quarta-feira, 2 de março de 2005

as listinhas da pasta - III


(pior que esse assunto, só aquele do envelhecimento das bonecas barbies que coloquei alguns meses atrás)

Espero que vocês levem em conta o tempo (inútil) que eu gastei para fazer essa pequena obra de arte do mundo virtual que pode ser vista ai em cima: inclui uma foto da dita cuja, uma escaneação da nota da farmácia, uma colagem e o desenho da serpente "signália", feita por mim mesma.
Sim, sei que não resistirei à tentação, pois eu sempre opto pela coisa mais... boba.
Mas, para a coisa ter um pouco mais de graça, resolvi fazer uma pequena cerimônia para a execução da pasta. Assim, irei ao atelier da Silvia, minha melhor amiga, para abrirmos juntas a pasta. Bê e Cê, as estripadoras. Nessas horas é sempre bom ter companhia. O único problema é que provavelmente tomaremos vinho, o que pode prejudicar um pouco a qualidade da incisão.
Brincadeiras à parte, pensei muito no que me disse a Sheila. Que delícia ter ao lado essa Santa Sheila, com suas muitas idéias deliciosamente impertinentes. Em parte, concordo com tudo que ela me disse. Existem certos mistérios no mundo e na vida que não devemos desvendar nunca. Certos segredos são bonitos justamente por serem segredos, e a arte e a poesia estão na sabedoria de perceber a hora de calar-se diante deles.
Bem. Talvez isso também se chame respeito.
Claro que isso não se aplica a uma pasta de dente de listinhas, óbviamente. Mas se aplica a muitas situações e muitas relações que queremos preservar. Acredito (e muito) que só existe tolerância e convivência quando não desvendamos todos os enigmas alheios. A mágica da vida está exatamente aí: na imaginação, que inventa como a pasta sai em listas. Ou que inventa um amor, um amigo, uma companhia, uma felicidade, uma alegria. Sem maiores explicações, graças a Deus.
Aliás, temos que inventar tudo que nos cerca.
Finalizando, lembrei de uma coisa. Um dia eu li um livro do Bernardo Carvalho e adorei. É dificil adorar os livros do Bernardo, pois são densos e complicados, mas esse deu certo comigo na hora que eu li. Resolvi escrever para ele o que achei, e disse que, um dia, eu gostaria de conhecê-lo pessoalmente. Ele me respondeu uma coisa que tem tudo a ver com isso. É o seguinte:

"...Em primeiro lugar, gostei do que você falou sobre o livro. Em geral não gosto do que as pessoas falam sobre os meus livros (para bem ou para mal - gosto ainda menos quando é para mal, é claro), costumo ficar constrangido, mas as coisas que você disse só poderiam ter sido ditas por você (nunca ninguém me falou assim desse livro) e achei que, além de muito pessoal e autêntica, a sua opinião tinha realmente a ver. Em segundo lugar, acho que as suas chances de quebrar a cara ao querer conhecer o autor pela obra (ou vice-versa) são grandes. E isso é, de fato, um problema. É essa talvez a razão principal do meu horror pelos escritores. Ao contrário de você, detesto encontrar escritores, principalmente os autores dos livros que eu admiro. É quase sempre uma decepção. Não é que o autor não tenha a ver com a obra, mas essa relação não é direta. Em geral, é traumático ler os livros escritos por pessoas de quem você gosta ou conhecer as pessoas que escreveram os livros de que você gosta. É uma decepção de todos os pontos de vista. Pelo menos, é essa a minha experiência. Eu de-tes-to escritores..."

Vê? O Bernardo não foi enfeitiçado pela serpente.
Já eu sim.
Ah, e eu acabei conhecendo o Bernardo. Mas essa é outra história...
Fui!

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