Uma vez, quando meus filhos eram pequenos mas nem tanto, eu tinha que largar o trabalho para buscar um aqui, levar outro ali, fazer rodízio com um monte de mães, pedir favor para outra, era uma confusão infernal. Na época resolvi alguém pra me ajudar. Arrumei um cara meio período, conhecido da minha empregada e que não era caríssimo. Ele contou para os meninos que tinha o apelido de “Urso” pois um dia tinha carregado uma geladeira sozinho.
Bom. O seu Urso era um senhor simples, já avô, boa chapa e meio caipira. Era um pouco preguiçoso também, foi um custo que ele varresse o quintal e a calçada, além de dirigir e lavar o carro. Quando acabava, ficava lá folgadão na área de serviços lendo jornal e ouvindo rádio, o que me irritava um pouco.
Depois de um mês, ouvi um comentário de um dos filhos.
- Mãe. O seu Urso é meio lelé.
- Porque?
- Mãe, ele fala baixinho com... os carros. Repara quando ele te levar pra algum lugar.
- Fala como, menino? Não entendi.
- É assim. Ele para no farol. Vamos supor que na frente pare um Land Rover, ou qualquer outro super carro. Chapa, sei lá, ZCJ 3385. Dai ele fica olhando, olhando e sussurra: “Landrover ze ce jota três três oito cinco...”, “Landrover ze ce jota três três oito cinco...”.
- Ah, vá, gente. Mentira.
- É nada, mãe! E pior, ele sempre fala uma frase pra finalizar.
- Qual?
- “Landrover ze ce jota três três oito cinco, ah, eu ainda vou ter um de você...”.
Pior é que era verdade. Como ele também me levava aqui e ali, ouvi muitas vezes o seu Urso sussurrar: “Pajero eme ene ce um dois quatro nove, ah, eu ainda vou ter um de você...”, como se fosse um mantra pra dar sorte.
Bom, não deu certo ter esse motorista, foram só uns meses. Não por causa dos sussurros, e sim porque era muito mais complicado tê-lo do que não tê-lo, além de caro.
Mas desde então, sempre que paro num farol, às vezes me lembro do seu Urso e fico repetindo quando vejo um putis carrão na minha frente: “bmw erre esse te quatro um dois um, ah, eu ainda vou ter um de você...”.
Hahaha.
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