Olha, não é implicância minha, mas cada dia está mais complicado da gente tirar férias. Alguns tipos de férias cansam mais que trabalho. Temos que andar de caiaque, caminhar 10 km por dia, ir à aula de tênis, fazer esteira, musculação, sauna, massagem shiatsu, ir ao curso de mergulho, pintar lenços de seda, além das atividades da noite, com os jantares temáticos, as gincanas e karaokê. No fim do dia é aquela exaustão. Isso é férias?
É que hoje em dia descansar é uma coisa muito séria. Existem diversos tipos de lazer, e temos que definir qual o que mais se adequa ao nosso stress. Acabou aquela maravilha de aterrizar numa rede com um livro ou ficar a tarde toda vendo tv. Na-na-ni-na-não. Certos tipos de descanso, pouco saudáveis, já saíram de moda. Por exemplo, ir apenas a praia é o fim da picada. Além de você voltar mais gordinha de tanto comer, vai voltar queimada de sol, duas coisas proibidíssimas.
Acho que é por isso que fica aquela andança nas praias no verão. Por causa da culpa. As pessoas se sentem mal de não fazer nada e ficam zanzando para lugar nenhum, daqui pra lá, de lá pra cá, batendo na pedra, voltando, batendo na outra pedra, voltando. Todo mundo muito sério e ocupado, alguns até com o celular na mão, para disfarçar. Sei lá. As pessoas estão ficando completamente malucas, eu acho.
Depois tem os hotéis. Não entendo o que aconteceu, de repente inventaram que nos hotéis o descanso deve ser monitorado. Isso vale para todos, adultos e crianças, e assim surgiram uns rapazes e moças pagos para te animar, para te divertir, como se fosse impossível uma pessoa se divertir sozinha.
A gente pode recusar, fingir que não vê. Mas é uma sensação esquisita não participar daquele grupo animado, que por exemplo, sai para andar todas as manhãs depois do café. Os monitores vão te buscar na mesa.
— Olá, não vai caminhar conosco? Olha que manhã linda!
Dá vergonha de recusar, afinal, o moço é tão atencioso e todos os hóspedes (já de tênis novinhos e bonés) estão bem ali na frente, te esperando. Que remédio? Quando vou para esses hotéis, acabo fazendo coisas inacreditáveis por causa da minha vergonha de dizer “não”. Já me vi numa piscina cheia de senhoras fazendo hidroginástica ao som de axé music, já fiz aulas de street dance, já pintei telas a óleo com paisagens dos Alpes, já andei horas com gente desconhecida, e até já fui de micro ônibus cantando para conhecer uma cachoeira. Um dia nem jantei, com medo da dança espanhola.
O Zé não tem o mesmo problema que eu. Ele é de uma coragem admirável.
— Não.
Fala bem alto, e ainda por cima olhando no olho do monitor-musculoso-sorridente.
— Não vou.
Ninguém discute. Eles apenas saem de perto, sorrateiramente. Como ele faz aquilo?
Gente, acho que estamos exagerando. Onde isso vai parar? Será que no futuro vamos precisar de monitores nana-nenê, que vão nos ajudar a dormir e descansar? E será que depois alguém ligará uns fios na nossa cabeça, para verificar se a nossa taxa de relaxamento está normal?
É exagero meu, eu sei. Mas as férias estão ai, lá vou eu. Quem sabe em fevereiro dá para descansar um pouco?
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