terça-feira, 30 de agosto de 2005

a van, as velhinhas e o prata


Na época não existia seu Loreto, eram só mulheres.
- Já que você pergunta tanto como é, quer ir hoje com a gente? – sugeriu minha mãe.
- Eu? Na van?
- É.
- Eu... eu posso ir, mãe?
- Claro que pode, oras. A dona Isabel já levou a filha dela, eu levo você.
- Oba. Então eu vou.
- Olha, se arruma que é cedo. Seis, seis e meia.
- Seis horas? Que horas que é o teatro, mãe?
- Nove. Mas é aquele pinga pinga para pegar todo mundo. Se prepara. Demora.
- Ichi. Vou tomar um dramim.
- Melhor.
O Zé estranhou.
- Porque tão cedo? Credo. Vai com seu carro, lúcia.
- Agora não posso, Zé. A minha mãe avisou que eu ia, não quero ser antipática.
- Mas três horas antes? Onde que é esse teatro, em Piracicaba?
A van chegou, ainda era dia. Minha mãe já estava lá dentro, sentadinha. Os meus filhos saíram na calçada para ver como era. O Zé idem.
O motorista, muito educado, saiu e colocou uma escadinha para eu subir. Imagina. Escadinha. Lá dentro, a Vera, a organizadora, a minha mãe e uma senhorinha. Entrei e me sentei do lado delas. A velhinha me cutucou, com uma cara de sem vergonha.
- Aposto que o seu marido está morrendo de ciúme. Olha a cara dele... – ela apontou para o Zé, que estava se segurando para não rir – Humpf. Aposto que ele veio aqui fora para verificar se iam só mulheres mesmo. Que ciumento!
A van prosseguiu. Pegou duas senhoras em Pinheiros, uma no Itaim, uma nos Jardins, outra na Bela Vista, outra perto da Pamplona. A cada senhora que entrava, eu era apresentada como a novidade do dia, aquela com marido mais ciumento do mundo. E pimba, a primeira velhinha começava de novo a contar a impressão que ela teve do Zé.
- Vocês não sabem. O marido dela veio investigar, na porta! Queria ver se não tinha homem aqui com a gente. Ciumento!
Engraçado. O Zé nem imagina como ele tinha ciúmes de mim ali, dentro daquela van.
Quando a última senhora entrou, a Vera sacou um microfone e anunciou que a noite ia começar. Explicou qual era peça que íamos assistir, falou sobre os autores, sobre os atores, sobre o enredo, deu uma pequena aula. Depois me apresentou e me deu o microfone. Eu, envergonhada, contei quem eu era, bem rapidamente.
- Oi, eu sou a Lúcia, a filha da Hebe, sou arquiteta, casada e tenho três filhos.
Pronto.
Foi quando minha mãe resolveu me exibir. Acho que ela achou muito pouco. Sabe mãe como é.
- Ah, vá. Lúcia, dá licença aqui – ela pegou o microfone - Gente. Minha filha, além de arquiteta, é escritora e amiga do Mário Prata. Está até dentro do livro dele.
- Aaa! – elas todas gritaram ao mesmo tempo – Jura?
Foi uma gritaria, um berreiro, um alvoroço. A simples menção daquele nome deixou as senhorinhas todas completamente histéricas. O homem era um Deus ali dentro. Elas ficaram excitadíssimas, animadíssimas.
- A gente acha ele lindo de morrer, o Pratinha! – todas falavam – Vamos em todas as peças dele. Somos fãs, fãs de carteirinha! Lemos tudo que ele escreve!
- Conta tudo que você sabe sobre ele, vamos!
- Como ele é ao vivo?
- Ele é engraçado?
- Ele é alto? Magro? Bonitão?
A Vera me deu o microfone de novo. Eu olhei para a minha mãe, ela começou a rir e eu entendi. Era melhor agradar as senhorinhas. Contei um monte de histórias, exagerei muito, o Prata nem imagina as coisas que eu inventei sobre ele. Depois ele acha que as fãs dele são as mocinhas. Que nada. Quem gosta dele é a turma da terceira idade... E como gosta, que assanhamento.
Foi quando a primeira velhinha me olhou, desconfiada.
- Humpf. E seu marido, o ciumento? O que ele acha?
E por falar em teatro.
Estou um bagaço hoje por causa da noitada teatral de ontem. Coisas da minha nova GRANDE amiga escritora Ivana. Mais informações, podem conferir no blog dela, o Doidivana, a história "O inesquecível aniversário de Indigo Girl".
Ela merece uma linkada.

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