sexta-feira, 1 de outubro de 2004

virou cronica!

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O churrasco do Zé virou crônica de site. Dei uma melhorada no texto, que ficou mais caprichadinho e descobri que foi publicada hoje de manhã.
O churrasco do Zé

- Zé, vou convidar algumas pessoas para um churrasco no sábado. O que acha? Você topa fazer?
Ele me olhou por cima dos óculos.
- Sábado agora? Aqui em casa?
- É. Umas vinte pessoas.
- Putz, vinte pessoas, Lú? É muito... Eu vou ter que trabalhar demais para fazer um churrasco para vinte pessoas. Nem vou aproveitar.
- Zé, desses vinte, pelo menos dez são homens e teus amigos. Eles te ajudam.
Aquilo o deixou incomodado. Ele deu um pulo.
- O quê? Tá maluca?
- Maluca porquê? Falei alguma coisa errada?
Ele me olhou com cara de espanto.
- Você quer colocar outro homem na frente da minha churrasqueira? No meu quintal? No meu jardim, na minha casa? – ele me olhou apavorado – E quer que eu divida o meu churrasco com ele?
Eu tentei explicar, mas ele não me ouvia. Parecia que eu estava traindo meu marido. Começou com a maior discursaiada.
- Para quê? Para ele estragar tudo? Para ficar dando palpite no meu modo de fazer? Para pegar os méritos no meu lugar? Há. Essa é boa. O meu churrasco é ótimo, tenho mais de vinte anos de prática, imagina agora eu ter que fazer com outra pessoa... ora, essa é boa...
Diante da minha expressão boquiaberta, ele começou a explicar.
- Olha, vou te explicar uma coisa. Um churrasco é uma criação de um único homem. É um produto que tem autoria. Não se pode, nunca, colocar dois homens diante de uma churrasqueira.
Percebi que existe uma lógica masculina muito especial numa cerimônia de churrasco. Fazer um churrasco é como celebrar uma comunhão entre um homem e a carne que ele vai comer. Um homem fazendo um churrasco, mesmo num mundo moderno como o nosso, representa a imagem do caçador orgulhoso diante da caça. Tudo bem que ele, o homem diante da churrasqueira, não caçou aquela carne, mas ali ele tem o controle absoluto do poder. O churrasqueiro é o líder. O poderoso. Sei lá, acho até que num churrasco o mais importante não é nem comer, e sim pilotar aquela máquina de fogo e carvão. O Zé continuava me explicando.
- Uma churrasqueira, Lú, é como... é como a esposa da gente, ou como a nossa caixa de ferramentas. Não se divide mulher, nem caixa de ferramentas e muito menos um churrasco. Entendeu? – ele concluiu, definitivo.
- Zé... – Eu estava pasma – Você está me comparando com uma picanha e com aquela caixa velha e enferrujada onde você guarda as suas ferramentas?
- Num certo sentido... sim. Essas são as preciosidades de um homem – ele disse, sorrindo.
Gente do céu. Aquilo era inacreditável.
- Por isso, homem nenhum deve se meter no churrasco do outro. Jamais.
Eu suspirei fundo. Tudo bem, eu tinha entendido, mas eu podia ou não chamar os amigos? Da próxima vez, pensei, farei uma macarronada, que é menos complicado e não mexe com a masculinidade de ninguém.
- Zé, mas... e aí? Posso ou não convidar nossos amigos no sábado?
Ele deu um longo suspiro, resignado.
- Você disse vinte pessoas? Tsc, eu me viro. Mas faço sozinho! - ele exclamou - Eles vão ver o que é bom pra tosse. Ora bolas, imagina outro cara vir meter o bedelho no meu churrasco... que idéia mais absurda...
Foi quando ele se lembrou.
- E por falar nisso, onde foi parar aquela minha chave de fenda pequena? Alguém mexeu na minha caixa de ferramentas essa semana? Olha lá, hein? Já avisei, não pode...
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