sexta-feira, 28 de novembro de 2014

nostalgia dos cacarecos


Época estranha da vida, essa de filhos grandes. Notei que, por exemplo, minha casa agora está cheia de vazios. Primeiro foi meu ex marido que saiu, levou as coisas dele e alguns móveis. Depois foi meu filho mais velho, que levou também as coisas dele, e mais uns móveis e objetos. E quando minha mãe morreu tive que colocar algumas coisas dela aqui, e desde então me livrei de muuuita tranqueira.
É que tem aquelas coisas que dá a maior pena de jogar fora, sabe? Demora pra você tomar a atitude de sucatear tudo, porque a gente tem um negócio insuportável chamado me-mó-ri-a que te faz entulhar e empilhar tudo que foi seu. Dai você olha a televisão de tubo que era do seu quarto (ah, como eu amei aquela tv em 1994, eu nunca tinha tido uma tv no quarto...), a impressora antiga (ah, comprada na FNAC, e pensar tudo que ela já imprimiu...), a última cadeira branca da cozinha com o pé quebrado (lembro de ir na Tokstok e trazer toda feliz as seis cadeirinhas, snif), aquelas caixas de papelada que sei lá se tem documento (será que mando pro lixo?), agendas, agendas, agendas, agendas (porque será que guardei todas as minhas agendas desde 1979?), uau, listas telefônicas (alguém se lembra delas? Um dia briguei com a minha irmã e de raiva rasguei uma), bijuteria quebrada, bijuteria quebrada, bijuteria quebrada (lindas... e se eu mandar arrumar?), sete mil cartões de visita de mil pessoas desconhecidas (será que me arrependerei?), enfeite feio, enfeite cafona, enfeite quebrado (ah, mas os meninos que quiseram comprar naquela viagem para Parati...), ai, aquele puffe vermelho horrendo de bolinhas de isopor (os meninos gostavam tanto de se jogar nele...), e esses cadernos de escola...
“Não lembre mais”, resolvi. Venci galhardamente a nostalgia dos cacarecos e mandei tudo embora. Porque tranqueira, é sério, tem vida própria e cresce sem que a gente perceba. Por exemplo, a mesa da entrada da minha casa é como mato. Não param de brotar coisas esquisitíssimas em cima dela, é aquela terra de ninguém com bolsas, sacolas, papéis, sutiã, autan, elásticos de cabelo, cd sem capa, cartas, meias, casacos, óculos, calculadora, revista, boletos, apostilas, livros, bala, escova de cabelo, foninho de ouvido, desodorante, paleta de sax, capa de celular, lápis, iPod, capa sem cd, carregador de celular (x10). Juro, não listei nem metade do que encontro e guardo toda a semana, para depois levar bronca porque “tirei do lugar”. Hahaha.
Foi dai que eles surgiram, os buracos. A casa ficou agora com uns vãos enormes, vazios e absolutamente maravilhosos, que crescem cada vez mais. Ando pela sala, aquele espação. Ando pelo quarto, espação. Área de serviços, espação. Me sinto agora a rainha do espação. Tem gente que acha triste quando a casa esvazia. Eu tou gostando. Época louca.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

talvez é não


Estávamos na cozinha da casa da minha irmã. Ela comentou que um amigo nosso talvez fosse para lá.

- Como ele disse, mãe?– perguntou meu sobrinho.

- Disse que talvez viesse – ela respondeu.

- “Talvez” é não. Ele não vem. Quem fala “talvez” nunca vai.

- Como que é? – perguntei.

Ele explicou a teoria de modo muito simples.

- É assim, repara no que as pessoas falam e fazem. “Talvez” é não,  “vou ver” é não, “sim” é talvez, só não que é não.

- Nossa, que confusão. E o que é “sim”? Se a pessoa fala “tou indo”, daí é sim? – minha irmã perguntou.

- Não, “tou indo” é talvez também. O único “sim” verdadeiro é quando a pessoa fala “cheguei” e você abre a porta pra ela.


E ele tinha razão. O amigo não foi. Hahahah. 

terça-feira, 25 de novembro de 2014

cavalos de guerra


Tive uma ideia. Depois que a gente assiste um filme no Netflix ou Telecine Play, volta a tela inicial para você assistir outro filme. Tem sempre um monte de gêneros de filmes, mas uma das listas diz: “porque você assistiu esse filme”. Nessa lista eles dão um monte de sugestões baseadas no filme que você acabou de ver. É algo assim: se você viu um filme de amor romântico, aparecem muitos filmes de amor, se assistiu a um filme de cavalos, aparecem muitos filmes de e com cavalos, se assistiu um filme de ilha deserta, eles te sugerem mil outros filmes de ilha deserta.

Aliás, esse “eles” que eu escrevi é engraçado, porque “eles” parece coisa de esquizofrênico que acha que está sendo perseguido, não são “eles” coisa nenhuma, é a internet que te espiona o tempo todo e sabe tudo de você.

O que também não deixa de ser completamente assustador.

Então eu tive essa ideia que vou tentar fazer no fim de semana. Vou aceitar todas as sugestões e ver onde vou parar. Porque tem variações. Por exemplo, se o tal filme de cavalo for um filme de cavalo com uma criança, “eles” te sugerem filmes de cavalo e filmes de crianças. Vamos supor que você escolha o filme da criança que gosta de outro tipo de pet, não cavalo, e que nesse filme a criança seja órfã. Dai “eles” vão sugerir filmes de pets e de órfãos. Se você escolher o filme de órfão, e vamos supor que nesse filme o órfão fuja do México para os Eua cruzando a fronteira, “eles” vão sugerir filmes de fronteiras e de órfãos, se você escolher o filme de fronteira e ele envolver um barco, “eles” vão te sugerir também filmes de barcos, se o filme de barco tiver acidente, “eles” vão sugerir filmes de acidentes de barco e se esse filme envolver também um submarino, você vai acabar assistindo a um filme de guerra.

Ou seja, porque você assistiu um filme de cavalo, será que vai assistir um filme de guerra?


Que loucos que “eles” são. 

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

a questão é ter rodas?


Pra você andar bem em São Paulo, você precisa de pouca coisa: boas pernas, um sapato ou tênis legal que não dê bolha, uma bolsa com o mínimo de coisas úteis e que não pese muito - o que é complicado pra mim, pois hesito em me livrar do meu caderninho, do meu óculos escuros e do meu pente - e um bom foninho de ouvido que não embaralhe todo. Também prefiro usar bolsa a tiracolo do que mochila, pela facilidade de acesso às minhas tralhas.
Quando virei uma andarilha, há cerca de um ano, comecei a notar que o principal problema de quem anda é exatamente onde você pisa. Isso, o chão, a calçada, o piso. Aqui onde moro, por ser um local baixo e perto do rio Pinheiros, parece que a parte de baixo calçadas são um charco, pois com o tempo cada vez mais o chão cede e o piso fica completamente ondulado. Além disso, existem muitas árvores, que obviamente não param de crescer – afinal estão vivas – e não estão nem ai com o que tem por cima das suas raízes. E como cabe a cada morador fazer sua própria calçada, você anda numa mistura de colcha de retalhos com montanha russa. É um sobe e desce sem parar, buraco, raiz, buraco, raiz, incluindo pisos escorregadios, pisos crespos e aqueles horríveis pisos de placas quadradas que nunca tem a ver com os seus passos, e passo sim passo não você enfia o pé no vão. Dói o pé...
Então aqui no bairro as pessoas evitam totalmente as calçadas e andam na rua, atentas com os carros. Noto isso porque toda vez que ando em algumas, passo em teias de aranha. Eu juro. Quantos dias demora para uma aranha fazer um a teia enorme? Um, dois três? Pois esse é o tempo que a calçada fica sem uso. Louco isso.
Diante dessa dificuldade, eu, pedestre mór e convicta de que andar também faz super bem pra saúde, olho ali para o lado e vejo... Ahá! Uma maravilhosa pistinha de bike, a novinha ciclovia do prefeito, que além de lisa, é protegida dos carros, sem calombos, sem raízes, perfeita para andar.
No início da moda das bikes, eu andava pelas pistinhas ainda incompletas toda feliz da vida, ouvindo música e cantarolando. Mas percebi que a cada dia mais que o número de ciclistas aumentam e tem mais raiva de mim. Buzinam, trimmm, trimmm, dão fechadas assustadoras, não desviam, “vá para a calçada!”, me dizem. Isso fora os palavrões. Também são aceitas ali pessoas com patins e skate, meu sobrinho até me contou de um congestionamento de bicis numa ciclovia por causa de um carroceiro, que acredito que por ter "rodas" também pode andar ali, mas eu, andarilha, não, jamais.
Acho que o prefeito esqueceu de nós, pedestres. Se pensarmos em termos de saúde, andar queima só um pouco a menos de calorias, e faz super bem. Hummm. A questão é ter rodas? Será que se eu empurrar um carrinho de super eu posso andar ali?

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

vencer é preciso



Vou contar mais coisas de mim e do parque Villa Lobos. Hoje fui de novo, olhem o que já andei hoje, não só no parque, que sucesso de pessoa. Juro que isso são só passos. São Paulo, me aguarde.
Mas o problema de andar, correr e fazer ginástica na terceira idade é que não tem competição. Você malha, se exercita pra caramba e não ganha de ninguém. As pessoas acostumam com isso, e aceitam praticar esportes só para o corpo ficar saudável. Eu não sou somente isso. Eu quero me exercitar, mas também quero ganhar. Talvez devesse começar a jogar ao menos ping pong para dormir mais tranquila. 
Bom, dai hoje encanei. Como não ia ganhar de ninguém? Olhei pra minha frente, uma mulher de legging roxo. Ah, eu vou passar ela, pensei, desafiadora. Andei rápido, bem rápido e pimba. Passei. Dai tinha um senhor japonês meio gordinho na frente dela. Esse foi baba, pensei, ganhando sozinha minhas medalhas. Durante muito tempo, só passaram bicicletas e gente correndo, e não me aventurei a ganhar deles pois poderia, sei lá, enfartar. Dai cheguei na academia. Mó solão, tinha um cara no reminho. Meio lento. Ele saiu, lá sentei eu e fiz no dobro da velocidade dele. Hahá. Ganhei de novo. O mesmo no das pernas, o mesmo na cavalgada. 
Passei mais uns três andarilhos na maior, e cheguei na prancha de abdominais da academia dos jovens. Tinha um bombadão do meu lado, daqueles, bombadão meeesmo, as tatuagens que o digam. Como a gente tava lado a lado, resolvi fazer mais que ele. Nossa, como foi difícil vencer, mas fiz um a mais. Um. E quase gritei. Louca. 
Dai pirei na rua, no largo da Batata, quando fui até a FNAC comprar um presente, e não parava de competir e vencer. 
Agora não consigo nem ficar em pé, mas tou realizada. Quem disse que fazer ginástica é preciso e que vencer não é preciso? Hahaha.

vamos se moves



Agora, nessa fase que eu tô da minha vida, eu acordo de manhã e ando no parque todos os dias, corro (tô tentando) um pouquinho e me exercito na academia do parque, num lugar que se chama “academia da terceira idade - proibido para menores de 16 anos”. 

É engraçado o nome e a proibição, pois, que eu saiba, tem uma enooooorme diferença entre 17 anos e sessenta anos, aliás, 43 anos. Eles não “me” impedem de usar, então aquilo não é bem “terceira idade”, uma vez que não fiz 60 e falta muito pra isso. As meninas de 17 devem odiar, mas como eu saio ganhando, olho com desprezo para elas. Hehehe.
O lugar parece  um play ground de velhos, daqueles com escorregador, balanço, gangorra, trepa trepa e gira gira, tudo tão colorido quanto, o que encanta as crianças e os jovens, que são sempre expulsos dali pelos guardinhas, que levam a sério: os balanços e os trepa trepas são “alongadores”, as gangorras são aparelhos de esticar músculos e os giras são pra musculação fraca. Nada pra brincar. 
E lá vou eu em todos, por pelo menos uma musica em cada um. Acaba a música, mudo pra outro "aparelho", cada um mais ridículo que outro mas dane-se, melhor pra mim, que tou quase na terceira idade.
Dai, né, já que estou mergulhando fundo na questão “lúcia, só saúde”, baixei hoje um aplicativo no celular que mede tudo que eu faço, quantos passos eu dou por dia, quanto eu corro por dia e quanto faço de ginástica. Ai que veio a parte engraçada. É que o aplicativo conta todos meus passos, até quando vou ao super, ou quando subo a escada de casa, ou quando entro no metrô, se eu estiver com o celular. E olha, só hoje a tarde, depois que eu baixei, as 14 horas, ele me disse que já andei 5,1 quilômetros (nossa), e depois que olhei esse número, me deu um esgotamento muscular que decidi que vou dormir já. Depois de andar esse tantão, melhor ir pra cama.
Será que eu sempre fui uma puta atleta e nunca percebi? 
Tou curiosíssima pra saber se ele vai marcar minha andada, corrida e minha musculação amanhã. Viva os aplicativos, as tecnologias e os celulares e todo mundo que me fizer melhorar de vida.

boa noite, sims



Resolvi jogar The Sims de novo nesse último sábado, muitos anos depois da última vez que joguei. Agora acho que já existe o Sims 4 (?), será? Me corrijam. 
Bom, não importa. Animei. E resolvi, no jogo, fazer a minha família de hoje e ver como ela funcionava, tipo assim um... "psicodrama", onde eu me veria com meus olhos. 
Hahaha. 
Porque os personagens do The Sims de hoje tem personalidade, comportamento e metas de vida. Porque agora você escolhe se as roupas que eles usam são pra esporte, pra dormir, trabalhar, sair, ir pra balada. Você precisa criar tudo. Aliás, você detalha "pedaços" do corpo, de rosto, define tudo das pessoas. 
Genial.
Empolgada pela brincadeira, vamos lá, pensei, crie, Lúcia. Como é a gente é hoje, eu e os meninos? 
Primeiro que já manquei de cara, quando eu, arquiteta (céus), não coloquei uma “porta” no meu quarto. Eu me punha pra dormir e ficava cada vez mais desesperada e desconcertada, perdendo forças, cristal vermelho na cabeça, meu Deus, que acontece? 
Para dormir, como não tinha dinheiro, tive que vender uma cristaleira pra comprar.
Dai meus filhos começaram a brigar. Fui ajeitar a situação, mas um deles precisava... comer. Eu fui fazer um omelete e me queimei. Dei leite rápido pra eles, pois eles iam morrer de fome, e era grátis. Mas o leite deu dor de barriga num deles. Dai, confusa, vendi uma estante pra ter dinheiro pra alimentar minha turma com outra comida, tipo carne, hambúrguer. Consegui. Eles comeram, mas deu sono e eles ficaram entediados, e eu dai vendi todas as mesas de centro e laterais da casa pra comprar uma TV, só deu pra comprar uma de tubo, a única que tinha grana.
E mesmo assim eles brigaram de novo, e ficou um clima horrível na casa. Eu fui contemporizar, mas nessa hora uma hora umas pessoas me chamaram pra trabalhar, e bem nessa hora eu vi que eu tinha que comer algo, ai que saco de jogo. 
Não, isso não é brincadeira.
Dai eu me lembrei do passado. Já joguei The Sims, e da última vez morremos todos num incêndio causado por mim, porque estava exausta demais e esqueci o jantar queimando no fogão. 
Dá licença, Sims. Não pra vocês. Já é difícil essa vida real, impossível achar legal uma virtual que seja chata.
Estamos bem aqui nessa casa, o fogão não tá ligado, tem porta no meu quarto, já comemos todos, quero ir dormir e encerrar o jogo. Boa noite, Sims.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

há vida em callcenters

O exame era uma ressonância magnética, que tive que fazer mês passado por causa do meu joelho. Liguei para o laboratório para agendar, já imaginando aqueles infernais call centers. A moça me atendeu, pediu o número da carteirinha do convênio, escolhi a unidade mais próxima, disse o nome do exame, até ai tudo bem.
Foi quando começou uma parte super estranha.
- Dona Lúcia, porque a senhora vai fazer esse exame?
- Que? Hã?
- Qual o problema físico que a senhora tem?
- Eu? É que eu andei demais, forcei demais o joelho e tá doendo muito.
- Puxa. Sinto muito. Espero que não seja nada.
- Obrigada.
Mas o mais esquisito veio depois.
- Bom, senhora, agora tem uma parte chata, mas temos que fazer. Preciso que a senhora me passe o pedido médico, ou por email, ou por fax, torpedo ou correio.
- Pode ser por email... – respondi, suspirando.
- A senhora vai fotografar ou escanear?
- Hum. Acho que vou escanear.
- Pois então escaneie. Eu espero.
- Moça, vai demorar. Preciso ligar o scanner, salvar o arquivo, essas coisas.
- Tudo bem, eu espero. Tenho todo tempo que a senhora precisar.
- Como assim?
- Senhora, pode fazer tudo com calma, não precisa ter pressa. Não vou sair daqui. Eu juro.
- Você não vai me passar para outra pessoa, me deixar esperando, ouvindo música, nem me fazer ligar de novo?
- Não. Para evitar problemas, aguardo a senhora fazer o procedimento, vou receber seu email, vou finalizar e agendamos. Tudo só comigo.
Epa. Não era possível. Os call centers estão melhorando? Isso existe?
Como ela me orientou, fiz tudo no meu ritmo. Abri o scanner com calma, copiei, salvei o arquivo, abri o email, coloquei meu nome, anexei o arquivo, enviei.
- Alô? Moça?
- Oi senhora.
Incrível, ela ainda estava lá, me esperando. Depois de um tempão.
- Mandei.
- Já recebi, senhora. Está tudo ok. Podemos marcar. A data mais próxima é domingo as oito e meia da manhã.
- Domingo, moça? Tá maluca? Oito da manhã? Acha que não descanso?
- Senhora, como não sabemos se a senhora tem urgência, ou se sente muita dor, sempre devo oferecer o primeiro horário que tenho.
- Ah, tá, que gentileza a sua... – entrei no clima dela – Mas obrigada, prefiro na segunda.
- Na segunda a senhora pode escolher a hora. Não tenho nada marcado até as duas da tarde.
- Pode ser as onze da manhã?
- Sim senhora. Está ok. Vou mandar um email com instruções.
- Obrigada moça.

E gente, incrível, mas as coisas melhoram. Há vida em call centers.

sábado, 15 de novembro de 2014

moço com moço, véio com véio


Hoje vai ter festa aqui em casa. Não minha, de um dos filhos e não posso contar de quem. É um saco, antes eu escrevia no blog e ninguém dava a mínima, mas agora eles dizem que sou a mãe mais ridícula do facebook, que fica contando pra Deus o mundo coisas deles, então escrevo aqui sem nomes e sem detalhes. Bico calado.
- E mãe, mais uma coisa.
- Fala.
- Dá pra você vazar?
- Hã? Como assim?
- Não dormir aqui.
- Como? Mas é minha casa, minha cama, meu... E pra onde eu vou?
- Por favor, mãe. Libera, vai.
Bom. São sete da noite, todos os móveis da sala estão entulhados aqui no escritório, tem uma montanha de gelo na área de serviço e uns pacotes gigantes de doritos e ruffles na copa. E daqui a pouco eu vou “vazar”.
Estou me achando a maior mãe moderna de São Paulo, vazando dos embalos de sábado à noite da minha casa. Não me senti expulsa, embora até agora pouco eu não tivesse a mínima ideia de onde ia dormir. Porque todos já tão grandes, tenho até um filho que já saiu de casa, e pensando bem, acho que a casa tem mesmo que funcionar de modo diferente. Claro que é esquisito você pensar na sua caminha king, no seu ar condicionado, snif, seu edredom, tudo lá longe e você de hóspede de uma alma caridosa. Mas dá pra entender a necessidade da vazação da mãe numa balada. Imagina deixar eles correrem o risco da “mami” descer no meio da madrugada de camisola pra tomar água? Ou pior, para enturmar com os amigos deles por causa de uma insônia?
Mudou tudo, tenho que mudar também. Antes éramos uma família, papai, mamãe, filhinhos, cachorro. Passaram quase vinte anos, e agora somos três adultos morando aqui, eu e dois filhos. E três adultos tem que se entender. Minha mãe sempre me dizia: “moço com moço, velho com velho”.
Outro dia tava conversando com os filhos e divagando como vai ser a nossa vida daqui pra frente.
- Mãe,pensa que essa casa é igual o BBB. O papai (o meu ex), foi o primeiro eliminado, eu fui o segundo.- disse meu filho que saiu de casa - E agora vamos ver quem fica por último, Dona Lúcia. Será que você ganha?
Hahaha. Não faço questão alguma de ganhar, mas parece que eu que tenho mais chance. É bonito entender essas mudanças dentro do nosso lar.
E moços, podem dar festa a vontade que sou uma mãe vazada e vou pra casa de uma amiga velha.
Hahaha. Divirtam-se e juízo.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

a irmã da cinderela



Acho que no futuro não vai ter mais sapato de salto alto. Já usei muito salto. Minha mãe dizia que era importante saber usar salto, que era ruim mesmo, que doía mesmo, mas mulher tinha que usar pra ficar chique e não podia reclamar. Então eu e a Ângela usávamos salto alto quando precisava e sofríamos pra caramba. Salto alto espreme os dedos da frente, e, as veze, eles até adormecem, uma tortura. 
Teve uma época que eu usava plataforma, em outros tempos usei tamanco de madeira, até que me adaptei a um salto médio e não muito fino, mas horrível igual. Durante décadas fui uns cinco centímetros mais alta do que eu sou hoje. Vejo as vezes umas mulheres na rua se equilibrando naquelas agulhas, sério, perdão mas parecem paraplégicas, e não acredito que alguém possa colocar algo assim para... andar. 
Meu pai, quando era vivo (ele morreu em 1974), era ortopedista na época do sapato plataforma. Contava que com essa moda quase dobrou o número de pacientes da clínica dele, que nunca tinha faturado tanto.
Um dia sai com uns amigos. Entre eles, uma moça muito chique, toda maquiada, com uma roupa desconfortável e com saltos altíssimos. Fomos num restaurante, estava cheio e resolvemos ir a pé para um outro. Ela causou. Disse que a calçada era ruim e ela não podia... andar. 
O marido dela foi buscar o carro pois era impossível para ela percorrer... duas quadras a pé. Me pareceu a coisa mais absurda do mundo, gente, pensa bem, porque se tornar, por causa de um salto, uma mulher deficiente por vontade própria? Chegamos no segundo destino, e caraca, não deu certo de novo, o lugar estava lotadaço e inviável. E lá foi o marido buscar o carro de novo para carregar a mulher. 
Diante da situação cada vez mais surreal, sugeri trocar de sapato com ela e fazer um tipo de rodízio entre as mulheres da nossa turma, sugestão que todas concordaram pra não atrapalhar nossa noite, mas o pé dela era maior que o de todas nós. Ou seja, a gente cabia no sapato dela, mas ela ia ficar feito as irmãs da cinderela nos nossos confortáveis sapatos. 
Gente, coitado do marido, ninguém merece isso. Pé é para andar. Usar um salto desses é como colocar luvas com espetos nas mãos e escrever com aquilo. Fora o perigo de cair e parar num hospital.
Ontem vi um homem na mesma situação em Pinheiros. A calçada estava toda esburacada, e ele, o namorado, dava a mão pra paraplégica andar devagarzinho para não quebrar o tornozelo. 
Sério, gente, mulheres, vamos pensar bem. Pra que usar salto se, com ele, você precisa de ajuda pra andar na cidade? Não quero ser feminista, mas andar sozinha sem cair e se quebrar é o mínimo que a gente pode fazer por si mesma. Num acham?

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

minha nova ginástica



Me matriculei na hidroginástica. Demorei pra tomar coragem, pois minha mãe fazia, adorava, e depois que ela morreu eu olhava o maiozinho dela e chorava, olhava a touquinha dela, chorava. Mas como já faz um ano que ela se foi, como tou com problemas no joelho e o médico recomendou, respirei fundo e resolvi entrar n’água. 
Achei que era baba, afinal, dizem que hidro é coisa de terceira idade, de velhinho, e que eu, que me exercito todo dia, ia tirar de letra. 
Ahã. 
Primeiro dia. A mocinha professora em pé e aquele monte de velhinha, velhinho, marmanjo e marmanja (eu) ali, de touquinha e de molho na água. O problema é que a professorinha mostra os exercícios fora da água, mas quando você vai imitá-la dentro da água, é praticamente impossível fazer a coisa na mesma velocidade. Por mais que você tente, fica uma coisa completamente desconjuntada, feito um boneco de posto, astronauta na lua, dançarino sem ritmo e com aquela água espirrando pra todo lado. Simplesmente não dava pra seguir o ritmo da música tunc-tunc-tunc que tocava. Resolvi desencanar, ou dançava ou fazia ginástica. 
Dai notei a coisa da coordenação. Quando você faz ginástica normal e tem que alternar perna e braço num exercício, você presta bastante atenção na perna e no braço e dá tudo certo. Mas caramba, dentro da água lá dá pra ver as suas pernas? Ainda mais com aquele monte de onda, com todo mundo chacoalhando? Já nãos sabia se a perna era minha, do coroa do meu lado ou da japonesa do outro. Levei pitos da professora em todos exercícios, “não, não, não, lúcia!”. Pior que ela fala num microfone, a e sala toda ouve como você é descoordenada e má aluna. 
- Gente, é meu primeiro dia... – me defendi, envergonhada, pra toda terceira idade.
Segundo dia. A mocinha avisou que a aula era aeróbica. Achei a coisa mais hilária fazer ginástica de ar na água, comentei com todo mundo, mas só eu achei graça da minha piada. Bem, foi mais ridículo ainda. Depois de uns exercícios básicos, ela mandou a gente começar a correr no lugar. De frente de lado de costas, fazendo exercícios e dando pulos, cada vez de um modo diferente. E em cada um deles, tinha que correr a piscina toda, de um lado pra outro. Sabe aqueles sonhos /pesadelos onde você precisa fugir de um monstro mas não sai do lugar? É sonho hidroginástico. Por mais que você tente correr, a parte de lá da piscina não chega nunca. E o exercício final dessa aula foi o mais cômico. Tínhamos que correr no ar, ou melhor, na água mas sem os pés no chão, e flutuar, ou melhor, boiar em pé rodando as mãos. Parecíamos um monte de periquitos desesperados. Tentei fingir e correr no chão, mas a mocinha viu tudo e me dedou. Se a água fosse colorida dava pra enganar, mas com água transparente não dá. 
Olha. É uma ginástica pra lá de caricata, e um tipo de esporte, que (já pesquisei), sequer tem competição. Ainda não fiz nenhuma amizade, por mais que tentasse, mas sei que é questão de tempo pois costumo ser tagarela. E estou quebrada da cabeça aos pés. Não sei como minha mãe aguentava. E falando nela, lembrei que ela, volta e meia, errava e me dizia:
- Amanhã não posso sair com você porque tenho ginástica hidráulica, filha.
Hahaha. Era engraçada a mamãe.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

perdendo pedaços


Venho sofrendo abusos dos filhos, que já estão grandes agora. Começou a acontecer bem devagar, há um tempo, mas o estalo deu só agora.
- Mãe, dá a havaiana.
- A minha? Essa que tou usando?
- É, vai, to com pressa!
Carro não tenho mais. Bastou eu parar de trabalhar que eles acham que eu ter um carro (mesmo pagando mensalmente as prestações, a gasolina e os consertos) é um verdadeiro absurdo.  Agora eu preciso pedir para usar. Além do meu carro estar adesivado e cheio de roupas.
Comprei uma alpargatas outro dia. Mostrei pra minha filha.
- Linda. Adorei. Obrigada.
E saiu andando com ela.
Entro no escritório. Chico no meu micro. Ele nem mora mais aqui.
- Filho. Vai ficar ai?
- Sim, meu micro quebrou.
- Sério?
- Só hoje e amanhã – ele respondeu, sem me dar a mínima. Dois dias depois, quando ele “liberou” meu micro, olhei o teclado e faltava uma tecla. Agora, pra digitar “z”, tenho que apertar um pino. Acabei trocando de micro por causa disso.
Outro dia sentei aqui e dei pela falta do mouse (sim, eu ainda uso).
- Gente, onde tá? Quem pegou?
A voz veio de longe.
- Eu! Emprestei pra Tereza! E ela esqueceu no sítio!
Ouvi uma conversa telefônica do João outro dia, que me fez dar um berro altíssimo de “nããão!”:
- A gente faz a fogueira e apaga com o extintor do meu carro.
Comprei um aparelhinho de som pra ouvir na cozinha. A cada dia encontro ele em um lugar da casa. Outro dia sumiu.
- Levei pro meu trabalho, mãe. Eu precisava.
A cada dia que não durmo em casa, chego e encontro alguém lá, espalhado na minha camona. Meus shampoos? Ora, a cada vez que o de alguém acaba, pega o meu. Cerveja nem se fala. Se quiser guardar uma pra mim, acho que preciso esconder no armário. O Chico, que foi morar sozinho, outro dia fez supermercado na minha despensa. Não sei se isso tudo não é uma socialização bacana ou se eu bobeei e eles andam abusando. Mas ando perdendo pedaços. 
Deve ser uma fase da vida.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

a mãozinha



Desde que virei pedestre – meu carro foi parar nas mãos do meu filho João e nunca mais consegui recuperar, infelizmente – virei uma defensora assídua da regra da mãozinha. 
Quando surgiu a lei que fala que os carros têm que parar nas faixas de pedestres, eu, burra e toda empolgada atravessava sem olhar, orgulhosa do meu direito, mas quase morri atropelada diversas vezes. Geralmente depois desse “quase” atropelamento vinham os meus xingamentos, que pioravam de acordo com a velocidade do carro, com a marca do carro (se fosse chique demais me dava mais raiva) e com o risco que eu acabara de correr. Não achei aquilo seguro e tampouco saudável, pois tem uma energia mega negativa em xingamento. 

Resolvi mudar de método. Talvez fosse melhor ficar parada e esperar que os motoristas me sacassem (eu, a pedestre) e notassem a faixa (o lugar para a pedestre atravessar), mas também não tive sucesso algum. Demorava um tempão até que uma boa alma, bem informada e com um mínimo de coração, me deixasse atravessar. 
Dai veio a propaganda da “mãozinha”. Então precisa colocar a mão e avisar “por favor, carros, parem agora que eu quero passar”. Resolvi aderir ao método, já que é direito meu e falam tanto dessa “mãozinha”. Nas primeiras tentativas, ficava fora da faixa com a mão esticada, quase pedindo “por favor” e morrendo de medo de me atirar na correnteza. Digamos que esse método funciona, hoje, com 50% dos carros. Os outros apenas fingem que não te viram. Será que, sem a mãozinha, os motoristas não entendem que você quer atravessar? Será que acham que você tá ali para descansar, tomar uma brisa, fumar um cigarro ou admirar o transito? 

Depois de meses de treino, hoje acho que sou uma das melhores pedestres com mãozinha da cidade. Aguardo um carro com uma distância considerável, entro na faixa e coloco a mão na frente do carro, como se eu fosse um verdadeiro guarda de trânsito. Pare, eu digo mentalmente, quase telepaticamente e, diante da minha autoridade, e eles param mesmo. Nossa, tenho vontade até de comprar um apito, se é que adianta, todo mundo anda trancado, com ar condicionado, rádio e celular. Pare! E quer saber? Já parei ônibus, caminhões, vans, motos, e acreditem: até bicicletas, a minha maior vitória. Sou uma grande paradeira de veículos, podia até dar cursos. Agora, acho que para a coisa funcionar mesmo, nós, pedestres devíamos fazer uma campanha: além da mãozinha, devíamos usar na mãozinha o celular no modo filmagem. Ahá! Cuidado motorista, você está sendo filmado.