, além de me ajudar, poderia conversar comigo. Tudo correu bem até a hora que chegamos no caixa. Foi ali que meu novo casamento estremeceu.
Tinha fila e tivemos que esperar. Quando chegou a nossa vez, começamos a colocar as coisas no balcão, mas notamos que a nossa velocidade de colocar coisas era muito maior que a capacidade da moça do caixa de passar as coisas pelo código de barras. Assim, ficou a maior montanha de um lado e alguns pobres produtos do outro, boiando, uma vez que os dois empacotadores também eram mais rápidos que ela.
- Zé, calma, deixa ela passar as coisas e depois a gente coloca mais – eu disse quando vi que o Zé ainda aumentava a montanha cada vez mais.
Paramos e esperamos. Mas eu percebi uma coisa, e senti que o Zé também percebeu. Na verdade, a moça do caixa estava sendo lerda de propósito. Ela, além de passar as coisas muito devagar, ainda falava displicentemente com a moça do outro caixa, suspirava, arrumava o cabelo, coçava a cabeça, falava com os empacotadores como se não estivesse com a mínima pressa de nada. E quando um dos produtos tinha um código que não passava, ela digitava os numerinhos bem devagar. Bem devagar mesmo. Insuportavelmente devagar. Nossa, que raiva que dava daquilo.
Isso já aconteceu algumas vezes quando estou sozinha, e eu sempre opto por ignorar. Quase sempre consigo abstrair os maus humores alheios – de mau humor basta o meu. Mas o Zé não gostou daquilo não. E percebi que ele resolveu se vingar, pois ele olhou fixo para ela e parou de colocar produtos na esteira.
Ficou tudo vazio.
- Zé, coloca ai.
- Espera um pouco - ele me disse.
- Hã?
Foi quando ele colocou a caixa de sabão em pó bem longe dela. A quilômetros da lerda. A moça vagarosa teve então que se debruçar lá na frente para pegar. E depois ele colocou um sabonete no mesmo lugar. Um só.
Suspirei. Estou casada há duzentos anos, sei de tudo. Cochichei.
- Zé, ela pode não estar percebendo, mas eu estou. Pára com isso.
Ele riu, sacana.
- Não paro.
A vingança é um prato que se come cru? Pode ser. Só sei que ele conseguiu ir mais devagar que ela. E pior, olhando fixo para ela, sem desgrudar o olho, para intimidá-la. Uma hora eu achei que aquela guerra lenta só acabaria a noite. O Zé punha um único produto na esteira, ela pegava o mais devagar possível, bocejando e demorava dez minutos para passar. Um a um. O Zé olhava para ela, fixo, desafiador, ela dava de ombros. Mais devagar ainda.
Uma hora não agüentei. Segurei firme no braço dele e sussurei.
- Pára. Vai pra casa e me deixa aqui, Zé?
Ele riu e cochichou.
- Logo agora que estou ganhando? Nem a pau.
Pois os dois levaram a guerra até o fim do último produto. Foi insuportável. Supermercado de agora em diante? Sempre sozinha.
Óbvio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário