terça-feira, 24 de maio de 2005

o turismo de cheiro


essa é franka fazendo turismo de cheiro em aparecida
- Vou estudar, mas também vou fazer muito turismo – declarou o Chico, com uma lista na mão.
- Turismo? – falou o Zé para o nosso filho mais velho, que vai viajar sozinho – Nem fala isso pra tua mãe.
- Fala o quê?
- Hoje pela manhã ela disse que detesta turismo.
- A mamãe detesta turismo? De onde ela tirou isso?
- Sei lá. Ela acordou, leu o jornal e decidiu que detesta turismo. Ficou lá na mesa, tomando chá e inventando uma teoria.
É a mais pura verdade. Eu acordei, li o jornal e resolvi que acho esse negócio de turismo uma... bobajada.
Dá licença, como diria uma grande amiga minha. Dá licença...
Tudo começou quando vi a foto. Era uma imagem de um forte, uma construção antiga e bonita, com uma vista deslumbrante para o mar, com muros grossos e canhões. Tudo aquilo seria o máximo se não fosse um único detalhe: na imagem havia um casal que, sentado nos canhões, tirava fotografia um do outro.
Ah, não.
Não sei se vocês podem entender o que eu senti naquele momento. Pela primeira vez na vida, vi uma coisa que nunca tinha visto. O que aquele casal estava fazendo ali?
Oras, estavam fazendo turismo pelo litoral do Brasil. Mas com aquela a ação eles estavam transformando a realidade em ficção, em imagem, em cenário. O maravilhoso forte não era mais um forte, não era mais legítimo, não servia mais às suas funções e poderia muito bem ser falsificado em qualquer lugar. Aquilo era tudo, menos um forte. Era apenas um dos pontos de parada de uma excursão, onde as pessoas tiram fotos para mostrar aos amigos.
Os locais de turismo são todos assim: lugares que perdem a identidade legítima para virar cenário de fotos. A história, a beleza e os fatos que ocorreram ali são souvenires. Nada é o que é, tudo é produto de consumo. Entender esse poder que tem o turismo me fez detestar o turismo, naquela minha manhã de domingo.
- Calma, lúcia – falou o Zé – ... senão a gente nunca mais pode viajar!
O pior é que a gente sempre viajou para tudo quanto é canto, mas naquele momento “viajar” me pareceu uma coisa extremamente boba e absurda. Acho que é justamente essa a maior diferença entre a civilização do nosso século e a civilização do século passado. O lazer. Meu avô nunca tirou férias na vida. Era médico no interior, e como tinha um trabalho necessário e importante, nem pensava no assunto. E não ficava cansado, estressado ou exausto. Nada que uma noite de sono não resolvesse. Mas nós não. “Precisamos” viajar. “Precisamos” descansar. “Precisamos” fazer turismo. Como se isso nos aliviasse do trabalho. Mais ridículo ainda. Trabalho não cansa. Alimenta.
Turismo?
Ora, acho que o turismo só serve pra uma coisa hoje em dia. Pra cheirar. O resto a gente pode conhecer sem ir ao lugar. É possível ver fotos até de 360 graus de tudo quanto é lugar do mundo, é possível ver filmagens, músicas; é possível até conversar com as pessoas de outros lugares sem sair de casa.
A única coisa que (ainda) não dá para saber é como é o cheiro do lugar. Se alguém me falasse que vai viajar para sentir o cheiro do lugar, ai eu não me importaria. Se é para sentir cheiro pode ir.
Assim, a partir de hoje, só concordo com isso: com o turismo de cheiro.
Ouviu, Chico? Vai estudar.
E, se sobrar tempo, pode sentir o cheiro de Paris...

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