sábado, 10 de dezembro de 2005

voar e rezar


Viajei muito esses dias. Na mesma semana fui para o Rio, Ilhéus e Itacaré. Aviões, carros, táxis, ônibus, muita espera, muita sacola carregada, cartões de embarque, “a senhora quer recibo?”, “janela ou corredor?”, embarque portão treze, a varig agradece.
Olha. Acho viajar a maior perda de tempo. Claro que é absolutamente necessário, impossível fazer e fiscalizar obras sem ir até elas, mas é uma maluquice o que se gasta de tempo para chegar ao destino. Das dez horas úteis de um dia, num dia de viagem trabalha-se três, quatro horas.
Mas não era sobre isso que eu ia falar. Eu queria falar sobre aviões e decolagens.
Notei antes de ontem. Eu já tinha essa sensação há algum tempo, mas nunca pensei a respeito. É uma sensação que acontece na hora da decolagem.
- É enjôo? – perguntou meu amigo engenheiro quando comentei com ele – tem gente que enjoa em decolagens e pousos.
- Não – retruquei – É uma sensação, digamos, mística.
Ele não entendeu nada.
Vou explicar. Numa das viagens dessa semana, por exemplo, estávamos num grupo grande. Sentamos todos perto e conversávamos animados. Eu contava uma das minhas histórias, empolgadíssima. Eu não conto histórias só aqui no blog, conto na vida real também, e como me envolvo de corpo e alma, não notei que o avião estava decolando.
Olha. Não dá para falar nessa hora, gente. Sei lá porque, nunca comentei com ninguém, mas meu inconsciente me diz que avião decolar é coisa muito, mas muito séria. Interrompi subitamente.
- Espera, gente. Estamos decolando.
Eu parei de falar, fiz o sinal da cruz e fiquei feito estátua de pedra na cadeira. Notei que os outros não levavam tão a sério a decolagem e ainda conversavam. Conversavam!
Descobri que sou uma pessoa incapaz de relevar uma decolagem. Devo ser a maior caipira, mas uma decolagem para mim é uma coisa sagrada. Eu sei que estou num vôo de carreira, num avião comum, que aquele vôo não é espiritual, mas minha mente se recusa a deixar para lá. Deve ser uma coisa ancestral, mas não consigo falar, rir, distrair ou conversar na hora que eu começo a ... levantar vôo. Na hora da decolagem minha mente me manda rezar e rezar e rezar. sem parar.
Voar é uma coisa sagrada, gente. Quer saber? Me emociono mais na hora de voar dentro de uma avião da TAM do que em igrejas.
Pronto, falei, perdões.
Acho que essas coisas de superstições têm a ver com os medos da gente. Eu devo ter medo de voar em todos os sentidos. Medo de voar nos textos, nos relacionamentos, nos trabalhos, na vida, no avião. Mas como é impossível não voar, em todos os sentidos, eu me entrego, vôo e... rezo.
Tenho certeza da mágica mística de um vôo, seja qual for. Acho e acredito – podem rir de mim – que um vôo sempre tem que ser rezado, abençoado e venerado. Voar não é para nós, humanos. É para os seres que ganharam asas de Deus. Sei lá quem, exatamente, é Deus. Mas rezem, assim como eu. Encolham-se, fechem-se e concentrem-se.
Voar é coisa de anjos.

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