terça-feira, 14 de dezembro de 2004

JEANS LYCRA


meu jeans Levi´s 38... snif...

Crônica minha publicada no livro "Diário de um Magro 2: a volta ao SPA", Mário Prata, Editora Objetiva, 2004

jeans lycra


Não sei se devia, mas vou contar uma história. Preciso dividir isso com alguém. Um tipo de desabafo.
Olha só. Era cedinho, cedinho. Acordei, tomei um banho e fui me vestir. O Zé ainda dormia, eu não podia fazer barulho. Escolher uma roupa sempre demora um pouco, é difícil lembrar tudo que a gente vai fazer naquele dia.
Uma calça e um casaco. Pronto.
A calça era jeans, mais normal impossível. Uma calça meio velha, com uns três anos. Três anos, note bem: esse dado é importantíssimo para a compreensão do desenrolar da questão.
Bem, coloquei a minha perna direita numa das pernas da calça. Alguma coisa estava estranha, mas ignorei. Porém, quando coloquei a perna esquerda e levantei a calça, não tive mais dúvida.
Que calça era aquela, caramba?
Apertaaada. Nossa.
O negócio é que a calça não entrava de jeito nenhum. As pernas estavam mais justas que lycra. Grudadas. E aquela parte onde fica o botão e o zíper, aquela parte da frente, que se divide em dois e que deve se juntar no fechamento, estava separada em dois hemisférios. Olha. Alguma coisa muito maior que aquela calça foi colocada dentro dela para ela se comportar daquela maneira. Coisa esquisita.
Essa coisa muito grande, sem dúvida alguma, era eu mesma.
Nessa fração de segundo, só sendo mulher para entender o que passa. A mente pára e imediatamente surge um flashback de toda a sua vida, como se você fosse um balão inflável, que engorda, emagrece, engorda, emagrece. O mais interessante é que as cenas felizes estão sempre ligadas ao balão menor, e as infelizes, ao maior. O inflado. O gorduchão.
É um momento de pânico. A impressão que se tem é que aquela coisa muito grande dentro da tua calça não vai mais parar de crescer nunca, e que teu manequim vai aumentar, num crescendo sem fim. Ah, como é desesperador a gente engordar.
Meu primeiro impulso foi jogar aquela calça no lixo e colocar outra. Que roupa a gente colocaria numa... baleia? Naquele momento, se eu encontrasse uma bata indiana tamanho GG, um saco de estopa ou um tapete de sisal e eles ficassem folgados em mim, há, eu vestia na hora.
Suspirei baixinho, para não acordar o Zé. Ô tristeza.
Também não precisava exagerar, o problema era só fechar o zíper, oras. E isso era simples: como já fui adolescente, sou mulher, tenho irmã e amigas, sei como fazer. Existe um método para resolver esse impasse, mas é bem radical. Meninas, me desculpem, mas eu vou contar aqui esse nosso segredo.
Deitar.
É, deitar. Você se deita, levanta bem o quadril, que: zupt. A calça fecha, rapidinho. Sei lá para onde vai a banha quando a gente se deita, pensando bem, só sei que isso resolve. Esse método limítrofe só pode ser adotado quando a gente está nas últimas. Porque (quem já fez isso sabe) depois de fechar o zíper e o botão, deitada numa superfície qualquer, levantamos desorientadas. Temos que andar feito soldadinho de chumbo, não podemos espirrar e nem tossir sob risco de explosão, e sentar só depois de horas, quando a calça “lacear”. Senão acho que rasgamos o estômago, o intestino e tudo mais que tiver lá dentro.
Assim, inconformada, deitei na cama, pensando como aquilo podia ter acontecido. Tudo no maior silêncio para não acordar o Zé. Imagina o vexame se ele me pega no flagra naquela pose ridícula.
Gente, se arrependimento matasse.
Deitei.
Fechei.
Levantei.
Ah. Não dava. Estava muuuito apertada. Comecei inclusive a ficar aflita, pois eu estava sufocada, sem ar nenhum. Era melhor desistir.
Além de agoniada e humilhada, percebi uma coisa pior. Desistir significava tirar a calça dali, e quem disse que eu conseguia tirar aquele troço do meu corpo? A coisa ficou tão apertada, mas tão apertada em mim que grudou. Comecei então a pular, a girar feito pião, a bater no jeans, numa dança vexaminosa, para tentar arrancar aquela sanguessuga. No desespero, rodopiava, emitindo estranhos sons guturais.
Que mais podia fazer? Deitar de novo não adiantava, o método não funciona ao contrário. Pensei em cortar a calça, mas aquilo estava tão perto da minha pele que era impossível caber uma tesoura entre as duas coisas.
Assim fui, devagarzinho, respirando e tirando, fú, fú, fú, no mais completo silêncio, até a calça descer daquela zona de risco. Eu transbordava de suor quando acabei. A calça saiu, eu dei um esganido. O Zé acordou com o som da... descompressão.
- Ôpa... ei, tudo bem com você?
O que eu podia dizer? Claro que depois de passar por uma situação dessa a gente não está bem. Aliás, demora muito tempo para a gente ficar bem. Anos. Séééculos. Ou melhor, quiiilos.
Só sei que aquela calça jeans passou a ser minha inimiga mortal. Eu não vou dar para ninguém, e não vou jogar fora coisa nenhuma. Vou é esperar o dia da vingança. Deixa estar.
Bem, só concluo mais uma coisa: quem inventou o tal do jeans lycra, que estiiica, com certeza foi uma mulher.
Assim, gorducha, como eu.

Um comentário:

Unknown disse...

Kkkkkkkk