segunda-feira, 24 de novembro de 2008

no cemitério com a minha mãe - II


- Vamos embora desse cemitério, mãe?
- Vamos, pelo amor de Deus, Lúcia. Nossa. Mas antes olha aquele túmulo lá, Lúcia minha fiiilha... É muito pior que o da mulher morta com o marido pelado puxando... Olha que terrenão. Parece a mansão no Morumbi aqui do cemitério.
- Se fosse uma mansão no Morumbi tinha muro, cerca elétrica e câmera de monitoramento, mãe.
Ela ficou um tempo analisando, pensando.
- Olha filha. Túmulo deveria ter ao menos alarme, olha a quantidade de porta de cobre de túmulo que roubaram daqui. Viu como roubam as portas? Viu? Roubam pra vender, ah, esse Serra, viu? Escreve para ele, filha. Escreve, manda email, você é boa nisso. Ele devia colocar alarme aqui nos túmulos.
- Alarme?
- Sei lá. Acho que alarme não adianta nada, aqui só tem morto... Talvez arame farpado...
- Mãe, o alarme ia chamar a central de monitoramento, a empresa de segurança, onde espero que todos estejam vivos.
- Esse túmulo é bem mais exagerado do que o do homem de bunda grande. Olha que horror. É dum homem que morreu e olha, foi a esposa fez esse túmulo exagerado pra ele! Ai como mulher é boba. Ai não me conformo. O marido morre e ela gasta essa fortuna com o morto, devia era pensar no futuro dela, que burra, meu Deus...
Fui ler a lápide. Era pra um tal de Gianini, Giovanni, sei lá, Guiseppe? "Guiseppe meu...", falava a inscrição. E embaixo tinha assinado o nome de uma mulher.
- Olha, desta vez é ela que chora e se arrasta, mãe.
- É. Hahaha. Ela quis imitar o outro. Quis mostrar que amava mais. Bah. Duvido que o Guiseppe fosse lindo assim como essa estátua, com esse corpão, com esses cabelões. Nossa. E quem são esses outros pelados que arrastam o Guiseppe morto?
- Devem ser os anjos da morte, mãe.
- Que anjo da morte o quê... Ai que mulher burra. Isso deve ter custado uma fortuna, eu me pergunto pra quê, gente, pra quê isso? Quanto tempo depois que ela morreu, filha?
- Deixa eu ver, mãe. Quase vinte anos depois, mãe.
- Vinte anos depois e pobre, tenho certeza. Gastar dinheiro com morto. Que idéia. Devia era guardar o dinheiro pra casar de novo. Guiseppe. Bah.

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