terça-feira, 11 de janeiro de 2005

iêba, crônica


não fui eu!

Tururururu!
- Uh, desculpa, esqueci de desligar...
Não, não era assim. Há pouquíssimo tempo atrás ninguém tinha vergonha quando o celular tocava em público. Ao contrário, era bacana. Atender o aparelho era um ato realizado com solenidade. Todo mundo ao redor parava, cerimonioso, e esperava você acabar.
De um dia para outro começaram as propagandas negativas. Apareceram novas regras e restrições ao uso do celular. Alguém observou: é um abuso, as pessoas falam, tocam e cantam em tudo quanto é canto. Agem como se estivessem ligadas num fio, dentro de casa!
Onde é que já se viu?
Assim surgiram diversas regras. Não devemos mais deixar o celular ligado no cinema, teatro e show. Não podemos falar alto no celular, e temos que desligar completamente em reuniões e almoços, pois é de uma indelicadeza imperdoável e uma terrível traição você ficar tagarelando com outro bem na frente do teu parceiro. Outra coisa que não pode mais, de jeito nenhum, é atender celular no banheiro. Olha, parece estranho, mas tem muita gente que atendia. Numa circunstância dessas, quando você, a pessoa que tinha ligado para aquele celular, percebia, não tinha mais jeito: já estava praticamente no banheiro junto do outro. Um horror. Pior ainda era descobrir, pelos "sons", o que o outro foi fazer ali. E se ele esquecia de dar a descarga, então, a vontade que dava de avisar?
Eu já disse uma vez que os celulares são telefones particulares, e que deveriam chamar o dono pelo nome. Não seria melhor assim? Você gravaria teu nome, e, se alguém te ligasse, ele ficaria lá gritando: "Cláudio... Cláudio... Cláudio...". Seria muito mais eficiente que essas campainhas, tão parecidas umas com as outras, que causam tanta correria: mulheres enlouquecidas tentando ouvir se é a sua a bolsa que chama, homens se retorcendo, tentando ouvir se é o seu o bolso ou o do vizinho que está apitando.
Pensava sobre tudo isso, quando uma amiga me contou uma impressão dela: ela acha que atualmente existe uma grande similaridade entre duas coisas: o celular e o pum. Celulares e puns, assim, socialmente falando, são quase a mesma coisa.
Vou explicar. Vivemos a era da "vergonha do celular". Os celulares tocam na hora que bem entendem, e isso é uma total inconveniência, mesmo que a gente explique que o "tuturururu" é um som involuntário, que não depende de você. Hoje em dia, um celular tocar em público, seja numa festa ou reunião, é um horror. Eqüivale a sofrer uma crise de flatulência na presença de estranhos.
Tudo culpa sua. Como que você não se controlou?
É nessa hora que cada um se vira como pode. Dá para detectar um monte de tipos: tem aqueles que disfarçam, fingem que não é com eles, e saem para um cantinho para atender. Outros são pegos de surpresa, dão um pulo, uma risadinha sem graça, ôpadesculpagente!. Tem os espertinhos, que abaixam o volume, um toque bem baixinho, mínimo, que parece um ventinho. E ainda os que colocam de vez só no vibrador – ninguém ouve nada, só o dono que subitamente se agita, assanhado, com um leve tremor de corpo. Acho até meio nojento isso. E tem, claro, o escandaloso – assumido, que relaxa e deixa tocar mesmo, feliz da vida, satisfeito.
Céus, esse assunto é escatológico demais. Mas como somos dependentes dos celulares, tive uma idéia genial. Os celulares deveriam ter, de uma vez por todas, barulho de pum mesmo. Sério: aí então eu du-vi-de-ó-dó que alguém se esquecesse de desligar o aparelho numa reunião importante.
E isso iria facilitar muito a vida da turma dos flatulentos involuntários.
- Não fui eu, foi o telefone, juro!

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