quinta-feira, 13 de abril de 2006

o tijolão

Ontem eu encontrei uma amigos que não via há muito tempo, de um escritório que eu trabalhei quando era moça, a CVS. Foi meu segundo emprego depois que me formei. O lugar não era somente um escritório de arquitetura. Era também agência de publicidade, de criação e design. Na época, aquele lugar era muito moderno para mim. O prédio era todo reformado, todo mundo era muito bacana. Quando consegui o emprego fiquei toda animada.
Bem, lá fui no meu primeiro dia. Sempre no primeiro dia a gente fica envergonhada. Eu não conhecia ninguém e não sabia direito como as coisas iam acontecer naquele antro de modernidade. E mesmo eu, que sou um tanto tagarela, estava bastante tímida naquele primeiro dia.
Olha.
Não sei se foi combinado antes ou se eles olharam a minha cara de trouxa e resolveram fazer aquilo comigo na hora que eu cheguei. Só sei que eles “tiraram muitas” da minha cara naquele dia e eu cai feito um patinho em todas, gente. Hoje eu acho engraçado, mas na hora tive que respirar fundo para não chorar de raiva. Não foi um, foram todas as pessoas daquela agência que fizeram gato-sapato comigo. Gente, quanta maldade. Sabe essas sacanagenszinhas de emprego? Foi uma coisa típica de adolescentes, de molecagem pura e absoluta.
A primeira foi com o meu sapato. O lugar era um salão de um galpão enorme, cheio de mesas e a minha ficava bem no meio. Eu estava de tamancos, daqueles de sola de madeirinha, e logo depois do almoço devo ter tirado um minuto o calçado embaixo na mesa por causa do calor. No minuto seguinte, tentei colocar e... neca. Cacilda. Alguém (juro que não sei 'como' nem 'que horas') tirou um dos tamancos dali e... zupt. Desapareceu com ele. Procurei ao redor e nada. Vasculhei em baixo da mesa, olhei embaixo das mesas alheias, até que suspirei fundo e arrisquei perguntar discretamente aos vizinhos.
Eles me desprezavam.
- Hã? Como é?
- Você... por acaso você pegou meu... tamanco?
- Pegou o que? Um... tamanco?
Eu olhava ao redor e nada. Todo mundo trabalhando com cara de porta.
Vergonha. Muito tempo depois, desisti. Ninguém deu a mínima, aliás. Sentei e voltei a trabalhar descalça e p. da vida. Logo depois descobri que me ensinaram todos os nomes das pessoas errados. E a mesma coisa quanto as funções.
- Não sou eu, é ele o João.
- Como assim? Ele não é o desenhista?
Além disso, eles se fingiam de surdos quando eu perguntava alguma coisa. Eu fiquei com medo até de ir ao banheiro, pois fui uma vez e fiquei sem escala, a lapiseira e a borracha. Aquele lugar, que eu achei que era tão legal, era insuportável e eu comecei a ficar cansada de tanta azucrinação. No final da tarde eu já estava irritadíssima (e ainda descalça) quando um dos arquitetos percebeu minha cara de quase-choro-desesperado e apontou um armário lá no fundo, onde, ufa, estava meu tamanco.
Coloquei os sapatos, peguei minha bolsa e sai dali batendo os pés. Tenho certeza que o escritório inteirinho caiu na gargalhada na hora que eu passei pela porta. Na afobação, nem percebi. Mas quando alcancei o ponto de ônibus, achei que minha bolsa estava muito, mas muito pesada.
Abri.
Dentro dela, um tijolão enorme e umas dez de amostras de azulejos, que eu carreguei suando até em casa e devolvi no dia seguinte.
E quanto tempo eu fiquei com eles?
Ah, um tempão, mais de cinco anos. São muito legais, até hoje morremos de rir da história do tijolão.

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