sábado, 15 de julho de 2006

no escuro das gavetas


O Rio é sempre muito legal, super bonito, colorido. Parece que tudo por lá é mais aceso e claro do que o resto do mundo, uma claridade que nós, paulistas, jamais poderemos entender. Eu falo do brilho, da luz. O Rio de Janeiro é uma cidade acesa, já São Paulo não é acesa nem dentro de shopping. Reparem, tem uma coisa em São Paulo que funciona como um tipo de óculos escuros, existe uma neblina em cima de tudo, engraçado, a cidade por mais que esteja feliz e funcionando é sempre embaçada, sem cores, uma cidade atrás de uns óculos escuros, atrás de um protetor insulfilme, escurinha, sóbria. O Rio é como uma lâmpada mais possante, uma lâmpada de 200w, de 500w, São Paulo está sempre com uma luzinha de 60w, fraquinha, mal iluminada. A luz do Rio não vem só de cima, essa é a impressão que tenho, parece que vem de todos os lados, podermos até conjecturar que também vem da água e das pedras das pessoas e do calor, mas é uma coisa além disso, acho que vem da alma da cidade, das pessoas, ou apenas talvez dentro do olho de quem vê.
Era isso o que que tagarelava num intervalo de uma reunião ontem lá no Rio quando uma colega de São Paulo que estava comigo declarou que não ia à praia no Rio nem morta por causa disso.
- Porque? Muito gostoso ir à praia aqui, eu morro de vontade de largar tudo e ir dar um mergulho – declarei.
- Tá maluca? Louca? Imagine se praia do Rio é pra o nosso bico, ô Lúcia. Praia no Rio é para as mulheres que moram no Rio.
A teoria dela era mais ou menos a seguinte. Segundo ela, as mulheres do Rio estão super acostumadas com o excesso de claridade e são muito seguras dos seus corpos. Isso não tem absolutamente nada a ver com estar gorda ou magra, ou branca ou morena, tem apenas a ver com a capacidade de ficar pelada naquela luz absurda.
- Já as pessoas como nós, mulheres que não moram no Rio, não sabemos ser tão nítidas. Não sabemos nos mostrar com tanta clareza numa boa. Estar numa praia no Rio, no meio daquelas mulheres tão naturalmente à vontade com a claridade, para nós, Lúcia, é como estar sem pele, com as vísceras todas a mostra. Um vexame praia no Rio.
Ela tem razão. Embora alguns paulistas consigam ficar de biquíni ou sunga em litorais-nortes ou em ubatubas, a maioria anda pelas praias morrendo de vergonha, repara. Aliás, mulher paulista só “anda” de canga ou shortinho, nunca só de biquini.
Sim, mas e daí? Nós aprendemos a gostar das coisas um pouco mais escuras, ora. E fechadas. Ficamos muito mais a vontade assim, dentro, protegidos nas nossas casas, nos nossos cantinhos, nas nossas gavetinhas à meia luz.
Cada um, cada um.

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