terça-feira, 9 de agosto de 2005

João, me salva!




Quem já não ficou deslocado numa festa?
Eu sempre acho que isso vai acontecer comigo. Acho não, tenho certeza. Saio de casa sempre prevendo o pior: que eu vou ser a primeira a chegar, que não vai ter ninguém conhecido, ou o pior pesadelo: errar o dia. Até antevejo a cena, eu tocando a campainha e dando de cara com a dona da casa, de camisola: Festa? (bocejo)... a festa foi ontem, não sabia?
Acho que é impossível nunca ter se sentido assim e também acho que é preciso muita análise para não dar a mínima quando uma situação dessas acontece. O que fazer quando você chega num lugar e não conhece ninguém?
Às vezes isso ocorre em lugares que você nunca imaginaria. Fui levar o João no aniversário de um amigo dele. Ele tinha, na época, uns seis anos, tinha mudado de escola e estava com vergonha de ir sozinho.
- E se eu ficar desenturmado, mãe?
- Não vai ficar.
- Vai comigo? Por favor...
Concordei. Não custava nada.
Chegamos na tal festa. Era um salão de festas de um prédio, um monte de crianças correndo, aquela tradicional bagunça. Eu olhei para lá, para cá.
- Filho, ajuda. Quem são os teus colegas?
- Aquele, mãe. Aquele outro, de vermelho, tá vendo? E aquele ali...
Chegamos perto dos meninos. Mostrei o João e eles o chamaram para brincar. Em três tempos o Joãozinho corria daqui para lá, feliz da vida, com um monte de crianças.
Enturmadíssimo.
Bom, eu sosseguei. Peguei um guaraná, um sanduichinho, fui passear pela festa. Andei de lá para cá, olhei aqui e lá. Um monte de turma de mães. Grupinhos. Todas falando, felizes, animadas, mas eu não conhecia nenhuma delas.
Vamos lá, pensei. Agora, é minha vez de me enturmar.
Cheguei perto de umas mães, ali ao lado. Mas, opa, levei um susto. Bem naquele momento uma delas disse alguma coisa e todas começaram a gargalhar altíssimo, segurando umas nos braços das outras para não cair. Sabe aquele tipo de gargalhada de acesso de riso? Olha. Não dá para enturmar com gente gargalhando, gargalhada não é uma coisa... receptiva. Para mim, foi praticamente repelente. Não deu, saí de perto, disposta a arrumar outro papo de mãe.
Fui para fora, com meu guaraná na mão. Lá estava um outro grupo de três mães. Fiquei perto delas, em pé, ouvindo. Elas falavam mal de alguém, dava para perceber, pois cochichavam. Me viram ali ao lado e não gostaram, olharam de alto a baixo, e foram, discretamente, dando uns mini - passinhos para o lado, falando mais baixo ainda e me deixando sozinha do lado do trepa-trepa. Paciência. Em vez de me enturmar, passei por enxerida.
Nossa, a coisa estava difícil, pensei. Fui até a mesa do bolo e fiquei olhando os enfeites, sem graça. Ao meu lado, notei. Um pai, tão sozinho quanto eu, dando sopa para uma conversinha. Ôba. Cheguei perto, puxei um papo bem besta.
- Essas festinhas são todas iguais, né?
Ele riu, mas não pôde responder. Foi i-me-dia-ta-men-te arrancado dali por uma moça gordinha de taierzinho vermelho, provavelmente a esposa, que achou que eu passava uma cantada no cara. Piorei mais ainda minha situação ali. Além de enxerida, passei a ser vista como mãe-galinha, daquelas que dá em cima do marido das outras. SantoDeus.
Droga. Será que nem uma tiazinha ou uma avó estavam dando sopa? Fiz uma rápida investigação. Ahá. Lá estava a terceira idade, na salinha de estar. Mas estavam todas nos sofás, encaixadinhas, sem nenhum lugar disponível. Tinha tia até nos braços do sofá e na mesa de centro. Lotação esgotada.
Tudo bem. Ficarei sozinha, concluí. Ninguém tem nada com isso. O importante é que o João está feliz.
Mas me lembrei da mãe do aniversariante. Quem seria ela? Uma dona duma festa tem, obrigatoriamente, que ajudar os convidados que estão com problemas ou que estão desenturmados. Eu sempre faço isso na minha casa, sempre fico de olho nos convidados perdidos nos cantos. Ela iria me ajudar. Cadê? E quem seria?
Nada. Ninguém ali tinha cara de organizadora e líder absoluta. Achei um que devia ser o pai-marido, mas nem ousei chegar perto. Bastava uma mãe furiosa ali, me confundindo com mãe galinha.
Tinha que existir uma mãe de aniversariante ali. Ah, só podia ser aquela. Uma mocinha cheia de presentes nos braços, falando com uma senhora que chegava, de roupa branca, salto, maquiada.
- Oi. Você que é a mãe do aniversariante?
- Não, senhora. Sou a babá dos meninos. A dona Estela está lá em cima, amamentando. A senhora quer que guarde a sua bolsa?
- Não, deixa. Obrigada.
Mas minha vontade era de falar para ela, moça, socorro. Me salva. Sou a pessoa mais solitária dessa festa, mais incompreendida, estou sofrendo, me ajuda. E terei que ficar mais três horas aqui, sozinha, abandonada, bebendo guaraná quente, com toda essa gente gargalhando, segredando, sentada em sofá e tendo ciúmes de mim. Socorro! E a minha bolsa fica aqui. Pelo menos ela está comigo!
Foi quando alguém me puxou. Era o João.
- Mãe. Eu estava te olhando de longe. Você tá muito desenturmada e sem graça, está me dando a maior vergonha. Vai para casa e me pega depois. Tá?
Quer mico maior que ficar desenturmada em festa infantil?
Saí dali sem dar nenhum tchau. Mas, para quem?

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