Assunto delicado e bem íntimo, talvez não devesse nem ser abordado numa crônica. Quando eu vejo aquelas moças na televisão fazendo anúncio de absorvente e falando como se estivessem falando de um sapato, acho engraçado, mas não é todo mundo que é como elas.
Bom, estava numa viagem de trabalho eu, um arquiteto, um carpinteiro, um empreiteiro e uma moça que trabalha numa loja de iluminação. Os cinco num carro pequeno, ninguém se conhecia muito bem para estar tão próximo. É um pouco constrangedor ficar horas colado em alguém que não é íntimo seu.
Como o arquiteto era quem dirigia e o carpinteiro era enorme de gordo; eu, o empreiteiro e a moça da iluminação sobramos no banco de trás. O empreiteiro foi gentil com nós duas e disse que ficaria no assento do meio, que sabemos que é o pior lugar.
Tudo correu bem até chegarmos na serra. Eu conversava e a moça da iluminação fazia anotações num caderno com uma lapiseira quando tocou o celular do empreiteiro, que estava no bolso da calça dele. Ele se espremeu todo para alcançar o aparelho sem esbarrar em nós duas, mas não deu certo. Acabou enfiando o dedo na lapiseira da moça e deu um gritinho abafado.
- Ui, meu dedo!
O telefone parou de tocar. Pouco sinal.
- Eu te machuquei? – perguntou a moça da iluminação, com uma cara preocupada - Furou?
- Não foi nada, deixa – disfarçou o homem, sem graça, apertando o dedo com a outra mão.
Na verdade, doía sim. Muito. A lapiseira cortou fundo o dedo dele, mas ele ficou envergonhado e não quis falar para ninguém. Sorria sem graça, mas tinha a cara toda retorcida.
Foi quando olhei para a mão dele. Sangue. Um monte de sangue, escorrendo entre os dedos espremidos. Aquela gosma ia escorrendo devagar, chegando lentamente ao pulso e deixando um rastro vermelhão. Ele insistia, sem perceber o tamanho do estrago:
- Não foi nada, não preocupem.
Eu não agüentei.
- Como “nada”? Olha a sangueira, tá sujando tudo! – olhei ao redor – Gente, alguém acha um papel, um pano, qualquer coisa!
Ele estava confuso, melecado. Acho que a moça da iluminação estava com o maior nojo, pois recolhia todos seus pertences correndo, tratando logo de esconder a lapiseira perigosa e seus cadernos, ao invés de ajudar. O sangue escorrendo, quase no cotovelo, o carro rodando de lá para cá, tudo balançando e nada de papel. Não tive dúvida. Catei a minha bolsa rápido.
Bolsa de mulher sempre tem... modess. Peguei um e zupt. Embrulhei o dedo do rapaz. Com outro, limpei a mão e o braço dele. Em dois minutos, tudo foi ajeitado e completamente ab- sor- vi- do. Perfeito, pensei, feliz com minha solução.
A moça da iluminação me olhou com os olhos arregalados. Engoliu em seco e falou baixinho.
- Lúcia, o que é isso?
- É um modess – respondi, conchichando.
- Um absorvente?
- É.
- Mas lúcia... – ela retrucou – você...
Ela ficou pasma. Virou para o lado da janela e balançou a cabeça.
Eu entendo. Para ela aquilo foi indecente. Um absorvente meu, que eu guardo na minha bolsa, é uma coisa muito íntima minha. Na cabeça dela, os absorventes de uma mulher nunca podem ser usados por pessoas estranhas, e ainda mais se essa pessoa estranha for um homem. Pior ainda se considerarmos que aquele que eu escolhi e dei para o empreiteiro era um absorvente bem grosso, para os dias de “fluxo intenso”. Não importava, ela me dizia com seu silêncio indignado, absorventes nunca saem da bolsa de uma mulher para serem colocados em homens. São “íntimos”, “seus” e “femininos”. Eu não sabia disso?
A moça da iluminação não falou mais nenhuma palavra, mas eu soube, pelo seu olhar, o quanto me condenou por aquela indecência.
Bom, estava numa viagem de trabalho eu, um arquiteto, um carpinteiro, um empreiteiro e uma moça que trabalha numa loja de iluminação. Os cinco num carro pequeno, ninguém se conhecia muito bem para estar tão próximo. É um pouco constrangedor ficar horas colado em alguém que não é íntimo seu.
Como o arquiteto era quem dirigia e o carpinteiro era enorme de gordo; eu, o empreiteiro e a moça da iluminação sobramos no banco de trás. O empreiteiro foi gentil com nós duas e disse que ficaria no assento do meio, que sabemos que é o pior lugar.
Tudo correu bem até chegarmos na serra. Eu conversava e a moça da iluminação fazia anotações num caderno com uma lapiseira quando tocou o celular do empreiteiro, que estava no bolso da calça dele. Ele se espremeu todo para alcançar o aparelho sem esbarrar em nós duas, mas não deu certo. Acabou enfiando o dedo na lapiseira da moça e deu um gritinho abafado.
- Ui, meu dedo!
O telefone parou de tocar. Pouco sinal.
- Eu te machuquei? – perguntou a moça da iluminação, com uma cara preocupada - Furou?
- Não foi nada, deixa – disfarçou o homem, sem graça, apertando o dedo com a outra mão.
Na verdade, doía sim. Muito. A lapiseira cortou fundo o dedo dele, mas ele ficou envergonhado e não quis falar para ninguém. Sorria sem graça, mas tinha a cara toda retorcida.
Foi quando olhei para a mão dele. Sangue. Um monte de sangue, escorrendo entre os dedos espremidos. Aquela gosma ia escorrendo devagar, chegando lentamente ao pulso e deixando um rastro vermelhão. Ele insistia, sem perceber o tamanho do estrago:
- Não foi nada, não preocupem.
Eu não agüentei.
- Como “nada”? Olha a sangueira, tá sujando tudo! – olhei ao redor – Gente, alguém acha um papel, um pano, qualquer coisa!
Ele estava confuso, melecado. Acho que a moça da iluminação estava com o maior nojo, pois recolhia todos seus pertences correndo, tratando logo de esconder a lapiseira perigosa e seus cadernos, ao invés de ajudar. O sangue escorrendo, quase no cotovelo, o carro rodando de lá para cá, tudo balançando e nada de papel. Não tive dúvida. Catei a minha bolsa rápido.
Bolsa de mulher sempre tem... modess. Peguei um e zupt. Embrulhei o dedo do rapaz. Com outro, limpei a mão e o braço dele. Em dois minutos, tudo foi ajeitado e completamente ab- sor- vi- do. Perfeito, pensei, feliz com minha solução.
A moça da iluminação me olhou com os olhos arregalados. Engoliu em seco e falou baixinho.
- Lúcia, o que é isso?
- É um modess – respondi, conchichando.
- Um absorvente?
- É.
- Mas lúcia... – ela retrucou – você...
Ela ficou pasma. Virou para o lado da janela e balançou a cabeça.
Eu entendo. Para ela aquilo foi indecente. Um absorvente meu, que eu guardo na minha bolsa, é uma coisa muito íntima minha. Na cabeça dela, os absorventes de uma mulher nunca podem ser usados por pessoas estranhas, e ainda mais se essa pessoa estranha for um homem. Pior ainda se considerarmos que aquele que eu escolhi e dei para o empreiteiro era um absorvente bem grosso, para os dias de “fluxo intenso”. Não importava, ela me dizia com seu silêncio indignado, absorventes nunca saem da bolsa de uma mulher para serem colocados em homens. São “íntimos”, “seus” e “femininos”. Eu não sabia disso?
A moça da iluminação não falou mais nenhuma palavra, mas eu soube, pelo seu olhar, o quanto me condenou por aquela indecência.
Eu piorei mais: falando bem baixinho para ela não escutar, mostrei ao nosso empreiteiro a tirar aquela fitinha adesiva e grudar o absorvente no dedo para não precisar ficar segurando com a outra mão.
- Obrigado por me ensinar – ele me disse, sorrindo – É que essa é a primeira vez que eu uso um absorvente.
- Obrigado por me ensinar – ele me disse, sorrindo – É que essa é a primeira vez que eu uso um absorvente.
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