segunda-feira, 7 de agosto de 2006

tchibum!




Aconteceu numa reunião de trabalho. Uma obra ia ser iniciada e diversos profissionais foram convocados para uma reunião com os engenheiros para esclarecimentos de dúvidas. O clima era de ar condicionado e cafezinho, com horário marcado para começar e acabar, e no ar havia uma certa formalidade comum a reuniões com diversos profissionais.
Como em toda a reunião desse tipo, volta e meia se ouvia um celular abafado e alguém correndo para um canto para atendê-lo. Hoje em dia as pessoas sabem o quanto é errado deixar celulares ligados em reuniões, e, ou colocam no 'silencioso' e dão espiadinhas fortuitas ou deixam os aparelhos na vibração, o que pontua as reuniões de trabalho com diversos sons similares à roncos de barriga ou, pior, arrotos ou peidos. Obviamente que tais sons são muito, mas muito deselegantes do que os toques, cá entre nós.
Bom, depois de um desses ‘eventos’ causados pelo celular de um dos projetistas, os demais se distraíram um pouco. Foi quando uma das arquitetas comentou.
- Ainda bem que hoje estou sem celular.
- Perdeu? – perguntou um engenheiro japonês.
- Não. Aconteceu uma coisa engraçada – ela disse, sorrindo - Eu estava no banheiro, me arrumando de manhã, coloquei o celular na bancada do banheiro, fui escovar os dentes, secar o cabelo e...
Todo mundo olhou e ela continuou.
- Gente do céu. Quando eu vi, trombei no aparelho e ele catapimba. Tchibum!
Todo mundo continuou olhando e ela finalizou.
- Dentro da privada. Hahaha.
A sala ficou em silêncio total. Ninguém riu, o que a constrangeu um pouco.
- O seu... seu celular caiu dentro da privada? – perguntou a engenheira chefe da construtora, gaguejando.
- Olha que azar...! – ela disse, completamente à vontade com aquele assunto – ... nunca tinha me acontecido isso.
A sala toda ainda se manteve em silêncio. Obviamente que todos, antes de se manifestarem, queriam saber o diria a engenheira-chefe, que era uma das líderes da reunião.
- E... o que você fez? – a engenheira perguntou, cautelosamente.
- Ora, eu peguei... – disse a arquiteta, dando de ombros – ... e enxuguei. Tentei ligar, mas não funcionou. Acho que quebrou. Deixei na assistência técnica.
O silêncio ficou intimidante e constrangedor. Óbviamente que nesse momento o mundo se dividiu em duas partes, principalmente ali, dentro daquela reunião: os que não tinham nojo da moça que pegou o celular de dentro de um vaso sanitário e os que preferiam a morte a estar ao lado dela.
- Peraí um pouco – falou um engenheiro japonês, interrompendo a moça – Quer dizer que você... que você ainda vai usar esse aparelho?
- Óbvio que vou! – falou a arquiteta, estranhando a pergunta.
Foi quando a outra arquiteta, que trabalhava com aquela e que estava ao seu lado, afastou-se com cara de asco.
- Ai, que nojo! Vai colocar perto da boca numa coisa que caiu na privada?
- Mas a privada tava limpinha – ela se defendeu – É a minha privada, gente! Minha, privada de suite!
- Ah, vá, não exagerem – falou um engenheiro mais velho, defendendo a mocinha, quando viu que ela estava acuada.
- Como "exagerar? – falou um dos engenheiros de instalação, pasmo – Não existe privada ‘limpinha’. Privada é coisa muito suja, sempre. Os coliformes... – ele disse, parando exatamente nessa palavra, provavelmente para dar um certo efeito à frase.
- Ei. Você “lavou” o celular? – indagou o engenheiro japonês – com água “limpa” da pia, por exemplo?
- Claro que não! Podia piorar o estrago – ela disse, atrapalhada.
A outra arquiteta, que a cada minuto se afastava mais da colega, arriscou.
- Vai dizer que pra testar você colocou no ouvido? E perto da boca?
- Parem com isso, que coisa! – disse um dos projetistas de drenagem, também defendendo a arquiteta do celular da privada – Olha, o meu celular caiu numa poça d´água da rua e eu uso até hoje. Celular é caro pra jogar no lixo.
- Argh, jura? – perguntou o engenheiro japonês.
- Eu não jogaria fora – disse o engenheiro mais velho, se posicionando no grupo dos não nojentos.
Todos olharam para ele.
- Mas limparia com álcool – ele se defendeu, engolindo em seco – Muito álcool, muito!
- Peraí... – interrompeu o engenheiro de instalações da turma dos nojentos – você disse que deixou na assistência técnica?
- Sim.
- E... – ele falou pausadamente - E você contou a verdade para a pessoa que te atendeu?
Todo mundo olhou para a arquiteta, sem respirar.
- Não... não podia, né? As pessoas teriam nojo do meu celular. Só falei que caiu água nele.
- Céus. Isso é horrível! – disse a engenheira chefe.
- Corretíssimo – falou o moço da drenagem, apoiado pelo projetista do celular na poça – eu também não contei da poça de água para o moço que consertou o meu.
- Mas o celular não ficou fedendo? Você cheirou bem? – perguntou a arquiteta amiga, com cara de ânsia.
A moça suspirou, confusa.
- Vocês acham que eu fiz errado? – ela desabafou, já com outro tom na voz – acham que eu deveria jogar no lixo e comprar outro?
Ouviu-se um murmúrio geral, com diversas conversas paralelas, até que a engenheira chefe, apesar de saber que o grupo não chegara a um consenso sobre o caso do celular na privada, resolveu encerrar aquela chacrinha e retomar os tópicos da reunião, obviamente muito mais sérios e importantes. Depois de um “vamos lá gente que o tempo tá passando”, ela uniu novamente os dois mundos dentro do assunto “obra”.
Sem privadas, sem celulares e sem nojo.
Mas depois que a reunião se acabou e todos se levantaram para se despedir, notou-se que tanto o engenheiro japonês quanto a engenheira chefe respiraram fundo e deram a mão bem de longe para a arquiteta, evitando os beijinhos de tchau.

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