quarta-feira, 8 de fevereiro de 2006

as raizes



Aqui perto de casa tem uma pracinha cheia de árvores. Algumas muito grandes, milenares, que nasceram ali da época do matagal, e outras que, coitadas, percebe-se que foram plantadas com o intuito apenas de embelezar.
Não é a mesma coisa. Óbvio que são árvores completamente diferentes. Existe uma legitimidade nas árvores que já existiam ali que não existe nas outras. Uma questão de sangue. Ou melhor, de seiva. São árvores nativas. Tradicionais.
Há uns anos atrás, uma das milenares caiu por causa de um raio numa tempestade. A prefeitura veio, tirou o tronco, os galhos, consertou a parte elétrica, os fios, os postes. Na praça ficou apenas aquele toco do tronco, aquele tornozelo podado, aquele pescoço sem cabeça, aquelas marcas fundas das raizes já sem sentido, perdidas no chão. Durante muito tempo aquilo ficou ali, sulcado na memória, até construirem uma pista de cooper que eliminou os últimos vestigios da velha árvore.
Os meninos eram pequenos, e um certo dia, nessa época, fomos dar uma volta e um deles notou as raizes ali.
- Olha mãe... ainda estão aqui as raízes daquela árvore que caiu!
- Estranho, não é? - comentei com eles - Olhem o tamanho da raiz. Dizem que a raiz é do tamanho da copa da árvore.
Os meninos olharam, andando por cima daquelas veias sulcadas no piso.
- Tudo isso era a raiz de uma árvore só? - um deles perguntou.
- Sim.
- Nossa. É enorme, não parecia - ele notou.
- Pois é, filho.
- Mas. Mas e agora?
- Agora o quê?
- O que vão fazer aí?
- Aí onde?
- Ai, na raiz, mãe - ele mostrou, apontando para o chão.
- Ninguém faz nada numa raiz, filho. Que idéia.
Foi quando ele me olhou abismado.
- Peraí, mãe. Tá dizendo que não dá para aproveitar isso para nada? Sério? Não dá pra plantar outra e aproveitar essa raiz ai?
Eu nunca respondi a essa pergunta. Mas me lembrei hoje dessa observação do meu filho.
Aproveitar as raizes.
Será?

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