epa!
- Pai.
- Oi.
- Você participou do Movimento Estudantil, não foi?
Era almoço de sábado, a família toda na mesa.
- Sim, filho. Já te contei mil vezes.
- É que agora vão fazer um museu. Acho que vai se chamar "Memória do Movimento Estudantil". Estão recolhendo material, quem tiver pode doar para eles, eu vi na TV.
- Olha que legal – falou o pai, pensativo – Eu tenho muita coisa. Folhetos, fotos, atas de reunião.
- Uau, do demônio, pai – o menino estava todo animado – E, escuta, parece que eles vão abrir os arquivos do DOPS. Você está nos arquivos do DOPS, pai?
- Eu? – o pai ficou um pouco atrapalhado – Bem, não, não sei, pode até ser...
- Como não, pai? Você não era do Movimento Estudantil? Não era até do Partidão?
O pai não queria desapontar o filho, mas não se lembrava de ter sido preso ou fichado.
- Eu era, filho, mas...
A mãe interveio.
- Querido, impossível você não estar nos arquivos do DOPS. Você tinha até codinome naquela época. Eu me lembro muito bem. Era um nome de peixe... qual era mesmo o seu nome de peixe, meu bem?
- Mas pai, você vivia em passeata, carregando faixas, discursando! - exclamou o menino, decepcionado - Já vi um monte de foto sua, você me contou tanta coisa. Eles nunca te pegaram?
- Não, filho – falou o pai, sem graça.
- Querido, sério. Acho um absurdo eles não terem te fichado - declarou a mãe.
- Também acho – falou o filho, decidido.
- Será que a gente não pode reclamar lá nesse museu novo? – ela perguntou, olhando para o marido – Quem sabe, se eu for lá e levar as provas todas, eles não colocam seu nome na lista do DOPS? – ela estava indignada – Imagine. Tinha até codinome, ia em reunião secreta, fugia da polícia e não foi fichado? Absurdo.
- Também acho, mãe. Também acho. Vai mesmo – incentivou o filho, diante do homem que suspirava.
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