segunda-feira, 19 de junho de 2006

a mosca do avião



Fui num almoço nesse feriado e acabei conversando um tempão com um ex-professor. Ele tinha acabado de voltar de uma viagem para o exterior, e trocávamos figurinhas sobre as suas impressões sobre os países que visitou. Foi quando no meio da conversa ele começou a me contar uma história fantástica, que não me saiu da cabeça até agora.
É a história da mosca do avião.
Eu tenho um impressão engraçada sobre algumas histórias que ouço. É que as vezes eu percebo o quanto algumas coisas que me contam são sensacionais mas não sei exatamente a dimensão daquilo para a minha existência. Essa história é uma dessas coisas. É uma história que transcende a história dela mesma, que vai além do momento que ela foi contada e da hora que a gente está na vida. A história da mosca do avião vai me perseguir por anos e anos, sei disso.
Foi o seguinte. O professor me contou da sua viagem, dos países que foi e do premio que recebeu, mas depois começou a me contar sobre a viagem de volta dele da Europa para a o Brasil.
- Ouça só, Lúcia. Preste atenção.
Disse que a viagem começou, ele comeu um lanchinho, leu uma revista, essas coisas. Estava a toa, descansando quando olhou para o teto e viu uma mosca.
Uma mosca dentro do avião.
Zuim, zuim.
Sim, isso acontece nas melhores famílias. Se uma vez num vôo da Bahia para cá eu fui totalmente picada por pernilongos, porque é que uma mosca não pode entrar num avião que vem da Europa? Ele conta que achou engraçado aquilo, e que ficou reparando na mosca.
Ela ia de cá para lá. Pousava na cadeira de um, sumia, ia para a cabeça de outro passageiro, pousava numa sacola, numa janelinha, no teto.
- Na maior – explicou o professor – Era impressionante.
- Como assim? - perguntei.
Ele explicou.
- Era engraçado, pois aquela mosca estava ‘se achando’, Lúcia. Ela ia de cá pra lá, decidida demais. Posava nos lugares, levantava vôo, pousava de novo, esfregava as patinhas, voava de novo.
Eu não estava entendendo coisa alguma. E daí?
- Ora, o problema é que ela não sabia de nada. Estava empolgada demais com aquela sua vida de mosca - Ele começou a gargalhar de rir - Mosca mais trouxa. Hahaha.
Hã? Porque a mosca era trouxa?
Diante da minha cara de interrogação, ele explicou.
- Lúcia, perceba. Ela não tinha idéia de que estava vindo para o Brasil. Estava toda empolgada com a sua vidinha besta de mosca, pousando, voando, comendo e, de um certo modo até trabalhando. E jamais imaginaria que estava indo para outro mundo, outro universo, outra galáxia. Aliás – ele completou – o mais surpreendente é que para uma mosca provavelmente não existe avião, nem país e nem planeta. Ou seja, a ignorância dela é tanta que a idéia dela estar indo para outro lugar nem pode ser compreendida.
Ele me olhou seríssimo.
- Você compreende a dimensão da coisa? Percebe que isso pode acontecer a qualquer um de nós? E percebe até que isso pode estar acontecendo exatamente agora, comigo e com você, por exemplo? Podemos estar aqui nesse almoço, conversando, falando e comendo, feito a mosca do avião. Nos ‘achando’. Mas podemos estar em qualquer tipo de avião que nem sabemos que existe indo para outro lugar.
Foi ai, nesse momento que eu percebi aquilo que falei ali em cima, que essa história não ia me sair da cabeça. Pois concordo com ele. É possível se perceber mosca, vez ou outra, é possível até perceber a existência de alguns aviões ou até apenas a sensação do vôo – como disse o Pecus num post auto biográfico e reflexivo que ele fez na semana passada “eu devo estar indo para algum lugar”, ele concluiu – mas são muitos os vôos que a gente está dentro e nem sabe que está voando.
Fiquei com a impressão que talvez fossemos todos um pouco trouxas, feito a mosca.
E confesso que fiquei confusa pra burro.
Franka, uma mosca de avião?

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