segunda-feira, 31 de julho de 2006

sonho? eu, hein?




Tive um sonho super legal hoje.
Mas não conto.
Perdões, mas não conto mêêêsmo.
Muitas vezes eu lembro animada de um sonho que tive e morro de vontade de escrever aqui no blog. Tem uns que são uma piada. Mas sempre me reprimo e rapidamente tiro a idéia da cabeça. Essa coisa de contar sonho, que sempre achei que era um assunto frugal, levinho e despretensioso, pode se virar de modo diabólico contra você, dependendo do sonho e para quem você conta aquilo.
Vixe.
É que as vezes esquecemos que existem pessoas que interpretam os sonhos. E isso é um perigo, vocês não queiram nem saber. Não entendo porque interpretações de sonhos têm que ser sempre coisas tão densas e vexaminosas. Será possível que todos os sonhos tem que ter interpretações sexuais, tem que pegar na ponto crítico do casamento, tem que cutucar a coisa que dá mais vergonha em você, tem que falar do assunto que você mais evita? Tá, sabemos que os sonhos são escritos com o caldeirão destampado, mas não precisamos exagerar.
Tudo por causa de uma experiência traumática. Há mais de dez anos, quando eu tinha os filhos bebês, arrumei um emprego de meio período. Minha vida era a maior correria, mas eu estava sem grana e precisava trabalhar. Quando soube desse trabalho, fui até lá e o convenci o arquiteto-dono que eu faria tudo que deveria ser feito em meio período. E assim eu fiz – chegava cedão e trabalhava feito uma tarada até as duas, quando voltava correndo para casa para cuidar dos pimpolhos. Acho que por causa da correria, da canseira e da maluquice que se tornou aquilo tudo, que um dia eu cheguei, sentei e, mesmo trabalhando e desenhando, comecei a contar para um outro arquiteto ao meu lado um sonho estapafúrdio que eu acabara de sonhar. Era um sonho bem lelé, que envolvia a queda dos meus dedos da mão, cada um bem devagarinho, o meu clube, uma mulher que gritava comigo e um avanço de formigas sobre meus pés. Bom, contei o sonho para o cara com todos os detalhes, o lugar, o que acontecia, quem falava comigo, o que eu sentia, ou seja, descrevi a cena todinha, rindo. Ele, que estava apenas ouvindo e trabalhando, também achou engraçado, e nós dois demos aquelas risadinhas de colegas de trabalho e falamos “nossa, cada uma...” e “... tem cada maluquice que a gente sonha, né?”.
O que eu não imaginava é que o arquiteto dono do escritório estava ali, atrás de mim, tomando um cafezinho e ouvindo tudo. Tudo, tudo, tudo, que droga. E eu não imaginava também que ele era um aficionado, estudado, analisado, terapeutizado, pasteurizado e interessado até a alma por... sonhos.
Céus.
Ele entrou animadíssimo no salão com seu café. Era como se aquilo fosse com ele. Pigarreou e ali, na frente de todo mundo, ele passou a analisar o meu sonho de dedos caídos, formigas no pé, clube e mulher gritando de um modo completamente obsceno, gente. Olha, vocês não imaginam a pornografia que ele disse que eu sonhei- uma coisa horrível, absolutamente indecente. No final da explicação todo mundo olhou para mim horrorizado.
Nossa. Que tipo de mulher que eu era?
O pior de tudo é que eu não entendi patavina – a explicação não tinha nada ver comigo ou com a minha vida, mas Deusmelivre estender aquela conversa constrangedora. Aceitei e passei seis meses sendo considerada uma pessoa perniciosa, de sonhos picantes, com uma mente absurdamente nociva.
Eu, hein? Depois disso, sonhos nunca mais.

sábado, 29 de julho de 2006

sexta-feira, 28 de julho de 2006

o sapo bem olhado


Estávamos no meio de uma estrada quando percebi uma enorme quantidade de bancas de beira de estrada vendendo objetos de cerâmica para colocar no jardim. Eram muitos, de todos os tipo - desde os anões e a Branca até vasos modernosos. Estátuas, cavalos, bichos.
- Uau. Eu morro de vontade de ter um cogumelo no jardim - falei, meio sem querer - daqueles tipo "disney". Acho engraçado.
- Lá vem a mamãe com as invenções dela - falou um dos meninos, debochando de mim - Mãe, cogumelo é coisa de drogado!
- Que é que tem? - o Zé me defendeu - A vida é uma só, seus tontos implicantes - ele disse, encostando o carro numa das bancas.
- Vamos comprar o cogumelão da mamãe.
- Sério? - eu disse, pasma e felicíssima - Uau. Teremos um cogumelão Disney no jardim de casa!
Bom, escolhi e comprei um enorme, lindo, com três bolotas presas num tipo de galho. A mulher embrulhou bem, com muito jornal, colocou numa caixa e colocamos no carro. Na hora que eu saia dali, ela chamou.
- A senhora não vai levar sapo?
- Como que é?
- A senhora veio aqui pra comprar só o cogumelo? Não vai comprar sapo?
- Eu deveria comprar um sapo, moça?
Ela arregalou o olho. Como eu não sabia daquilo?
- Minha senhora, todo mundo quem vem aqui compra sapo.
- Sapo? - olhei ao redor e reparei.
O lugar estava entupido de sapo. Não tinha reparado. Olhei a mulher de novo.
- Mau olhado, senhora. Sapo no jardim tira mau olhado, não sabia...?
Ô saco. Obvio que depois desse comentário "bem olhado", acabei adquirindo o meu sapo também. Que já está no jardim, olhando e engolindo tudo que vem de mau.
Mulherzinha esperta.

Ah, e o cogumelão? Quebrou tudo na viagem de volta, uma pena, estou desconsolada. É de louça, frágil, vou tentar colar no final de semana.

E...
Hoje tem crônica na paradoXo: “O sapato social”

quinta-feira, 27 de julho de 2006

sem culpa...



- A gente não vai no jantar da Cristina? – o Zé me perguntou.
- Ai, Zé, vamos não ir?
Ele fez uma cara de quem topava na hora.
- Ééé... é sempre aquela coisa chata, aquelas conversas de sempre... Isso, vamos não ir. Então faz uma coisa pelo menos, Lú. Liga lá para eles e avisa – o Zé me ordenou – E arranja uma desculpa aí.
- Euuuu? Ah, não. Liga você.
- Da última vez já fui eu que liguei. Aquela vez da casa do Ricardo. Agora é a tua vez.
- Eu não sei dar desculpa, Zé. Você é muito melhor que eu nisso. Mais seguro.
- Eu? – ele se defendeu – Nem vem, eu sou péssimo.
Porquê será que a gente não sabe dar desculpa? Olha, há anos que essa cena acontece comigo e com o Zé e a gente não sabe o que fazer. A gente olha um para a cara do outro e começa a listar um monte de mentiras, até chegar em uma que a gente ache que vai funcionar. E que a gente consiga executar.
- Fala que você vai trabalhar – eu digo.
- Essa desculpa eu já dei da outra vez.
- Resfriado?
- Não gosto de desculpas com doença.
- Vamos falar que temos que levar os meninos numa festa.
- Ela vai falar para a gente ir depois. Não cola.
- Vamos falar que já temos ingresso para um teatro. Que ganhamos uns ingressos do vizinho.
- Isso.
- Qual peça?
- Pega o guia, a gente escolhe uma.
Olha, gente, eu sei que esse diálogo meu e do Zé é totalmente politicamente incorreto, sei que eu jamais deveria colocá-lo aqui e sei que vou me meter na maior encrenca do universo depois disso, pois agora qualquer desmarcação de verdade parecerá uma desculpa esfarrapada, mas esse é um grande assunto: as nossas milhares de pequenas mentiras e desculpas.
Para mim é uma coisa absolutamente incômoda, da qual eu tento sempre me desvencilhar empurrando para o Zé. E ele idem. Tento esquecer, deixar para depois. É que é uma coisa que eu não sei executar bem, essa coisa de “dar desculpas”. O engraçado é como uma desculpa de verdade funciona melhor que uma desculpa de mentira. Por exemplo, se não vamos no jantar da Cristina porque estou resfriada, eu pego o telefone na maior, ligo para a Cristina e digo numa boa que não vou porque estou resfriada. Mas se o resfriado é mentira, eu fico embromando a Cristina, explicando mil vezes esse tal de resfriado, encompridando a mentira do resfriado, o que, na minha opinião, fará a Cristina até “desconfiar” daquilo. Ou me internar, pois devo estar praticamente à beira da morte. Olha, a desculpa legítima é sempre mais convincente.
Dãr. Conclusão mais boba.
A questão é que sempre nos utilizamos muito dessas pequenas mentiras para escapar de situações incômodas. O mais maluco é que aprendemos, desde a infância, que essas mentiricas não são é propriamente “mentiras”, que são apenas uma “desculpa” para não fazer alguma coisa. E aceitamos essa coisa estapafúrdia nas nossas vidas: que uma “desculpa” é muitíssimo diferente de uma “mentira” – o que na verdade é outra mentira. Mas tem a sua lógica – ao mesmo tempo que a educação ensina a se desculpar, aprendemos a não magoar.
Acho que tem a ver.
Sem culpas.
- Teatro, então?
- É.
- Vou ligar, Lu.
Nossa, que absurdo, mas juro que isso é a mais pura... verdade.

a solução do enigma


Não era tão difícil assim, vai gente... E Fitz, foste o campeão. Te devo um choppe e pode me mandar uma foto sua para o post - homenagem. Farei uma fotochopagem 'da hóra'.
hehehe.

quarta-feira, 26 de julho de 2006

leitura manual I



Pois bem.
Isso aqui hoje não é um post, e sim um teste. Falamos o dia todo uns com os outros, lemos quilômetros de posts e não sabemos nada das verdadeiras letras de mão dos blogueiros e leitores. Assim, recolhi - ao longo de uns meses - meio sem querer, algumas "letras".
Taí.
De quem serão? Quem adivinhar ganha um choppe da franka e um post especial com fotochoppagem de maiô. É fácil, é só relacionar certinho o nome à letra:
a. alberto a. (carne crua)
b. pecus (pecus bilis)
c. marcio (comentarista)
d. guga (ao cubo)
e. f. stickel (aqui tem coisa)
Ah. E aceito letras dos demais, que não estão aqui, para a parte II dessa "leitura manual"

terça-feira, 25 de julho de 2006

dia do escritor?

Foi a Márcia Kawabe que acabou de me avisar desse evento fantástico que acontece hoje. Duvidei. Dia do escritor?
- É sim. Está escrito aqui na minha agenda - ela disse.
Duvidei mais ainda.
- A sua agenda é desse ano, ô Márcia? Porque tem gente pão dura que usa a mesma agenda anos e anos.
- Eu juro, é de 2006 - ela falou, indignada - mas pra você acreditar vou procurar no gugol. Perai.
E ai está.
Parabéns e desejo a todos os escritores do Brasil que não fiquem iguais ao velhinho caquético da imagem acima.

O dia do escritor


Após o sucesso do I Festival do Escritor Brasileiro, em 1960, foi decretado por decreto governamental que o dia 25 julho seria o Dia Nacional do Escritor. A iniciativa partiu da União Brasileira de Escritores, através de José Peregrino e Jorge Amado, presidente e vice, respectivamente.
Para o Mestre em Literatura Brasileira, Gabriel Perissé, "o escritor convence graças ao poder de sua paixão pela palavra, e não prioritariamente pela paixão que dedique a uma causa. Ou melhor, a sua causa sempre foi e será a palavra, caminho e céu de todas as causas. E de todas as paixões."
Muitos escritores ao longo da história da literatura publicaram suas obras com nomes diferentes. Charme e mistério fascinavam leitores em todo o país. Sérgio Porto, por exemplo, assinava "Stanislaw Ponte Negra". Carlos Drummond de Andrade era o escritor Antônio Crispim, embora tenha utilizado "Mickey" e "Gato Félix" quando jornalista crítico de cinema; Lúcia Carvalho, se utilizou do pseudônimo de "Franka" e viveu anos e anos escondida num blog atrás da imagem de uma boneca vestida de largartixa preta sempre em posição de fuga. Mas, sem dúvida, o campeão dos heterônimos foi Fernando Pessoa, que assinou distintamente oito vezes.

devolver pra quem?



Dentro do avião, voltando para São Paulo.


“... e dentro de alguns instantes estaremos descendo no Aeroporto Internacional
de Guarulhos”


- Mãe.
- Oi.
- Me responde uma coisa?
- Fala.
- Se esse avião cair e se espatifar no chão, eles devolvem para a gente o dinheiro da passagem?

segunda-feira, 24 de julho de 2006

o fim das igrejas matrix



Foi no meio de uma das viagens de carro. Imaginamos que chegaríamos ao nosso destino no final da tarde, mas como eu e minha família somos muito, mas muito, mas muuuito atrasados mesmo, estava escurecendo e nem tínhamos alcançado a metade do caminho.
- Ixi. Melhor a gente parar e dormir nessa cidade, gente - eu sugeri.
Era uma cidade do interior de tamanho médio, como qualquer cidade de tamanho médio do sudeste e do sul do Brasil. Pelo guia descobrimos havia um hotel razoável no local, “para eventos”. Ora, se executivos vão até lá para participar de congressos e conferências, estaria tudo ótimo para nós.
Depois de nos hospedarmos, resolvemos tomar um café e conhecer a tal cidade. Ver a praça, a igreja “matrix”, a prefeitura, a rua do comércio, tomar um sorvete, essas coisas que eu e meio mundo sempre fazemos quando vamos a uma cidade do interior.
Pegamos uma avenidona e andamos por ela todinha, mas não achamos nada que nos lembrasse um centro. Andamos em todas as indicações de bairro, de pontos de referência, de placas, até que caímos numa rua com muito comércio e uns edifícios mais antigos. Percorremos a rua toda, mas parecia que a coisa não... pegava. Era muito estranho. Aquela rua não parecia uma rua de comércio de uma cidade de tamanho médio de interior, pois estava vazia demais. Foi quando apareceu uma praça com um estacionamento dentro. Entupida de carros. Bem, naquela praça até havia uma igreja, mas o prédio não tinha destaque nenhum. Não, aquela não era a pracinha principal da cidade. Impossível! Cadê tudo?
- Vai ver que não tem, ô mãe. Vai ver que essa é uma cidade sem praça e sem igreja.
- Impossível, Chico. Não existe cidade no mundo uma cidade sem centro, e não existe no Brasil cidade sem pracinha e sem igreja "matrix". Não no Brasil, não no interior. Tem algo muito esquisito nessa cidade.
- Cidade mais estranha – falou o Zé.
A resposta veio no dia seguinte, na saída da cidade. Quando fomos pegar a estrada, demos de cara com um mega blaster super hiper shopping. Paramos o carro e fomos verificar. Era inacreditável. Estava tudo ali. Todo o comércio da cidade, tanto o local quanto o globalizado, com seus Boticários e Chili Beans da vida. Estava lá o supermercado, a academia de ginástica, o cinema, o bar com o choppe tradicional, a sorveteria. Tudo lá dentro, fechado, climatizado e bem longe da... cidade. E nesse lugar, num dia de semana, de manhã, estava lotadaço, como deveria estar a cidade, que estava às moscas.
Olha, quer saber? Absurdo shopping. Eu nunca liguei muito para essa briga, nunca fui radicalmente contra os shoppings como alguns colegas arquitetos, não sou uma pessoa saudosista, mas é visível no desenho urbano de uma cidade que a construção de um mega shoppings fechados detona o perfil urbanístico do local. Com essas construções encaixotadas, que hoje em dia existem em todas as cidades, estamos acabando com as cidades do interior. Posso estar falando bobagem, não sei se é pensado para ser assim, se existe um projeto de urbanismo em tais cidades onde essas construções melhoram a cidade e dão espaço para outras atividades. Pode ser, mas acredito que não. Acredito que estamos a mercê de um modismo baseado no consumo e que e dane-se todo o resto. Sem igrejas, sem sorveterias, sem pracinha. O Zé acha que deveríamos iniciar uma campanha contra os shoppings, mas acho impossível a gente, nessa altura do campeonato, querer eliminar a idéia do shopping. Quem somos nós contra os Boticários da vida. O ideal seria, acho eu, fazer movimentos a favor das igrejas matrix.
SOS pracinha!
Bom, tomamos um café ótimo no shopping escuro. O lugar era cheio de TVs e seguranças. Só não tinha igreja lá dentro. Mas convenhamos, nos shoppings os santos são outros.
Pois é. Já vi isso em algum lugar.

domingo, 23 de julho de 2006

franka, o retorno

foto da franka pequenininha tirada pela filha dela, a luciana

Voltei. E como sempre em todo final de viagem, voltei bem pequeninha.
Essa questão da escala me perseguiu o tempo todo. Eu sempre achei que viagens encolhem um pouco a gente. O mundo é grande demais, mas a gente está sempre tão envolvido nas nossas coisas que essa imensidão passa despercebida.
Eu sempre volto de viagem com um pensamento engraçado. É assim. Eu viajo e conheço um monte de lugares. Dai quando eu volto eu passo uns dias ligada e, com uns pensamentos nostálgicos da viagem do tipo:
- Nossa, eu estou aqui e aquele garçon simpático daquele hotel deve estar agora tirando a mesa do café...
- Três da tarde. Eu aqui trabalhando e aquele museu daquela cidade deve estar cheio de gente... aquele quadro naquela parede, o café, a lojinha...
- A gente aqui, vendo TV, ô filha, e aquela montanha linda está lá, paradinha, naquele mesmo lugar... com aquele sol batendo nela...
- Gente, pensa. Enquanto a gente está aqui na nossa casa, aquele rio e aquele lago estão lá, daquele mesmo jeito que a gente viu no fim da tarde daquele dia... paradinhos...
Mas depois de uma semana eu cresço e esqueço. Desculpem o post meio bobo, mas cheguei há pouco, maior canseira.
Eu aqui e aquilo tudo...

domingo, 16 de julho de 2006

AS FÉRIAS DA FRANKA


Vou sair uns dias de férias, gente. Espero conseguir ficar sem escrever. Volto em breve. Tchau.

esse negócio de “sistema”




Olha. Voltando ao assunto da minha reunião no Rio de Janeiro na sexta feira, saibam que não foi nada fácil chegar no Rio de Janeiro na sexta feira. É que não gosto de falar das coisas ruins, acredito sempre que a gente é o que a gente traz para os outros. Já disse isso em algum lugar, que temos conosco um enorme caldeirão onde vamos fazendo uma sopa e que ao longo da vida vamos escolhendo o que colocar dentro. Dependendo do que colocamos a nossa sopa fica doce, temperada, nojenta, asquerosa, salgada, gostosa ou intragável. Se colocamos coisas amargas ela fica amarga e ninguém quer tomar, se colocamos açúcar demais ela fica enjoativa e as pessoas enjoam, assim temos que aprender a temperar, a selecionar assuntos e sabores para que as pessoas gostem da nossa sopa. Por causa disso eu não gosto de colocar ingredientes ruins nas minhas sopas, sempre prefiro torná-la suculenta de coisas boas. E por causa disso eu não contei a parte ruim da viagem do Rio. Mas como agora já passou a raiva, dá pra comentar e até analisar o que houve.
Fui na sexta feira bem cedinho. Tinha uma reunião, não pretendia chegar atrasada. É muito difícil eu acordar cedo, cada um é de um jeito, eu sou daquele jeito que gosta de dormir bastante de manhã, acho uma delícia ficar rolando na cama, chego a rir sozinha quando penso que estou deitada e que posso continuar ali mais um tempinho, portanto foi um terror acordar às cinco e meia e no frio, mas trabalho é trabalho. Acordei, tomei um banho meio frio, peguei um táxi e lá fui eu, mau humorada, pra Congonhas.
Olha, eu não achava que as coisas poderiam ser piores que isso, mas foram. Bastou entrar no aeroporto, ali onde é a TAM, no fim do prédio, que percebi o caos. O lugar estava entupidaço de gente. Era tanta gente, mas tanta gente, que não dava para entrar. Juro. E essas pessoas todas, acreditem, estavam em filas, em diversas e milhares e múltiplas filas que se enroscavam feito milhares de minhocas, feito uma macarronada humana, feito um gigantesco novelo de lã. Eu fiquei parada tentando entender aquela coisa as seis e dez da manhã. O que caramba era aquilo? Que caos pesadelesco era aquele?
Comecei a andar a esmo, até que resolvi perguntar onde-era-caramba-a-fila-da-ponte-aérea, e uma senhora apontou um outro balcão, do outro lado. Ufa. Ao menor eu sairia dali. O lugar da ponte aérea de longe parecia menos entulhado. Parecia. Quando vi tinha uma única fila que percorria o prédio todo, era inacreditável, passava em frente ao balcão da Varig, não é possível, passava em frente ao balcão da Gol, ó céus, entrava no corredor das lojinhas, quase no saguão principal e acabava ali. Ai. Foi horrível achar e acreditar naquele fim-de-fila. Aquele lugar significava que eu só alcançaria o balcão horas e horas e horas depois. Uma fila digna de uma crônica reclamenta.
- É que não tem sistema – me explicou uma senhora argentina na minha frente – E eles estão fazendo chéquim manual, por isso tem essa fila.
Pois vejam só. Óbvio que isso pode acontecer, essa coisa de não ter sistema num chéquim. Mas são inacreditáveis as conseqüências de chéquim sem sistema, gente. Entulhamento máximo, avalanche humana, caos macarrônico, uma coisa impressionantemente desastrosa. Uma verdadeira calamidade. Ao menos eu não estava de salto agulha como a argentina, coitada.
Bem, a passos de formiga a fila andava, mas para resumir, fiquei ali duas horas e dez para conseguir embarcar num vôo. Mas de nada adiantou embarcar, pois dentro do avião o piloto avisou que só poderia sair com plano de vôo, e que só receberia um plano de vôo quando o sistema voltasse. Assim, passamos mais quarenta minutos apertados dentro do avião, eu na poltrona do meio, óbviamente azarenta, entre dois gordinhos de terno, tentando cochilar.
Conclusão. Tudo culpa do 'sistema'. Por trás de uma empresa aérea, por trás dos supermercados, das lojas, das empresas, das fábricas, dos escritórios, existe sempre um tal de ‘sistema’. Esse 'sistema' pode ‘cair’ a qualquer momento, e se ele cair, babau. Sem sistema você não voa, não come, não compra, não paga. Nada mais é feito a mão, nada mais é feito sem sistema. Não sei exatamente o que é “cair o sistema”, se ele cai no chão, na rua, do prédio, se ele cai sentado, se se esborracha, mas sei que quando ele cai é o caos. Um dos maiores perigos da humanidade hoje em dia é isso. A queda do sistema.
Resumindo, cheguei super atrasada. Mas descobri uma coisa legal. Uma “queda de sistema” é uma ótima desculpa para dar para chegar atrasada em reuniões. Quer saber? Da próxima vez que eu tiver uma reunião no Rio vou dormir até as nove e meia, chegar atrasada e culpar o sistema.
Nossa, como caem esses sistemas, gente.
Hehehe.

sábado, 15 de julho de 2006

no escuro das gavetas


O Rio é sempre muito legal, super bonito, colorido. Parece que tudo por lá é mais aceso e claro do que o resto do mundo, uma claridade que nós, paulistas, jamais poderemos entender. Eu falo do brilho, da luz. O Rio de Janeiro é uma cidade acesa, já São Paulo não é acesa nem dentro de shopping. Reparem, tem uma coisa em São Paulo que funciona como um tipo de óculos escuros, existe uma neblina em cima de tudo, engraçado, a cidade por mais que esteja feliz e funcionando é sempre embaçada, sem cores, uma cidade atrás de uns óculos escuros, atrás de um protetor insulfilme, escurinha, sóbria. O Rio é como uma lâmpada mais possante, uma lâmpada de 200w, de 500w, São Paulo está sempre com uma luzinha de 60w, fraquinha, mal iluminada. A luz do Rio não vem só de cima, essa é a impressão que tenho, parece que vem de todos os lados, podermos até conjecturar que também vem da água e das pedras das pessoas e do calor, mas é uma coisa além disso, acho que vem da alma da cidade, das pessoas, ou apenas talvez dentro do olho de quem vê.
Era isso o que que tagarelava num intervalo de uma reunião ontem lá no Rio quando uma colega de São Paulo que estava comigo declarou que não ia à praia no Rio nem morta por causa disso.
- Porque? Muito gostoso ir à praia aqui, eu morro de vontade de largar tudo e ir dar um mergulho – declarei.
- Tá maluca? Louca? Imagine se praia do Rio é pra o nosso bico, ô Lúcia. Praia no Rio é para as mulheres que moram no Rio.
A teoria dela era mais ou menos a seguinte. Segundo ela, as mulheres do Rio estão super acostumadas com o excesso de claridade e são muito seguras dos seus corpos. Isso não tem absolutamente nada a ver com estar gorda ou magra, ou branca ou morena, tem apenas a ver com a capacidade de ficar pelada naquela luz absurda.
- Já as pessoas como nós, mulheres que não moram no Rio, não sabemos ser tão nítidas. Não sabemos nos mostrar com tanta clareza numa boa. Estar numa praia no Rio, no meio daquelas mulheres tão naturalmente à vontade com a claridade, para nós, Lúcia, é como estar sem pele, com as vísceras todas a mostra. Um vexame praia no Rio.
Ela tem razão. Embora alguns paulistas consigam ficar de biquíni ou sunga em litorais-nortes ou em ubatubas, a maioria anda pelas praias morrendo de vergonha, repara. Aliás, mulher paulista só “anda” de canga ou shortinho, nunca só de biquini.
Sim, mas e daí? Nós aprendemos a gostar das coisas um pouco mais escuras, ora. E fechadas. Ficamos muito mais a vontade assim, dentro, protegidos nas nossas casas, nos nossos cantinhos, nas nossas gavetinhas à meia luz.
Cada um, cada um.

sexta-feira, 14 de julho de 2006

a mulher parmesão



Eu e dois amigos almoçamos juntos ontem no Shopping. Na saída estávamos animadamente conversando na fila do pagamento do estacionamento quando um deles interrompeu a conversa subitamente.
- Argh, que cheiro horrível, nojento, gente. Parece vômito de nenê. Tão sentindo?
O meu outro amigo fez uma cara de asco. Era um cheiro bem fedido mesmo.
- Urgh. Azêêêdo...! Vômito puro, éca.
Foi quando a mulher que estava na nossa frente na fila se virou.
Sorriu.
Na maior.
Felizona.
- Ahhh. Esse cheiro ruim não é de vômito de nenê não. É disso aqui que eu estou comendo. Um pretzel de parmesão.
Nós três ficamos atônitos, mas ela continuou, nem aí com nada. Mostrou o pretzel e mandou.
- Olhaqui. Cheira super mal, fede pra burro, mas é uma putz delícia. Hummm.
Diante do olhar pasmo de todos nós, que não conseguíamos falar nada, ela ainda colocou o pretzel de parmesão no nariz de um dos meus amigos.
- É esse cheiro aqui, não é?
Óbvio que era, mas ele disse que não, confuso.
Bom.
E ela se virou, pagou o estacionamento, nos deu tchau e foi embora, comendo na maior alegria o... urgh... pretzel de parmesão.
Vai entender...

E fiquem com a crônica na paradoXo hoje: "As pernas e os celulares!" , que hoje lá vou eu para o Rio. Té!

quinta-feira, 13 de julho de 2006

boiando nos blogs



Foi ontem na hora do jantar.
- Ah, é mesmo. Você tem blog, mãe... – falou o Chico, rindo de mim – Gente, lembra, a mamãe é uma tal de “Franka”, ahahaha!
- Mãe, eu nem lembrava mais disso – falou a Nani.
Resumindo, os meus filhos não dão a mínima para o “frankamente...”. Nem aparecem por aqui.
Não é uma coisa que eu ligue. Quer saber? Ainda bem que eles tem mais o que fazer do que vir para o “blog da mamãe”. Dá licença, por mais que eu possa ter algum talento bloguístico, eles são meninos e jovens e estão interessados lá nas coisas deles.
A conversa surgiu porque lembrei que em agosto este blog fará dois anos. Não é estranho? Dois anos é muito tempo para uma coisa esquisita como um blog.
Esquisita?
Sim, esquisitérrima, na minha opinião. Quando estou aqui dentro me sinto absolutamente a vontade, mas quando tenho que “explicar” essa coisa para, por exemplo, uma tia do interior, me sinto uma ET explicando como é viver em... Plutão. “Sabe, tia, é um lugar virtual onde você vem, escreve umas coisas todos os dias e onde vem um monte de gente que também tem lugares virtuais ou não e comenta as coisas que você escreveu. Entendeu?”. Obvio que ela não entende patavina, nem como é, nem pra que serve. Por isso eu ainda acho blog esquisito – porque um monte de gente do mundo sequer sabe o que é.
Mas é possível identificar um monte de características desse lugar – óbviamente sem concluir nada.
Primeiro que você tem que escrever todos os dias, quase sempre na mesma hora. A rotina de um blog, além de te disciplinar, dá público. Acho que isso faz bem para os dois lados. Por exemplo, hoje tem um monte de ataques do PCC aqui em São Paulo, mas num passeio pelos blogs você vê que as pessoas postaram e estão pensando em outras coisas. Dá um certo ânimo pensar as pessoas não pensam no que dizem os jornais.
Depois noto que para ter um blog você tem que ter um produto. O que eu vendo aqui são crônicas, algumas histórias e opiniões. Tem gente que vende fotos, outros que vendem relatos de viagem, outros bobajada, outros poesia. Um blog é como uma loja, tem que ter produtos legais para vender.
Depois tem o tempo. Os visitadores nunca ficam muito dentro do blogs porque a hora da leitura é sempre no meio do trabalho – saibam, vem muito mais gente em horário comercial do que nos fins de semana. Então você, que escreve, tem que saber escrever pouco. Se escrever muito o chefe do visitador desconfia e o visitador foge sem comentar.
Já comentar é outro negócio. Pouca gente tem coragem, é engraçado. Mas imagina se todo mundo que vê um filme no cinema manda email para o diretor, ou se todo mundo que come num restaurante vai até o dono e fala o que achou da comida. Não acho isso tão importante. As pessoas não precisam falar nada se não quiserem.
Mas tudo para dizer que a cada dia mais acredito nessa mídia. Passo um tempão aqui, aprendo, converso, adoro, fiz um monte de amigos. Dentro em breve, tenho certeza, ninguém mais vai ler jornal escrito. Eu, que sempre fui a maior defensora, vou acabar des-assinando os dois jornais que recebo aqui em casa, pois leio tudo que preciso no UOL.
As coisas mudam muito e muito rápido. Perdão pelos gerúndios, mas ou você fica do lado de quem está indo ou do lado de quem está ficando.
Eu prefiro tar indo, gente.
Frankamente...

quarta-feira, 12 de julho de 2006

o empilhamento máximo





Eu e meu ex-sócio usávamos esse termo, “empilhamento máximo”, para descrever a arrumação que uma faxineira fazia num escritório que tivemos. Ela vinha uma vez por semana, e sempre no dia seguinte era aquele susto.
- Ixi, droga! – ele dizia ao entrar na sala – Esqueci que hoje é dia de 'empilhamento máximo'...
Naquela época ninguém tinha computador e usávamos muuuito papel para trabalhar, tanto para desenhar quanto para fazer anotações, croquis, relatórios, planilhas, etc. A mulher vinha, limpava o escritório, deixava tudo tinindo mas empilhava todos os nossos papéis e projetos numa única e sensacional pilha enorme, que parecia um edifício de dez andares sobre cada mesa. Era desesperador, pois as coisas ficavam perdidas ali para sempre. Demorávamos tanto para achar o que queríamos que acabávamos desistindo. E assim a coisa ia até a semana seguinte, onde a mulher voltava para outra faxina e tudo se repetia. Ela empilhava até onde dava - quando a pilha atingia o nível máximo suportável antes de despencar, ela iniciava a construção de outra pilha, onde tudo se perdia novamente. Assim as nossas mesas eram compostas de diversas pilhas máximas e completamente instáveis.
Naquela época a nossa vida era composta de 'empilhamentos máximos'.
Eu sempre fui intrigada com aquilo, pois embora fossemos incapazes de nos desfazer das pilhas, não usávamos nada que tinha ali. Eram montanhas de nada, de papel acumulado, inútil, estático. De um certo modo eu ainda faço isso – aqui no meu escritório eu estou sempre entulhada de papéis num, digamos, empilhamento médio e disperso, o que dá na mesma, obviamente, uma vez que também não acho nada.
Lembrei disso quando vi a notícia daquela mulher que guardava em casa pilhas e pilhas de lixo. Morro de medo de chegar a aquele ponto. A quantidade de inutilidades que eu junto é absurda. No trabalho, em casa e até dentro do carro. E não são somente as pilhas, o pior para mim são as gavetinhas, minha casa é infestada de gavetinhas cheias de coisas inúteis. E céus, olhando ao redor não estou muito longe da foto do jornal.
Vou aproveitar esse mês de julho para dar uma eliminada nas pilhas. Para, quem sabe, começar outras.
A vida sem coisas máximas não tem muita graça.

terça-feira, 11 de julho de 2006

o carro caolho


Foi no sábado a noite. Fui na Blockbuster tirar um filme com minha filha, estacionamos o carro na frente do vidro da locadora e...
- Aaa! Olha, Nani!
- Aaa! O carro tá vesgo, mãe!
Pois é. Um dos faróis da frente queimou e o meu carro está caolho. Gente, vou confessar uma coisa: não tem coisa que mais me envergonha do que carro caolho. Odeio carro caolho, tenho horror de carro caolho. Toda vez que vejo um carro caolho na rua morro de dó. "Coitado, caolho, eu penso". Andar em um carro caolho é o mesmo que andar com uma calça rasgada no bumbum, é o mesmo que ter um adesivo grudado nas costas, é o mesmo que andar com bigodes pintados na cara e não saber.
Humilhante carro caolho.
A questão é que a gente nunca sabe quando o nosso carro está caolho, pois nunca o encaramos de frente com farol ligado - ora, se estamos fora do nosso carro ele está com os faróis desligados. E como não há espelhos para carros nas garagens e nem apito interno que avise, podemos conviver na santa ignorância com um carro caolhão por meses e meses, sem ter a mínima idéia que estamos dando aquele vexame.
A única coisa que me alivia é que eu estou caolha na frente, não na traseira. É melhor ser vesga na frente do que atrás, pois lembro de uma observação que o João, meu filho menor, fez uma vez. Segundo ele, a parte mais importante de um carro é a parte de trás, a bunda, pois é a parte que mais vemos no trânsito. A da frente a gente quase nunca vê, a não ser que esteja a pé ou rapidamente pelo retrovisor.
De qualquer modo preciso arrumar aquilo urgente.
Que vexame.
E isso lá é assunto, dona Franka? Gente, mil perdões por esse post sem noção, mas uma proprietária de um carro caolho não deve ser levada muito a sério...

segunda-feira, 10 de julho de 2006

maus ventos




Foi durante a apresentação de Ricardo III, que fomos assistir esse final de semana. Eu fui com a família toda, e como o teatro estava lotado, tivemos que nos compor nas cadeiras da nossa fileira conforme as cabecinhas e cabeções na nossa frente, ou seja, os mais altos atrás dos cabeções e os mais baixos atrás dos cabecinhas. Incrível como tem gente que tem cabeça esquisita e a gente nem repara no dia a dia. Bom, acabei me sentando no extremo oposto do Zé, com dois dos nossos filhos entre nós. Ele ficou – tadinho - com o pior lugar, atrás de um japonês com um enorme cabeção quadrado cheio de cabelos de espeto, pois ninguém queria ficar ali.
A peça começou e notei que o Zé ria. Bom, Shakespeare é drama e drama é drama, não comédia. Portanto, não há motivos para rir em dramas.
E porque será que o Zé ria tanto?
Eu reparei de longe que ele, volta e meia, saracoteava na cadeira, falava alguma coisa para a minha filha e tinha acessos absurdos de riso que tremiam a fileira toda. A coisa continuava, e ele parecia que não conseguia se conter. Tentei olhar com um olhar repreendedor, mas ele não me via. Parecia que estava tomada por uma força maior, talvez uma pulga na cueca, um ataque epiléptico de riso, talvez possuído por uma alma penada, sei lá. Resolvi assistir a peça, pois eu ganhava mais com isso, os vizinhos de cadeira dele que dessem uma bronca. Eu já dou muita nos meus filhos.
Uma hora ele exagerou, eu olhei e ele me viu. Fiz um gesto de interrogação. O que acontecia? Ele fez uma mímica esquisita, se abanando, apontando coisas do lado dele e fazendo uma estranha dança que resultou num outro ataque. Resolvi desencanar. Dali a pouco reclamariam de mim.
Na hora que a peça acabou, vi que ele e a minha filha saíram correndo da sala, mesmo antes dos atores saírem do palco. O hall ficou lotado, e nos perdemos deles na escadaria que sobre ao térreo. Porém, quando juntamos a família toda na porta do teatro, olhei confusa para o Zé.
- Pode me explicar?
- Nossa, que pesadelo.
- Zé, você teve acessos de riso durante a peça toda?
- Era nervoso. Já riu de nervoso e sem-graceza?
- Não estou entendendo nada.
- Lu, você não imagina o que eu passei.
- Eu vi que você teve espasmos durante toda a apresentação. Alergia shakesperiana? Era algum problema com o japonês do cabeção quadrado?
Ele me olhou, compenetradíssimo.
- Lu, do meu lado tinha um homem com um problema seriíssimo de flatulência.
- Flatulência?
- É!
- Gases?
- É! Um tipo de flatulência aque acho que era fatal! Ventosidade mórbida! Gases tóxicos! - ele dizia, rindo sem parar.
- Pára, ai que nojo! Quem? Aquele gordo de cinza?
- Argh, ele mesmo. E pensa que é fácil? Aquilo foi um pesadelo! O Shakespeare no palco e o homem a soltar aqueles gases sem parar, você não sabe o que eu passei, caramba!
A Nana interveio.
- Mãe. Até eu senti. O papai falou a verdade, coitado. Os gases vinham e voltavam, o homem da camisa cinza estava completamente podre. E o pior foi na saída. Apesar de nós termos saído correndo na hora que as portas se abriram, não sei como mas o cara saiu antes. Quando vimos ele estava bem na nossa frente na escada. E ali...
O Zé interrompeu.
- Ali, Lù, quando ele estava dois degrauzinhos na minha frente, em pé, e em posição estratégicamente favoravel para me derrotar de verdade, ele liberou geral e nos aniquilou de vez. Bem na minha cara. Eu te pergunto: havia necessidade de eu ter que passar por isso? Um cabeção quadrado imenso e um aniquilamento por gases letais?
- Nossa.
Ele suspirou.
- Que Shakespeare, que Ricardo, que nada, Lu. Isso que foi tragédia...

sábado, 8 de julho de 2006

“luxo é andar a pé”





Está numa propaganda de um lançamento imobiliário na folha de São Paulo de hoje: “luxo é andar a pé”. Dei um pulo da cadeira. Hã?
- Zé!
- Oi.
- Olha essa propaganda aqui – eu disse, mostrando o jornal para ele no café da manhã – Aqui diz que andar a pé é muito chique.
- Como assim?
- Eu juro, olhaqui. É um lançamento imobiliário. Um prédio que fica numa rua onde parece que é possível “andar a pé” e que isso torna o prédio muito fino. Um "luxo". Zé, é como se não fosse possível andar a pé nas ruas dos outros prédios. Não acha um absurdo eles falarem isso? É uma mentira deslavada. É como se a nossa cidade fosse absolutamente inviável para andar a pé, mas que nessa rua, nessa específica rua onde fica esse tal prédio, é possível andar a pé e que essa possibilidade dá valor ao imóvel. Já viu isso? Existir valor agregado a um imóvel porque é possível... andar da frente dele? Palhaçada.
- Não implica e pensa por outro lado, Lú. De um certo modo, eles estão vendendo o prédio e o espaço urbano, e isso é legal. Você sabe o que acho sobre a cidade, os muros, a relação do morador com o bairro.
Bom, taí em cima. Escaneei essa parte da propaganda pois fiquei chocadérrima. É a propaganda de um prédio de apartamentos em Pinheiros, um bairro conhecido e super normal daqui de São Paulo, onde hoje mesmo eu andei a pé. O prédio é completão, daqueles que tem piscina, sala de ginástica, lounge, cozinha gourmet e até um negócio chamado “espaço mulher”, que não tenho idéia do que seja.
Mas o que me impressionou é o que está por trás da propaganda. Todo mundo sabe como as propagandas são influentes e dominantes na nossa vida atual. Primeiro que alguém vir e dizer que naquele lugar, “uma rua arborizada e sem saída”, “é um luxo andar a pé”, nos dá a impressão que em outros lugares é uma porcaria andar a pé. Ou seja, a propaganda do prédio divide na maior a cidade em duas partes: os lugares onde é chique andar a pé e os lugares onde andar a pé é uma droga horrível.
Fiquei impressionada também com o “andar a pé”. Andar a pé virou... um luxo? Sim. Por incrível que pareça aqui em São Paulo uma coisa que é natural do ser humano fazer virou uma coisa quase que supérflua. Porque – vamos falar a verdade – a gente não anda mais a pé aqui em São Paulo. Na verdade andamos, mas pegamos o carro e vamos andar dentro dos clubes, do Ibirapuera, dos parques. Andar a pé pela rua é coisa que quase ninguém mais faz, não é mais hábito. Cada vez menos percorremos distancias mínimas de carro, por medo, preguiça, sei lá.
Andar a pé, um luxo.
Caramba. Que mundo mais sem pé nem cabeça esse nosso.

sexta-feira, 7 de julho de 2006

as targinhas




Recebi do a. essa propaganda de venda de tarjas prontas. Problema resolvido, gente, basta adquirirmos esses sensacionais óculos-tarja nesse site chamado "estupididiotic" e estaremos completamente protegidos e clandestinos em qualquer local público. Bom, pensando bem, a propaganda tem um ""q" meio pornô, falaverdade...
Hahaha.

E gente, tem crônica nova na paradoXo, falando nesse assunto: a webcam.
Podem conferir.

quinta-feira, 6 de julho de 2006

o taxista "italiano"


Foi ontem, quando entrei num táxi.
- Moço, sabe do jogo?
- Acabou de acabar – ele explicou – Eu estava assistindo ali na televisão do ponto. Um a zero para a França. Pênalti.
- Ahhh.
- Ô tristeza. O Filipão ficou indignado, mas... – ele deu de ombros – Bom, agora resta torcer para a Itália.
- O senhor vai torcer para a Itália?
- Vou. Sou também um pouco italiano, sabe? Como sou mais português, estava torcendo muito para Portugal, porém agora não adianta mais. Mas ontem foi um tio em casa e ele me confirmou que tem uma parte da nossa família que é italiana. Então resolvi torcer pela Itália.
- Pena o Brasil sair, né?
- Pena, mas paciência. Agora viva a Itália - ele olhou pelo retrovisor - E a família da senhora, de onde é?
Tive vontade de rir com a facilidade daquele homem de se transformar em italiano de terça para quarta feira apenas para poder torcer por alguém na copa. No fundo, como adoramos futebol e copa do mundo, damos sempre um jeito para estarmos incluídos dentro dela. Nós, brasileiros, somos super otimistas e temos uma enorme necessidade de torcer por alguém, por isso sempre arrumamos sempre um vínculo, um elo, uma conecção, mesmo que esdrúxulos. Assim como esse taxista, durante essa semana toda todos nós fomos e seremos portugueses e italianos e franceses e alemães, não importa, apenas para poder parar no meio da tarde e ver o jogo, apenas para poder torcer.
- A minha família é igual a do senhor, de portugueses e italianos.
- Então, senhora, viva a Itália!

quarta-feira, 5 de julho de 2006

o rodízio de cinema




Passei o domingo chuvoso trancada em casa vendo TV. No sábado eu e minha filha tiramos quatro filmes na Blockbuster para ver depois do jogo do Brasil, mas depois da derrota, desistimos e acabamos saindo para jantar.
No domingo eu e o Chico, meu filho mais velho, tomamos café, nos vestimos e resolvemos começar uma sessão de cinema. Pensamos em assistir à um filme um só, mas a coisa foi tomando uma dimensão incontrolável, provavelmente por causa do friozinho, do monte de canais (a NET me deu, por uns meses, um monte de canais a mais para eu experimentar) e do monte de controles remotos diante de nós. Bom, resumindo, ficamos naquele sofá o dia todo e engatamos um filme atrás do outro, dvds e filmes de televisão, quase sem nenhuma interrupção. E no final a nossa estranha lista foi a seguinte:
1) Meu tio matou um cara
2) Tiros em Columbine
3) Vida de inseto
4) O dia da marmota
5) Didi, o cupido trapalhão
6) Ônibus 174
7) Hercules (o desenho da Disney)
8) Constantine
9) O silêncio dos inocentes
10) Quase dois irmãos
Não sei o que nos deu de fazer essa estapafúrdia maratona de cinema. Óbvio que ao ver dez você não vê nenhum. Também não podemos dizer que alternamos um filme “fácil” no meio de dois “difíceis”, pois os filmes 3,4 e 5 são facílimos e vieram em seguida, assim como o 8, 9 e o 10, são meio pesados e ficaram juntos. Também não distinguimos documentários de filmes de ficção ou comédias, tudo veio como o acaso mandou, na maior bagunça, como o roteiro do filme do Didi.
Aliás, que filme mais doido esse do Didi, estou chocada: além de ter o maior número de celebridades por minuto, tem tudo, absolutamente tudo que “vende” no mundo do consumo, sem nenhuma preocupação com a qualidade: mulheres gostosas nuas, homens malhados sem camisa, crianças meiguinhas, gente famosa, piadas de duplo sentido, gags batidérrimas e sem graça, cantores sertanejos, a Kelly Key, pets fofos, anjos e diabos, cenas românticas no meio do mato, Shakespeare, um Romeu-cantor-Daniel , e, capitaneando tudo isso, o grande e sensacional Renato Aragão. Pra mim o cara é um gênio. Falaverdade.
Mas voltando ao zapeado domingo, foi a aleatoridade da escolha, surgida ao acaso com o controle remoto na mão – e claro que incentivada por um adolescente - que nos permitiu ir além e continuar assistindo a mais um e outro, de um modo, digamos, completamente sem controle. "E agora? E agora? E agora?", dizíamos um ao outro, rindo.
Pois é. Isso é algo que o controle remoto e os diversos canais da NET nos permitem nesse nosso mundo: se nos rodízios de comida, de pizza ou sushi, nos empanturramos mesmo sem fome, apenas pela idéia do descontrole gratuito, percebo que diante da TV podemos fazer a mesma coisa. E é algo bobo, pois é a mesma coisa da comida - você acaba priorizando a quantidade ao invés de priorizar qualquer tipo de qualidade. Na verdade, vamos ser claros: é uma coisa absolutamente ridícula um ser humano ficar quase vinte horas na frente de uma tv. E vamos ser mais claros ainda: eu sou um ser humano absolutamente ridículo que fiquei vinte horas na frente da TV, e ainda por cima com um filho ao lado, dando exemplo.
Convenhamos, dona Franka.
Claro que eu posso tentar ser mais inteligente e falar de todos os filmes que assisti, afinal muitos eram muito bacanas e recomendo, mas obviamente depois de empanturrada de cinema, tramas, personagens, nada se sobressai e minha cabeça ainda está meio confusa.
E a única coisa que me vem à cabeça é um frase do Didi:
- Pelas barbas do Luis Inácio!

terça-feira, 4 de julho de 2006

menos + menos = mais


Escultura Etros, Yone di Alerigi


Já que eu entrei esses dias nesse tema “meu bairro, minha vida”, lembrei de uma coisa. As coisas do meu bairro são engraçadas porque como as pessoas aqui não são lá muito amigas dos vizinhos (coisa que eu acho esquisita pra burro), a gente é obrigado a comentar as coisas do bairro só dentro de casa. Quando eu morava em prédio – e eu morei em prédio a minha vida toda – bastava entrar no elevador que começava a conversaiada. Podem falar o que for das fofocas, que eu defendo e adoro.
Aqui não. Além dos muros, meus vizinhos não são de muita conversa, fazer o quê. Mas tudo para falar de uma coisa que até hoje só comentamos aqui dentro de casa, mas que sempre nos pareceu absurda.
É o seguinte. Atrás da minha casa tem uma avenida, aquela que eu comentei num post anterior onde estão construindo os predinhos-neoclásssicos-ovo. Essa avenida é largona, e no meio dela tem um tipo de ilha–jardim muito legal.
Um dia, anos atrás, notamos uma estranha modificação na ilha. Parecia que alguém ia fazer uma obra ali, mas como além dos vizinhos não falarem entre si, as pessoas da prefeitura também não falam para os moradores dos bairros o que vai acontecer, ficamos esperando para ver e, se fosse o caso, brigar. A coisa continuou, escavação, tapume, trator, guincho. Estranho para burro. Até que um dia entendemos. Ali, na pracinha bem atrás da minha casa, seria colocada uma escultura enorme. A escultura estava totalmente coberta, feito um fantasma, e ao lado dela havia uma faixa que dizia mais ou menos o seguinte: “em breve inauguração da escultura “Etros”, da artista plástica Yone di Aleregi” .
- Escultura “Etros”? – falei, rindo – Teremos uma escultura aqui na avenida?
- Como será? – perguntou o João.
- Parece um balão – falou o Chico – Ou será um rostão?
Foi quando me toquei. Pensem, naquele momento só tínhamos as letras para conjecturar, pois a imagem estava coberta. E eu lembrei.
- Gente, reparem. “Etros” é... é contrário de “sorte”. Invertam as letras. Etros, sorte!
Foi nesse momento que eu e os meus três filhos caímos para trás, boquiabertos. Como é que alguém, em sã consciência, faz uma escultura e coloca o nome... "contrário" de sorte? Que será que passou na cabeça da escultora Yone?
- Mãe... - tentou falar a Nani, confusa - ... mas o contrário de sorte é... é...
- Não fala, Nani, que essa palavra dá uruca! – riu o Chico – Ô coisa mais maluca! Tosca!
- Vamos fazer uma outra escultura, colocar ao lado e chamar de “Raza”? – brincou o João.
Mas é sério.
A escultura “Etros” foi inaugurada, é imensa e fica em cima de um morrinho. Já tentei entender o quê o desenho da escultura tem a ver com “sorte” ou com o “contrário da sorte”, mas não cheguei a nenhuma conclusão. Convivemos com ela diariamente, e não tem um único dia que alguém da minha família não passe em frente e diga: etros, etros, etros, fazendo gracinha com o nome da esculturona.
Já a Nani, que é a única que tem janela do quarto voltada para trás, não gosta até hoje da idéia de ver toda dia “o contrário da sorte”, mas fazer o quê. E, para espantar o mau olhado que supomos que existe num treco que é o “contrário da sorte”, inventamos uma teoria. O meu filho Chico, num raciocício matemático simples e confortador, resolveu e nos explicou que, como a escultura "Etros" está “atrás” e “ao contrário” da nossa casa, temos dois “menos” – o “contrário da casa” e o “contrário da sorte".
- E como “menos” e “menos” dá “mais”, teremos muita "sorte", ô mãe - ele concluiu.
Hahaha.
Pena que com tanto muro por aqui a gente nunca pode conversar sobre isso com os vizinhos.
Pena mesmo.

sábado, 1 de julho de 2006

perdemos, paciência


Ai. Perdemos feio.
Eu não sei se tem a ver, mas uma das fitinhas de ovo de páscoa caiu sem eu ver na quarta feira passada.
Desculpa, gente. Talvez tenha sido culpa minha essa derrota do Brasil.

o carrão




O Sr. M., meu vizinho de frente desde que me mudei para cá, há oito anos, vendeu a sua casa há um mês. E há dez dias que venho percebendo uma estranha movimentação na ex-casa do sr. M..
É um tipo de entra e sai que conheço de cor e salteado.
Re-for-ma.
Primeiro veio o pessoal da demolição, falando muito, com carros cheios de música. Tiraram o que poderia ser reaproveitado e carregaram tudo num caminhão: bancadas, maçanetas, metais, portas e batentes. Depois entrou a turma do quebra-quebra, que entrou demolindo paredes e retirando revestimentos. Ontem acordei com o maior barulho de máquina, sai lá fora e vi um bobcat (é um mini tratorzinho) ajudando a tirar a montanha de entulho que juntou no jardim. E provavelmente, como a ex-casa do sr.M é exatamente na frente da minha, vou acompanhar etapa por etapa essa reforma desses meus novos vizinhos.
Mas é exatamente aí que eu queria chegar. Os novos vizinhos. Porque embora eu esteja vendo e acompanhando tudo que acontece, eu ainda não consegui ver e nem saber quem vai morar ali.
- Zé, viu que estão reformando a ex-casa do sr. M?
- Vi. Quem comprou a casa, você já viu?
- Não, ainda não vi ninguém com cara de dono ou dona.
- Nem eu. Mas...
Eu sabia o que ele ia falar, pois eu também tinha esse “mas” na ponta da língua.
Ele se assanhou todo.
- Lú – ele se assanhou todo – Você viu... o carrão?
Hahaha.
A questão é que os novos moradores da ex casa do sr. M. vem todo o dia ver a obra, nunca calhou da gente ver a cara deles mas única coisa que sabemos é que eles tem um super mega carrão pretíssimo com vidros mais pretíssimos ainda. Um super carro, que, sério, parece o carro do pai do Riquinho Rico.
Olha gente, sei que tem uma coisa muito caricata nesse segredo completamente familiar que eu conto aqui, de eu e o Zé ficarmos fuxicando da vida de um vizinho que pode até ser um conhecido de alguém, mas fazer o quê. É muito divertido! Eu e meu marido, confesso, estamos literalmente espionando, feito duas velhinhas solteironas e aposentadas, a vida do cara com o carro do pai do Riquinho. A cada vez que o carro aparece ele me chama e nós dois ficamos olhando pelas frestinhas para saber de mais alguma novidade. Qualquer detalhinho dá o maior assunto.
Qual não foi minha surpresa quando acordei hoje, fui pegar o jornal lá fora e dei de cara com o carrão. Subi correndo as escadas e consegui tirar essa foto escondida da janela de um banheiro lá de cima da minha casa. Olhai o carrão! Ainda esperei um bom tempo trepada na banheira e pendurada na janela, mas de novo não vi o sr. Riquinho Rico nem a sra. Riquinha Rica.
Droga.
É ridículo, né? Mas estamos curiosos, a vida é uma só e, enquanto eu e o Zé não soubermos mais coisas sobre o novo vizinho, vamos ficar nessa fofocada e fuxicação completamente infantil. Prometo que vez ou outra eu venho aqui contar contar sobre o andamento da obra.
Ou, óbvio, falar do vizinho novo.