quinta-feira, 3 de fevereiro de 2005

voando stressada



A coisa mais difícil do mundo é achar graça nas coisas que não tem graça nenhuma. Mas é um exercício mais do que necessário se você pretende viver sem stress.
Me propus a fazer isso há mais ou menos um ano, depois que fui assaltada e fiquei toda traumatizada. Desde então, cada vez que surge uma situação de ódio, raiva, tento pensar num modo de dar risada para poder falar "dane-se".
Ô coisa difícil na hora, ô coisa boa depois. Juro, nunca me arrependi de não me irritar. Mas desta vez não foi culpa minha.
Verdade mesmo.
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É que na volta da Bahia para São Paulo, eu cansada de tudo e acompanhada de dois engenheiros da obra, descubro que a TAM vendeu passagens além do número de assentos. E que nós, mesmo tendo chegado 1 hora antes do vôo, não podíamos voltar: os outros 120 passageiros eram uma turma de uma convenção da Telefônica que foi para Comandatuba e que fizeram check-in no hotel, antes de todo mundo.
Tinham preferência, acho.
- É uma casualidade, senhora - me falou sorrindo a atendente da TAM, de cabelos colados no crânio (como elas fazem aquilo?) - Mas colocaremos os senhores no próximo vôo, amanhã cedinho.
Liguei para a Ana, a secretária do meu cliente, que me compra as passagens.
- Ana, sobramos aqui em Ilhéus. Acho que vamos ter que dormir aqui.
- Quê? Como? - ela berrou - Tá louca? De modo algum, lúcia! Isso é absurdo, a TAM não pode fazer isso! Faça um escândalo, berre, xingue, não deixe de embarcar no seu vôo! - ela me disse, enfática.
Olhei para um lado e para o outro. Lá estavam eles.
Umas 120 pessoas irritantemente felizes, bronzeadas e sorridentes. Eu estava cansada, imunda e com fome. Não seria difícil fazer um escândalo.E... e, bem, a Ana mandou, não foi?
Gente, sabe aquelas mulheres que berram no balcão do check-in, indignadas, histéricas?
Era eu ontem a noite.
A cliente descontrolada e estressada da TAM.
Deusdocéu.
Armei o maior barraco. O mais maluco é que, a cada frase que eu proferia, a coisa ia aumentando, sem nenhum controle. Acho que eu estava até gostando daquilo. Infladona. Enlouquecida. Completamente descontrolada.
Mas não estava dando em nada. Não tinha mesmo lugar para nós no vôo, e eu naquela berração inútil. Veio gerente, veio assistente, veio chefe, veio guardinha, e eu lá, firme e toda escandalosa.
Acho que perto de uma excursão de 120 Telefônicos (todos com a mesma camiseta, amarela e azul), a gente não tava lá com muita moral com a TAM.
Chegou uma hora que aquilo começou a encher o saco. Mais de uma hora berrando e argumentando não há quem aguente. Tive uma súbita vontade de desistir, mas como fazemos para "reverter" um escândalo num check-in? É muito mais complicado des-escandalizar que escandalizar, afinal, o público era enorme.
Coloquei os óculos escuros, disfarçando, e cochichei para o engenheiro.
- Luis, escutaqui. Não aguento mais xingar essas moças e berrar nesse balcão. Tou cansada.
- Putz, eu também. Vamos desistir? - ele propôs.
Topei na hora. Que alívio, gente.
Mas bem nesse instante a gerente se virou para nós, sorrindo. Surgiram uns assentos, sei lá de onde, e podíamos embarcar. Como o vôo estava atrasado, ainda tivemos que passar um tempão com os foliões Telefônicos na sala de embarque e voltar com eles no avião, cantando e rindo.
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Se valeu a pena? Ah, não, nem pensar. Voei estressada e mais cansada ainda.
Quer saber?
Coisa boa é conseguir achar graça dessas coisas que não tem mesmo graça nenhuma.

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