quinta-feira, 16 de junho de 2005

o estômago do roberto jefferson



Eu tenho uma mania de me interessar pelos detalhes. Muitas vezes entender o detalhe é um modo de entender o todo. Os detalhes são atalhos de interesse que transformam uns assuntos chatos em super interessantes.
Verdade, juro.
Bom, não sou só eu que tenho essa preferência por detalhes e atalhos de interesse. Todas as revistas idiotas de fofoca do mundo também têm, infelizmente.
Tudo começou quando estávamos assistindo a performance do Roberto Jefferson na CPI. Todo mundo calado e mudo diante daquela maravilha de interpretação. Um show de ironias, gracinhas, provocações, sarcasmos e zombarias. Uma aula de deboche: como vencer só com palavras. Eu que não queria ser casada com esse Roberto Jefferson, Deusmelivre. Deve ser um pesadelo ter uma briga de casal com ele no meio da madrugada. Já pensou?
Bom, o Zé pediu silêncio total na sala. Queria ouvir tudo, cada frase, cada comentário.
Olha. O Zé sempre faz comentários políticos imensos, cheios de explicações, um enorme blá, blá, blá, que eu nunca consigo prestar atenção. Isso vem de lááá do Movimento Estudantil. Mas dessa vez ele me surpreendeu.
- Puxa – ele balançou a cabeça - o Roberto Jefferson é a prova viva que operação de estômago funciona mesmo.
Todo mundo olhou para ele. Como era?
- Olha que elegância. Ele era uma pipa.
- Zé, você está falando do estômago do Roberto Jefferson?
Pronto. Para mim foi a deixa. Naquele instante, na minha cabeça, acabou a CPI, acabaram-se as denúncias, os mensalões, o Dirceu, tudo. Eu só consegui, dali em diante, pensar no estômago do Roberto Jefferson.
Pra quem não sabe, o Roberto Jefferson fez uma operação de redução de estômago e perdeu 100 quilos.
De todas as formas de emagrecer, essa é a mais estranha. Dá para inventar um monte de exemplos absurdos e parecidos. É o mesmo que costurar as mãos para não pegar num copo e beber. É o mesmo que colar todos os dedos para não fumar. Costurar o nariz para não cheirar pó. E para os viciados em sexo? Também se reduz o tamanho, como no caso do estômago?
Mas voltando ao nosso homem, eu comecei a pensar numa coisa. Acho que as pessoas se alimentam de vários modos. O Roberto Jefferson deve ser um homem muito faminto, que sempre comeu muito. Ele deve ter fome a toda hora, deve mandar ver na comida. Uma fome ancestral. Maluca. Fora de controle. Um dia resolveu operar o estômago, e, a partir daí ele não consegue mais comer. Tem a maior fome, mas não pode comer, não cabe. Isso deve ser desesperador. A fome está na cabeça, está na alma da pessoa, não no estômago.
O que fazer com a fome? Com o vazio?
Acho que ele passou a comer de outros modos. Imagine que desespero você ter fome e ser pressionado daquele modo com todas aquelas denúncias. Assim, ele começou a comer. Comer a si mesmo, comer sua vida, comer seus colegas, comer os deputados, a assembléia, tudo. Começou a comer, dissecar, estraçalhar, devorar. Comeu feito um bicho num banquete macabro, arrancando pedaços, estripando, virando a vida do avesso, colocar as vísceras para fora.
Olha, gente, aquilo é apenas fome.
O Roberto Jefferson costurou o estômago. Deveria agora costurar era o tamanho da boca.

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