quarta-feira, 28 de março de 2007

a moça da conta


Fui almoçar num restaurante com um amigo ontem.
- Deixa a conta comigo hoje - ele fala.
Para disfarçar, abro a bolsa e pego a carteira.
- Já falei que é comigo - ele me diz diante da mocinha garçonete.
Vira-se para ela.
- Vou pagar com cartão de débito, você pode trazer a maquininha?
De uns tempos pra cá virou moda usar essas maquininhas de cartão sem fio. Quase todo mundo paga digitando senhas. Outro dia fiquei horas e horas numa loja para conseguir passar um cheque – me investigaram como se eu fosse do PCC. "A senhora não tem mesmo cartão de débito ou crédito?", perguntaram as vendedoras, pasmas.
Com dinheiro é pior ainda. Tento pagar com notas minhas compras, mas é quase impossível. Parece que você está pagando com moeda de outro pais quando apresenta uma nota de cinqüenta para pagar uma camiseta de, sei lá, 20 reais. As vendedoras me olham como se eu fosse uma grega pagando em dracmas ou uma mulher do Azerbaijão pagando em manats. Ninguém apresenta mais dinheiro. Super esquisito.
A garçonete voltou com uma maquininha mínima, menor que um celular, moderninha e toda acesa. Não sei se é porque a coisa de pagar hoje em dia ficou super complicada mesmo ou se ela era tapada naquela coisa de pagamentos e maquininhas, mas aconteceu uma coisa super confusa. A impressão que eu tenho é que a moça se desconectou da realidade por um tempo e nos levou junto dentro da sua lógica completamente atrapalhada.
Ela pediu o cartão, perguntando “débitôcrédito”. O meu amigo deu o cartão falando "débito" e ela enfiou no buraquinho. Digitou os números e deu pra ele colocar a senha.
- Você colocou o valor errado - ele falou - Eu vou pagar o meu e o dela.
Ela olhou para a máquina e para a conta na mesa.
- Meu senhor, a conta tem um valor total, mas aqui em baixo, olhe – e ela apontou o papelzinho - aqui tem o valor por pessoa.
Olhamos.
- E daí? - ele perguntou - Eu vou pagar tudo.
Ela fez uma cara de sabida.
- Ora, senhor – ela olhava para o meu amigo como se ele fosse muito burro - E daí que aqui tem o valor de cada pessoa, olhe. O senhor é uma pessoa, ela é outra pessoa, então primeiro eu coloquei o valor do senhor.
- Mas... mas e o valor dela? - meu amigo perguntou, confuso – quem é que paga?
Ela deu uma risadinha.
- Ué. Não é o senhor que vai pagar?
- Sou. Então.
- Então o valor dela eu coloco depois que eu colocar o do senhor – ela explicou, já meio brava – uma coisa de cada vez, moço, eu sou uma só.
Eu interrompi.
- Moça, desculpa, mas isso não tem lógica. Ele vai ter que fazer dois pagamentos? Porque não pode fazer um só?
- A conta tem o valor por pessoa, senhora – ela explicou mostrando a conta e me olhando como se eu fosse a maior burra.
Como ela tinha com certeza absoluta do que dizia, parecia que ela tinha total razão.
- Err. Vou ter que fazer dois pagamentos então? - perguntou meu amigo, ainda com a maquininha na mão.
- Sim senhor.
- Ixi, demoramos e a máquina desligou - ele mostrou, dando para ela a máquina apagada.
A moça aproveitou a deixa, pediu um minuto, pegou a máquina e correu para o caixa. Eu e meu amigo começamos a rir.
- Nunca vi isso - ele falou - fazer diversos pagamentos? Mulher mais louca. Acho que foi ver se era isso mesmo.
Ela voltou sorrindo.
- Pronto, liguei de novo. Eu não sabia qual era o botão, essa máquina é um modelo novo.
- Então... então é pra pagar duas vezes mesmo?
Ela colocou as duas mãos na cintura, pose de açucareiro, meio irritada.
- O senhor quer falar com o gerente? Se quiser eu chamo.
- Não, não – ele disse - Dá aqui a máquina.
Ele digitou a senha, pegou o comprovante, ela fez o segundo pagamento, ele digitou de novo devolveu para ela. Esperamos a maquininha imprimir o outro papel. A mocinha fez uma cara de orgulhosa de ter vencido e feito a coisa di-rei-ti-nho. Levantamos para ir embora.
- Vamos?
Quando chegamos na calçada, ele tirou uma coisa do bolso e me olhou.
- Olha o que essa bagunceira me deu junto com o cartão e os comprovantes - ele diz, morrendo de rir e me mostrando a maquininha. Vamos voltar de devolver, quero ver a cara dela, hahaha.

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