quarta-feira, 4 de maio de 2005

“Diferente”, né?


Meninos e meninas, lavem-se de lilás. Eu vou pra Bahia amanhã cedinho e volto no final da tarde. Fui!

Já imaginou chegar em casa depois de uma viagem de final de semana, abrir a porta e encontrar... uma casa completamente estranha, toda roxa e amarela?
É um pesadelo?
Não, é a última moda.
Falo daqueles programas de decoração que existem agora nas TVs pagas. São programas onde as pessoas saem das suas casas, geralmente enganadas por algum parente que tem um pacto com a direção do programa, e na volta encontram um lugar diferente, com outra decoração. É um tipo de “pegadinha”. Durante o tempo da viagem forçada, entra em ação uma equipe de decoradores que faz gato e sapato na casa do fulano. Não podemos dizer que o resultado final seja muito... caprichado. É tudo feito meio nas coxas, pois a graça do programa é um desafio: os decoradores não podem ultrapassar um valor e tem que acabar em dois dias. É como se fosse uma gincana, mas quem ganha o prêmio não é o dono da casa. Aliás, não sei quem ganha. Acho que é a emissora de tv, mais uma vez.
Esses programas me deixam embasbacada. Não consigo desligar até a hora do pobre coitado voltar e encontrar a sua casa, antes tão autêntica, toda lilás.
Bem, essa coisa do lilás é verdade. De todos os programas que eu vi, em quase todos o decorador resolveu pintar as paredes de lilás. Quer cor mais estranha que... lilás?
Alguém conhece alguma pessoa com uma casa lilás, gente?
Já acho essa coisa de “decoração” pronta esquisita quando acontece normalmente, imagina numa situação dessa. Para mim, decoração é montar a sua casa ao longo da vida. Acho que as nossas casas devem tomar forma diante dos nossos olhos ao mesmo tempo em que a nossa história é contada. São nossos olhos e a nossa vida que decoram as nossas casas, e não os olhos e a vida dos outros. Decorar é acumular, é adquirir, é precisar, é herdar. É preciso paciência para decorar.
Mas o consumo e a pressa do mundo não entendem essa paciência. Necessitamos resolver rápido, há uma urgência na procura pela perfeição. Assim, junto com esse tipo de programa surgiram infinidades de outros, todos de mudanças súbitas. Programas de cirurgias plásticas súbitas, programas de emagrecimento súbito, programas de banho de loja súbito.
É o circo dos nossos tempos, o divertimento da moda. Acabou a graça da magia infantil dos lenços, pombos e truques, passamos a fazer mágica com a realidade. Como num passe de mágica, vestirmos a máscara perfeita, a fantasia perfeita e entrarmos no cenário perfeito. E dá-lhe susto.
Acho que a moda agora é levar susto.
Na família do Zé, quando alguém pergunta para qualquer um deles o que eles acham de uma coisa e eles não gostam muito, eles sempre dizem:
- Gostou?
- Hummm. Diferente...
Depois de algum tempo de casada, descobri o que significava exatamente esse “diferente”: queria dizer que eles achavam a coisa absolutamente ridícula e que estavam gargalhando por dentro.
Lembrei disso quando vi um desses programas. Quando tiraram a venda dos olhos do pobre do casal, eu pude ver a expressão de desespero deles ao encarar a horrorosa sala de estar lilás.
- E aí? Gostaram? – perguntaram os decoradores-apresentadores, sorrindo.
- Hum. “Diferente”, né?

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