Se você mora com jovens, aprenda: pule as coisas que surgem no chão nos finais de semana. Não cate, não recolha. Ignore. Segure-se e mentalize: “tudo isso não está aqui. Não tem nada no meio do caminho, eu não estou vendo esses sapatos, essas mochilas, esses casacos e essa bolsa no chão. Não, o Ipod não está caído do lado da mesa. O prato de comida do dia anterior não está na mesa de centro. A embalagem da bolacha não está no sofá, pode se sentar. Esses instrumentos todos não estão no meio da copa. A televisão não está ligada desde ontem. O computador não está no chão”. Pule. Salte. Atravesse a sala como uma corrida de obstáculos. Senão sua vida vai ser infernal, como a minha estava ficando.
- Quem comeu pizza aqui?
- Eu.
- Quando?
- Ontem à noite.
- E esse prato, esse copo, essa caixa de pizza, esses guardanapos?
- Que é que tem o prato?
- Não vai tirar?
- Porque?
Quando o espalhamento invisível começou a acontecer, eu parecia um robô cata tudo. Acordava e passava a recolher coisas, tudo que coubesse nas minhas mãos e na boca. Fazia diversas viagens. Catava o lote um, avaliava o meu estoque e programava a distribuição, seguindo a melhor logística. Primeiro as coisas de cozinha, depois o lixo, depois as coisas da mesa da entrada. Lote dois, as coisas do andar de cima, porque tem que subir escada.
Com o tempo, comecei a encher o saco de ser a limpa trilho do sábado e do domingo. Ora, se eles não “veem”, porque eu vejo? Será que é porque sou velha? Agora mentalizo e passei a não ver nada também. Passei a pular, como eles. O próximo passo é começar eu a deixar coisas no caminho. Essa meta é mais complicada, mas conseguirei. A única coisa que quero enxergar e não consigo mesmo, é o controle remoto...
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