sábado, 26 de março de 2005

PSS - um post super sério



Sabe aquelas propagandas de venda de apartamento que estão em todo jornal?
Essa era mais uma delas.
Acho que quem sustenta os jornais são a especulação imobiliária e os shoppings. Nunca vi duas coisas fazerem anúncios tão gigantescos. Aliás, quanto a isso tenho a declarar que acho um absurdo a venda da página principal e das primeiras páginas dos cadernos dos jornais para anúncios. Um dia vou escrever pro ombusman reclamando. Deveria existir uma lei proibindo, pois tem dias que a foto da propaganda que está na primeira página é tão grande que só cabe o título da matéria, esprimidinho, resignado...
Dá a maior dó do jornalismo.
Mas voltemos ao jornal de hoje. Essa propaganda específica era dessas de página inteira. Bem, analisei a planta de cabo a rabo e cheguei a algumas conclusões, que colocarei aqui. Esse é o motivo desse PSS (post super sério): uma análise de um lançamento de um apartamento coletado aleatoriamente num jornal paulista.
Temos que entender em que mundo vivemos para não ficarmos para trás, gente.

Bem, o tal prédio não tinha ares neoclássicos e nem nome de palácio francês, o que me deu um tremendo alívio (tenho calafrios inexplicáveis a cada vez que me deparo com um nome francês de algum prédio). Tratava-se de um apartamento de três quatros, dois por andar. O arquiteto eu não direi para não fazer propaganda, mas era um desses arquitetos “da moda” e o anúncio tinha até um “selinho” do cara, como a existência dele conferisse ao empreendimento uma “grife arquitetônica”. Olha. Irritante essa coisa de arquiteto moderninho ser “grife”. Outra coisa que devia ser proibida, não acham?
O apartamento tinha cinco banheiros, um para cada quarto, um lavabo para as visitas e um banheirinho para a empregada. Cinco banheiros é, eu acho, o padrão de número de banheiros para uma família nos dias de hoje. Eu mesma sou uma mulher de cinco banheiros e me orgulho muito disso. Gente, não é fácil ter cinco banheiros, é preciso batalhar muuuito para conquistá-los, e para mantê-los então, nem se fala. Haja quantidade de papel higiênico, sabonete, shampoo e sachêzinho cheiroso.
Em destaque, lá estava uma enorme churrasqueira no terraço do tal apartamento. Hoje em dia virou a maior moda comer churrasco no terraço dos apartamentos. Tudo quanto é apartamento agora tem uma churrasqueira no terraço. Acho ótima essa nova idéia, com isso todos apartamentos acabam tendo uma área externa, que me parece menos claustrofóbico. Só tenho curiosidade de saber o que acontece se todos resolvem fazer churrasco ao mesmo tempo. Hihihi. Deve ficar a maior caatinga no bairro todo.
Outra coisa que eu notei com uma certa tristeza foi que o quarto de empregada puft, se foi. Foi eliminado do programa do viver moderno. Sumiu! Como o banheiro da empregada ainda existe, suponho que "eles" (o arquiteto de grife e o incorporador, são eles que mandam na nossa vida) decidiram que hoje em dia as pessoas dos apartamentos de cinco banheiros terão empregadas, mas que elas serão diaristas. Incrível como decidem a nossa vida hoje em dia, né? É bom porque a gente não precisa nem pensar. Eles detestam pessoas que pensam muito.
Depois achei um ambiente novo, que eu nunca tinha visto. Eles chamaram de "Home Office", e é apenas um cantinho ligado à sala e fechado com uma porta, onde existe um computador. Mas... olhando bem, acho que reconheço esse cantinho! É o falecido quarto da empregada!
Háhá! Sabia que ele estava em algum lugar!
Logo embaixo da planta, estavam essas quatro imagens que ilustram o post. São as áreas comuns do edifício. Um deles é o tão famoso “fitness” com piscina coberta. "Fitness" é a sala de ginástica, que antes só existia nas academias e de um dia para outro surgiu feito uma asombração dentro dos prédios. Mas eu acho que eu sei de onde veio isso. Pensa comigo: antigamente os prédios tinham playground para as crianças. Hoje em dia essas mesmas crianças dos playgrounds cresceram, casaram e compram apartamentos com um outro tipo de playground, que é o fitness! Não é? Engraçado!
Depois achei mais dois locais estranhos e... bem modernos. Um deles se chamava “Espaço Gourmet”, o outro “LAN House”. Juro que não sei bem o que é aquilo, mas pelas fotos me pareceram simplesmente o bom e antigo salão de festas e a velha e boa sala de jogos com uma roupagem mais moderninha. Ou estou enganada?
Caramba. Como para morar hoje em dia precisamos de coisas estranhas.
Só para finalizar, eu morei em prédios por mais de trinta anos. Um dia, quando era menina, estava dormindo na minha cama e percebi tudo. Comecei a pensar que sobre mim dormia uma pessoa, e sobre ela dormia mais uma, e que eu mesma estava acima de diversas, e todas nós estávamos sobre uma garagem cheia de carros. Desde esse dia, morar em prédios passou a ser isso para mim – um monte de pessoas que dormem empilhadas sobre os carros.
Claro que uma coisa esquisita como essa, trinta anos depois, só podia gerar ambientes estranhos mesmo...

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