Ligou um dos meus marceneiros. Discutíamos um corrimão, um guarda corpo que ele estava orçando para uma casa. No meio da conversa, sei lá porquê, ele me fala o seguinte:
- Olha lúcia, vou te falar uma coisa. Quando eu vou num terraço de um prédio alto, numa sacada qualquer, eu... eu...
Eu me adiantei.
- Você tem vertigem? Pois eu tenho, sei como é. Basta chegar perto do corrimão que minha barriga gela e minhas pernas bambeiam.
- Não é isso. É uma coisa muito pior, pois é um pensamento – ele disse, gaguejando - Eu olho a bordinha, sabe, a bordinha do terraço? O limite entre o piso e o nada? Eu olho para aquele lugar e penso: daqui para cá é a vida. E daqui para lá é a... morte. A morte, lúcia.
Eu me assustei. Nem conheço o homem direito, só conversamos sobre orçamentos, detalhes e entregas. Aquele rumo de conversa estava me parecendo completamente inadequado. E perigoso. Sei lá, essa coisa de vida, morte, muito pensamento.
- Nossa, credo. Mas porque você pensa nisso? – eu desconversei, rindo.
- Ah. Não sei, lúcia, mas acho importante lembrar isso sempre. Que a gente tá sempre perto, muito perto dum enorme buracão. E que a gente fica vivo só porque quer, só por isso.
Fala se as pessoas não são todas meio malucas.
- Bem. Pois então construa belos corrimãos para poder apreciar a vista – desconversei.
Minha observação foi meio boba, mas achei interessante a filosofia marceneira.
Porém, pensando bem, acho que tenho que arrumar outro marceneiro. Os guarda corpos desse homem, que vive assim entre a vida e a morte, provavelmente vão custar uma fortuna...
Nenhum comentário:
Postar um comentário