sexta-feira, 30 de dezembro de 2005

o pinto dos pintos




- Eu aprendi uma brincadeira engraçada – anunciou o João na hora do jantar.
- Ichi. Lá vem –falou o Zé.
- Falaí, Batista – pediu o Chico.
- Aposto que é aquela brincadeira que eu te ensinei – falou a Luciana, suspirando – ele sempre me imita e depois fala que foi ele que inventou, mãe...
Olhei para o João. É. Filho caçula sofre.
- Escuta, João, se for brincadeira que fala palavrão nem começa – eu intervim – vocês sabem que nessa casa é proibido falar palavrão na mesa.
- Pinto é palavrão? – ele perguntou depois de uma pausa.
- É – resolvi na hora.
- ô mãe, não radicaliza. Eu acho que depende do contexto – argumentou o Chico.
- Ahá! Eu falei que era a minha brincadeira – interrompeu a Luciana.
- Não vai contar antes, Luciana! – pediu o João, olhando para ela – Ô mãe, deixa, vá. Pinto não é palavrão. É uma parte do corpo humano.
Deixei. Eu sabia que aquela brincadeira era ligeiramente inadequada para uma hora de refeição, mas fazer o quê.
- É assim. Tem que lembrar um nome de filme e trocar uma das palavras por “pinto”.
- Hã? – perguntou o Zé – E daí?
- E daí que fica engraçado, pai – falou a Luciana rindo – A brincadeira é só para isso, para o nome do filme ficar engraçado. Tenta, faz uma você.
O Zé me olhou com cara de desânimo. Fazer o que?
- Não, filha. Tá maluca? Era o que faltava...
- O Senhor dos Pintos – disse o Chico, falando e gargalhando em seguida.
- Apertem os pintos que o piloto sumiu! – falou o João, rindo mais ainda.
- Gente, que idiotice – suspirei, olhando ao redor.
- Pinto Potter!
- O Pinto da Vinci!
- O Poderoso Pintão!
Eles gargalhavam de rir a cada lembrança.
- Scarpinto!
- Guerra nos Pintos!
- Montty Pinto!
- Cidade dos Pintos!
- Os pintos de motocicleta!
Ninguém mais conseguia comer por causa da gritaria. Eu comecei a segurar o riso.
- Pode ser também nome de programa ou novela – falou a Luciana.
- Pintíssima!
- Domingão do Pintão!
- ... ou filmes Disney!
- A Bela e o Pinto! Branca de neve e os sete pintões! O pequeno Pinto! O Pinto novo do Rei ou o A roupa nova do Pinto!
Nessa hora, eu e o Zé já estávamos gargalhando mais do que eles. Como é absurdo conviver com crianças. E bem, a nossa moral foi para a cucuia. Eu estava esperando a hora que o Zé ia lembrar de algum nome de filme quando o Chico ficou em pé e deu um grito altíssimo na mesa, abrindo os braços.
- Piiinto!
Aquilo era demais.
- Chega, gente. Isso não é mais brincadeira, é desrespeito com o jantar - declarei
- Mas mãe, eu estou falando apenas um nome de filme! – ele argumentou me olhando e rindo.
- Qual?
- Titanic!
O Zé me olhou desanimado.
- Será que é por causa da época do ano?
- Deve ser, Zé. Nas férias sempre piora...

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