segunda-feira, 11 de abril de 2005

minha avó fez 100 anos


meus avós em lua de mel no rio

Ontem minha avó fez 100 anos. Para mim isso foi uma coisa tão bonita, mas tão bonita, que eu não consigo escrever a respeito. São muitos anos, é uma vida completa, são muitas gerações, é uma imensa árvore. Tem horas que a literatura está abaixo da vida, como nesse caso.
Dedico a ela (que, uma pena, não enxerga mais) esse texto sobre as mulheres.
Parabéns, vó.
a espera

Mulher espera.
Começa com o nosso corpo. Já viemos de “fábrica” preparadas para esperar. Bebês, eu digo. Aqueles nove meses de gestação são parte da nossa natureza. Não adianta a ciência progredir, descobrir curas para a infertilidade, gerar bebês por inseminação artificial e até clonar pessoas, que os famosos nove meses de espera continuam sendo os famosos... nove meses de espera.
E, apesar de sermos as mesmas de milhões de anos atrás, e desta espera de nove meses ser a mesma, hoje em dia ficamos sem paciência com as esperas e nos descabelamos. Acho, inclusive, que quem inventou os humanos fez muito bem quando liberou as mulheres grávidas da menstruação e da TPM. Imagina o desespero de você ter que esperar alguma coisa naqueles dias.
Esperamos. Quando somos mocinhas, é aquele maldito telefone que não toca nunca. A gente olha se ele está na tomada direito, se tem linha, até liga para a mocinha da empresa telefônica perguntando se nada foi cortado por falta de pagamento. E continua esperando pelo namorado, que às vezes não vem.
Casamos. E esperamos por eles, os maridos, que sempre chegam em casa depois da gente, por mais que você faça esforço para se atrasar. E um tempo depois, esperamos a cada mês, morrendo de vontade de engravidar. E depois dos nove meses e da chegada do filho, esperamos passar o período de amamentação para voltar ao trabalho. E esperamos o filho crescer para poder trabalhar, esperamos para emagrecer, esperamos até para poder colocar de novo um salto alto.
E esperamos na porta da escola, na saída das festas, na frente do clube. Esperamos os filhos aprenderem, repetindo as mesmas coisas durante anos. Esperamos para poder viajar para a Europa a sós com marido, esperamos para poder sair tranqüilos à noite, esperamos a febre passar, esperamos o remédio fazer efeito, esperamos para ver se eles passam de ano.
Esperamos para ver se o marido da gente volta para casa, depois que ele resolveu se separar, esperamos para ver se aparece algum outro marido melhor que aquele que a gente achou que era nosso príncipe encantado, e não era não.
Quando achamos que acabou a hora de esperar, esperamos os nossos pais melhorarem de saúde, esperamos que nossos avós não morram, esperamos que não seja nada, peloamordeDeus. E, quando não tem mais jeito, esperamos a morte junto deles.
Isso nos torna diferentes, na minha instintiva opinião de mulher comum. Claro que sempre existem exceções, muitos homens cuidam de filhos e pais idosos, mas, na maioria das famílias quem está do lado deles, cuidando, é sempre a filha, a esposa.
Uma mulher.
Acho que nesta coisa de espera as mulheres são imbatíveis. Aprendemos a vida toda, com o esperar da vida e com o esperar da morte.
Nos meus poucos esperares, aprendi uma coisa importante. Que temos que estar em paz na nossa solidão. Quem espera, necessariamente, está só, mesmo que cercado de gente. Mas estar só e estar esperando não é uma coisa triste, como parece. É só uma compreensão: de estar gerando para um futuro.
Então? Então a gente espera mais um pouquinho, ué.

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