quinta-feira, 25 de agosto de 2005

a turma da van




- Oi filha.
- Oi mãe. Tudo bom?
- Tudo. Estou telefonando para te contar uma coisa. Sabe aonde eu vou amanhã?
- Não.
- Na Daslu.
- Daslu? Você? Tá louca?
- Vou com minhas amigas.
- E você lá tem amiga que vai na Daslu, mãe?
- São as senhoras da van. Aquela turma que vai comigo ao teatro toda semana.
- Ah, sei. Mas o que a turma do teatro vai fazer na Daslu?
- Conhecer, ué. Pedimos para a Vera, a organizadora, e ela vai nos levar. Vamos todas de van, conheceremos a loja e tomaremos um café lá na lanchonete.
- Conhecer a Daslu vai ser um programa? É isso?
- Que é que tem?
- Nada. Que turma engraçada, hein mãe? Mês passado aquele passeio, agora Daslu...
- Que passeio?
- Vocês não foram num bar gay?
- Fomos, ué. Uma das senhoras tocou piano com os rapazes, um bar tão fino, elegante... adoramos.
- Aproveita e compra alguma coisa lá, mãe.
- Só se tiver uma lembrancinha da loja. Baratinha, claro. Será que tem souvenir da Daslu?
Minha mãe sai toda semana com essas senhoras. Uma moça, a Vera, organiza os passeios e pega uma por uma nas suas casas. O tempo da “viagem” de ida e volta é o dobro do tempo do teatro, mas elas adoram. “É um modo da gente sair de casa”, explica minha mãe.
Mas ir ao teatro começou a ser pouco. As senhoras e o seu Loreto (sim, há um único homem que sai com elas) vão a qualquer lugar. Não precisa ser teatro, explicou minha mãe, “aliás, minha filha, tem lugares muito mais divertidos do que teatro”.
No começo achei que elas apenas faziam turismo na própria cidade, são mulheres sozinhas, viúvas, separadas ou até casadas, avós e bisavós. Antes só saiam de dia, a noite era considerada perigosa. Mas com essa chance puderam conhecer outro mundo, antes proibido. Um tipo de turismo na noite.
Mas não é isso. Na verdade, o que elas procuram são apenas boas histórias, de dia ou de noite. Estão todas com suas vidas prontas, definidas, com suas missões cumpridas. Agora querem assistir de camarote tudo que acontece como se vissem um bom filme, uma trama fantástica, um boa narrativa, para interpretar e falar a respeito. Já foram em programas de TV, em bailes, em restaurantes exóticos, no centrão da cidade, em bares gays. E cada dia inventam outros programas: não me espantaria se elas fossem à bolsa de valores, em velórios de famosos, em shows de heavy metal, em bailes funk. As boas histórias não estão apenas no teatro. Aliás, tem muita peça que é muito mais chata que a realidade.
E tenho certeza que, se a CPI fosse em São Paulo, elas estariam todas lá, sentadinhas no fundo, se divertindo. Ô história boa.

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